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quarta-feira, 29 de junho de 2011

Após oscilações, café sobe refletindo otimismo no mercado externo

Após oscilações, café sobe refletindo otimismo no mercado externo

Os contratos futuros de café arábica negociados na ICE Futures US encerraram a quarta-feira com altas, em uma sessão caracterizada pela forte volatilidade. As cotações variaram entre altas e fortes baixas, em busca de um direcionamento mais concreto e, ao final dos negócios, conseguiram atrair novas ordens de compra, o que permitiu a consolidação do viés altista e, além disso, garantiu à posição setembro se posicionar acima do intervalo psicológico de 260,00 centavos de dólar por libra. No after-hours os ganhos se acentuaram ainda mais. Ao longo do dia, os temores climáticos, que, inclusive, garantiram bons ganhos ao café na terça-feira não tiveram maiores influências sobre os negócios com café. Desse modo, o mercado passou a operar baseado em aspectos técnicos, sendo que alguns players tentaram realizar alguns lucros em cima dos ganhos observados na sessão passada. Entretanto, os baixistas, mais uma vez, demonstraram pouco fôlego, já que o nível de 250,00 centavos nem sequer conseguiu ser testado. Assim, pouco a pouco, a pressão baixista foi diminuindo, dando lugar a novas ordens de compra. Essas ordens se tornaram ainda mais incisiva após as notícias sobre a Grécia, que aprovou um pacote econômico, que deve pôr fim, ao menos temporariamente, aos temores sobre a economia do bloco europeu. Mesmo com forte pressão popular e muita confusão e agressões em frente ao Parlamento grego, os deputados deram sinal positivo ao pacote, que prevê, entre outras medidas cortes de gastos, aumentos de impostos e privatizações. Com isso, o país deverá receber uma ajuda externa de 78 bilhões de euros até 2015 o que, em tese, poderia garantir a redução do enorme déficit fiscal e tornar sustentável a dívida grega, que supera a marca dos 355 bilhões de euros. No aspecto fundamental, enquanto o frio no Brasil deixou de ser uma preocupação, ao menos no curto prazo, cresce entre os participantes os temores quanto à tormenta Arlene, que atinge o México. Os Estados de Tamaulipas e Veracruz, que é o segundo maior produtor de café do país, foram colocados em "alerta amarelo" devido à presença do fenômeno climático. O Serviço Meteorológico Nacional informou que a tormenta afeta de Barra de Nautla, em Veracruz, até Bahía de Algodones, em Tamaulipas. Os especialistas preveem um aumento na intensidade dos ventos, além da possibilidade de avalanches e aumento do fluxo dos rios. Também estão previstas chuvas intensas sobre os Estados de Puebla, Tlaxcala, México, Hidalgo e Morelos. No encerramento do dia, o setembro em Nova Iorque teve alta de 180 pontos com 260,70 centavos, sendo a máxima em 262,90 e a mínima em 252,00 centavos por libra, com o setembro registrando oscilação positiva de 165 pontos, com a libra a 264,05centavos, sendo a máxima em 266,25 e a mínima em 256,00 centavos por libra. Na Euronext/Liffe, em Londres, a posição julho registrou queda de 16 dólares, com 2.439 dólares por tonelada, com o setembro tendo desvalorização de 18 dólares, com 2.472 dólares por tonelada. De acordo com analistas internacionais, o dia foi caracterizado por variações de humor no mercado cafeeiro. Depois de um início positivo, com a continuidade do movimento comprador, algumas ordens de venda foram acionadas e perdas relativamente consistentes chegaram a ser observadas. No entanto, os bearishs (baixistas), tão efetivos até recentemente, voltaram a demonstrar pouco poder de fogo e não conseguiram explorar alguns suportes mais efetivos. "Essa fraqueza já deu um ânimo para as recompras e, a partir do momento em que o mercado externo começou a se mostrar ainda mais consistente, os ganhos voltaram a ser observados em Nova Iorque", indicou um trader, que lembrou que as bolsas de valores e as cotações das commodities tiveram um impulso após as notícias vindas da Grécia. O índice CRB, que mede a variação de 14 diferentes commodities, encerrou o dia com ganhos de 1,17%. "O viés climático pode ter perdido um pouco de força, mas ele ainda é vigente. Acho pouco provável que os players liquidem fortemente nesta quinta e sexta-feira. Temos de lembrar que a bolsa estará fechada na próxima segunda-feira e ninguém quer se arriscar e ser surpreendido com algum fator novo relacionado ao clima durante o final de semana prolongado", complementou um trader. Na segunda a ICE não opera devido ao feriado de Independência dos Estados Unidos. As exportações de café do Brasil em junho, até o dia 28, somaram 1.455.488 sacas, contra 1.386.082 sacas registradas no mesmo período de maio, informou o Cecafé (Conselho dos Exportadores de Café do Brasil). Os estoques certificados de café na bolsa de Nova Iorque tiveram queda de 1.388 sacas indo para 1.622.299 sacas. O volume negociado no dia na ICE Futures US foi estimado em 16.673 lotes, com as opções tendo 3.497 calls e 2.567 puts. Tecnicamente, o setembro na ICE Futures US tem uma resistência em 262,90-263,00, 263,50, 264,00, 264,50, 264,90-265,00, 265,50, 266,00, 266,50, 267,00, 267,50 e 268,00 centavos de dólar por libra peso, com o suporte em 252,00, 251,50, 251,00, 250,50, 250,00, 249,50, 249,00, 248,50, 248,00, 247,50, 247,00, 246,50 e 246,00 centavos por libra.

O caminho até os cinco milhões de investidores em ações

Fala-se muito no objetivo da BM&FBovespa de alcançar cinco milhões de investidores em ações no Brasil. Os anos que passei à frente das áreas de tecnologia e marketing da então maior corretora da Bovespa me levam a uma visão um pouco diferente do que tenho lido e ouvido sobre as metas para chegar ao universo de investidores pretendido. Nossa visão, há quase dez anos, era de que tecnologia e marketing estavam tão intrinsecamente relacionados no caso do home broker, que deveriam pertencer a uma só área na empresa, com diretriz única. Era impossível estabelecer uma estratégia de tecnologia paralelamente a uma estratégia de marketing, como ocorre em outras indústrias. Isso porque ambas eram o cerne do negócio. Não era uma questão de alinhamento com o negócio, nem mesmo de integração. Tecnologia era o nosso negócio. Encarávamos a corretora como uma empresa de tecnologia que atuava no mercado financeiro. O crescimento verificado foi fruto de uma estratégia integrada, em que sistemas e ferramentas eram definidos com base nas necessidades do investidor-alvo. A forma como o "data feed" era processado e exibido em tela se valia de linguagem que reproduzia as sensações do mercado e estimulava o sentido de pertencimento a um grupo de "experts". A ideia era tornar o processo de decisão (adesão) o mais natural possível.Os fóruns (na época não existiam redes sociais) corroboravam o processo de "evangelização" dos iniciantes. O sistema, em forma de "dashboard", proporcionava as sensações de segurança e controle da situação, necessárias ao ato de compra ou venda de um ativo. E, como pano de fundo das ofertas, as iniciativas educacionais suportavam o racional das decisões. Enfim, todas as ações eram pensadas a partir das personas que representavam os diversos públicos-alvo da corretora.O mercado amadureceu, cresceu e agora estagnou. Algumas corretoras responsabilizam a bolsa pelos maus resultados da campanha com Pelé. Outras sugerem a aplicação de recursos em ações educacionais mais efetivas. Os pleitos têm sua validade, mas não alcançam o âmago do que fará o mercado romper a atual inércia. O número de pessoas físicas na bolsa é hoje encarado como uma espécie de atribuição mágica do Indice Bovespa. Criou-se uma correlação imediata. Quando os participantes do mercado aceitam este "status quo" determinista, fecham-se as portas para a inovação. O processo de inovação se alimenta da ausência do determinismo e de suas correlações nefastas, enquanto os paradigmas se sustentam em explicações mercadológicas coerentes e consistentes que criam uma zona de conforto em que se oferece mais do mesmo por cada vez menos. As ofertas hoje se resumem a palestras, cursos, análises, recomendações e sistemas cada vez mais rápidos e completos. E, é claro, a preços cada vez menores. Diante desse cenário, as perguntas corretas não são feitas. É o que acontece nas situações em que o mercado beira a cegueira estratégica coletiva. E quando não se fazem as perguntas certas, as respostas são ineficazes. O que desejam os clientes a ser conquistados? Será que eles estão interessados no pacote atual que o mercado oferece? É evidente que as ofertas são sofisticadas, tecnologicamente avançadas, inclusive para patamares internacionais. O problema é que são muito interessantes e atrativas para o público que já está na bolsa. Elas não seduzem os que ainda temem o mercado. Nem os que se protegem dele por meio dos escudos do desconhecimento de suas nuances, sem fazer ideia de seu avançado arcabouço legal e de seus eficientes instrumentos regulatórios. Qual o sentido de investir milhões em infraestrutura e sistemas para clientes que talvez venham a comprar Petrobras e Vale para guardar por dez anos? Qual a oferta disponível para esse cliente atualmente? Um "dashboard" espetacular, com informações em tempo real e operações com "delay" de nanossegundos? Nada disso faz sentido para quem pretende acompanhar a evolução de seus papéis no longo prazo.É hora de se repensar a oferta com uma comunicação adequada e estimulante. Este é o ambiente ideal para as empresas inovadoras. É também o caminho para alcançar a meta almejada de cinco milhões de investidores.
Guilherme Horn é CEO da Órama e ex-sócio e ex-diretor de tecnologia e marketing da Ágora Corretora.

Setor de fertilizantes marcha para o recorde de vendas

Setor de fertilizantes marcha para o recorde de vendas

As dificuldades resultantes da crise econômica mundial parecem ter ficado para trás - pelo menos para o setor de fertilizantes. A demanda está aquecida e as entregas apontam para novo recorde do consumo anual em 2011: 26 milhões de toneladas, de acordo com previsão da RC Consultores. Caso esse volume se confirme, representará aumento de 6% sobre os 24,52 milhões de toneladas registrados no ano passado. De acordo com David Roquetti Filho, diretor executivo da Associação Nacional para a Difusão de Adubos (Anda), as entregas de fertilizantes ao consumidor final em maio deste ano registraram aumento de 63,3% em comparação com maio de 2010, passando de 1,34 milhão de toneladas para 2,19 milhões de toneladas. "Se analisarmos as entregas relativas ao acumulado de janeiro a maio de 2011, verificamos que as mesmas representaram 23,8% a mais quando comparadas ao mesmo período de 2010, ou seja: 1,65 milhão de toneladas a mais".Roquetti Filho salienta que 2008 vinha se consolidando como um ano de recorde de entregas de fertilizantes ao consumidor final, mas a crise financeira internacional fez com que o segundo semestre daquele ano apresentasse recuo a patamares de oito anos atrás. Como resultado, as entregas de janeiro a dezembro no período ficaram "abaixo dos anos de 2003 e 2004", diz. A recuperação do setor, porém, não demorou, e as entregas em 2010 voltaram ao mesmo patamar de 2007, segundo a Anda. "O setor, em termos de volumes de entregas ao consumidor final, recuperou-se da crise financeira internacional", afirma o executivo.Um dos motivos do bom desempenho é a antecipação da comercialização. "As vendas este ano foram muito antecipadas em relação a anos anteriores", afirma Javier Britez, diretor da Plataforma de Fertilizantes da Louis Dreyfus Commodities (LDC). Ele observa que, de janeiro a maio, as entregas foram 22% superiores ao mesmo período de 2010, o que mostra a boa correlação de preços dos fertilizantes e as principais commodities. "O setor ainda leva as marcas de 2008, mas, em geral, está recuperado e 2011 promete ser um bom ano", diz. Essa antecipação também foi notada por Marcos Stelzer, gerente de Marketing e Vendas da Anglo American - Copebrás. "As entregas de fertilizantes aos agricultores em 2011 estão em ritmo mais forte do que no ano passado, cerca de 20% acima, considerando o período de janeiro a maio". Stelzer afirma que esse comportamento é resultado de fundamentos positivos do agronegócio brasileiro, "que levaram os fazendeiros a aumentar o uso de fertilizantes na safrinha de milho e também a antecipar as entregas para a safra de verão". Outro aspecto ressaltado pelo executivo da Copebrás é que, ao se comparar o desempenho atual dos fertilizantes fosfatados com 2008, "os excelentes preços e a supervalorização do real ajudam o setor a reduzir suas dívidas". De modo geral, a demanda por fertilizantes tem sido maior para todas as lavouras em 2011. Segundo Britez, da LDC, o consumo relativo aumentou puxado pelos bons preços das commodities, o que incentiva investimentos. Ele destaca as culturas de algodão, cana-de-açúcar, soja e milho, que também foram beneficiadas pelo aumento da área plantada. Stelzer observa que esses produtos também foram favorecidos pelo maior uso de tecnologia. Um dos aspectos resultantes desse momento favorável da agricultura é o aumento das importações de fertilizantes. Segundo a Anda, em maio passado as compras externas somaram 1,73 milhão de toneladas, o que corresponde a crescimento de 60% sobre 1,08 milhão de toneladas registrados no mesmo período do ano passado. Já Britez, da LDC, ressalta que de janeiro a maio de 2011 as importações aumentaram 49% em relação a igual período do ano passado - cenário em que a valorização do real teve impacto limitado.

A leniência do Brasil com a inflação

A leniência do Brasil com a inflação

Doze anos depois de adotado o regime de metas para inflação, o Brasil ainda possui uma das metas mais altas dentre os países que aderiram a esse sistema. O atual objetivo (4,5%), que amanhã, em reunião do Conselho Monetário Nacional, deve ser fixado também para 2013, é o mesmo há oito anos.Com exceção da Turquia e da Rússia, apenas economias em estágio de desenvolvimento inferior ao do Brasil têm metas inflacionárias maiores. Países emergentes como Chile, México e Coreia do Sul operam com metas e índices de preços bem menores. Nessa seara, avançaram mais que a economia brasileira nos anos recentes, apesar de enfrentarem pressões inflacionárias semelhantes.Um balanço feito pelo economista Scott Roger, do Fundo Monetário Internacional, mostra que o regime de metas funcionou bem em praticamente todos os países que o adotaram. Os índices de preços foram derrubados num primeiro momento e depois ancorados. O Brasil não é uma exceção, mas, aqui, a inflação está num patamar elevado e persistente.Meta e tolerância do país estão entre as mais altasDe 1999 a 2010, o IPCA anual médio foi de 6,78%. Retirando da estatística o primeiro ano do regime, afinal, ele entrou em vigência apenas em meados de 1999, a média cai para 6,58%. Considerando apenas o período em que a meta passou a ser 4,5% - de 2005 até agora -, a inflação média efetiva ficou próxima do alvo (4,9%).Bráulio Borges, economista-chefe da LCA Consultores, calculou que, dentre os países emergentes que usam o regime, a meta média estava, em 2010, em 4,4%, com tolerância para baixo e para cima de 1,2 ponto percentual. Quando se considera a mediana, cálculo que exclui as situações extremas, o índice médio cai para 3,5% (+/- 1 p.p.), bem abaixo da meta brasileira. Além disso, o Brasil é o que tem o intervalo de tolerância mais amplo - em tese, o intervalo existe para absorção de choques, mas, mantido em patamares elevados (já foi de 2,5 p.p.!), demonstra leniência.O governo perdeu excelente oportunidade de reduzir a meta em 2007. No ano anterior, o IPCA recuara para o nível mais baixo da história do regime - 3,14%. Nos primeiros meses de 2007, o Banco Central (BC) constatou que os preços internacionais das commodities, especialmente dos alimentos, já começavam a avançar acima dos níveis dos anos anteriores.Com a inflação dentro da meta, o governo, ao fixar o objetivo de 2009, poderia ter reduzido o alvo sem a necessidade de um aperto monetário adicional. A diminuição teria ajudado a controlar as expectativas num momento crucial, mas a equipe econômica julgou que um objetivo menor levaria o BC a derrubar o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB).O que se viu, desde então, foi a aceleração concomitante de PIB e inflação. Em 2008, mesmo com a parada súbita da economia no último trimestre, o IPCA chegou a 5,9%. No ano seguinte, apesar da recessão, bateu em 4,31% e, em 2010, voltou a 5,9%. Os números mostram que toda vez que o PIB cresce acima do potencial, estimado hoje entre 4% e 4,5%, a inflação supera a meta e ameaça sair de controle, como nos últimos meses.Bráulio Borges sustenta que reduzir a meta para muito menos de 4%, num espaço curto de tempo, não é recomendável. São três as principais razões: o peso dos serviços na cesta de consumo dos brasileiros está crescendo de maneira relevante, em detrimento da participação dos bens, e a inflação dos serviços costuma correr bem acima da dos preços industriais; o grau de indexação da economia brasileira ainda é grande; o país tem juros reais muito altos.O esforço para diminuir a meta, alega Borges, poderia derrubar o PIB abaixo do potencial durante a transição para o novo alvo. Na verdade, é bem provável que, por causa da aceleração inflacionária do fim de 2010 e início de 2011, a economia já tenha que crescer abaixo do potencial neste e no próximo ano. Este é o custo de se crescer acima do possível.É difícil ver o país caminhando para patamares de inflação menores. O problema da indexação foi agravado pela política de correção do salário mínimo (IPCA do ano anterior, acrescido do PIB de dois anos antes), transformada em lei pelo governo Dilma Rousseff. O mínimo, além de corrigir mais de 40% das despesas primárias do governo, é talvez o principal indexador do setor de serviços, justamente o que mais vem pressionando os preços. Cristiano Romero é editor-executivo do Valor

Lactalis, da França, fica com controle da italiana Parmalat

Lactalis, da França, fica com controle da italiana Parmalat

O grupo francês Lactalis obteve ontem o controle da italiana Parmalat, criando a maior empresa do setor de lácteos do mundo. Com 29% de participação na Parmalat, empresa que tem o capital muito pulverizado, o laticínio francês impôs sua visão durante a assembleia geral reunida em Parma ontem, colocando seus nove candidatos no conselho de administração que tem onze membros. Os dois outros assentos ficaram com representantes de acionistas minoritários, formados principalmente por numerosos fundos de investimento.Com isso, o grupo francês, conhecido pela marca Président, não precisará esperar até o fim de sua oferta pública de compra, em 8 de julho, para ficar com o controle da Parmalat, com a qual chegará a uma receita de € 14 bilhões, tornando-se líder global em lácteosA Lactalis também nomeou seu candidato, Francesco Tato, antigo chefe do grupo de energia Enel, para a presidência da Parmalat e conseguiu aprovar redução do mandato do conselho para um ano contra os três atuais.O novo diretor-executivo será nomeado na primeira reunião do novo conselho. Ele irá substituir Enrico Bondi, que assumiu a Parmalat como interventor depois que a empresa italiana quebrou em dezembro de 2003. Antonio Sala, diretor-geral delegado da Lactalis e presidente da Lactalis Itália, é cotado para o cargo.A tomada do controle da Parmalat pela Lactalis acontece após meses de braço de ferro. Em março, a Lactalis pegou o mercado de surpresa e adquiriu 29% do capital da italiana, montante suficiente para obter o controle da Parmalat.Apoiados pelo governo da Itália, bancos e a Caixa de Depósitos italiano tentaram formar uma aliança para conter a Lactalis, que acabou anunciando, no fim de abril, uma oferta de compra da Parmalat. A empresa italiana rejeitou a oferta de € 2,60 por ação - ou cerca de € 4,5 bilhões pelo total -, mas a Lactalis se recusou a aumentar o valoO sucesso da oferta de compra da Parmalat pela Lactalis foi condicionado à detenção de ao menos 55% do capital da companhia italiana, mas as condições podem ser modificadas. Antes da oferta da Lactalis, a brasileira LBR - Lácteos Brasil chegou a negociar uma operação de troca de ações com a Parmalat. Como a LBR tem licença para uso da marca no Brasil, a expectativa de analistas é de que a francesa inicie algum tipo de negociação com a empresa brasileira.

Do pânico à euforia com a mesma Grécia

Do pânico à euforia com a mesma Grécia
Tudo certo, mas nada resolvido. É nesse clima que os mercados globais sustentaram mais um dia de otimismo com relação à Grécia. Em um exercício de fé no parlamento grego, os agentes compraram ações e commodities e venderam dólar e títulos do Tesouro americano. O mais interessante é que, dias atrás, essa mesma Grécia e seus políticos perdulários serviram de justificativa para queda no preço das ações e uma corrida ao dólar.A votação do projeto de austeridade de ? 78 bilhões está prevista para hoje, com detalhamento de como fazer essa redução de custos estimada para amanhã. Sem essa contrapartida o país não recebe dinheiro do Fundo Monetário Internacional (FMI) e União Europeia (UE) e entra, oficialmente, em default. Fé no parlamento grego puxa bolsas e derruba dólarNão se questiona se o país tem condições de entregar o prometido, ou mesmo, se essa ajuda à Grécia encerra a fatura, ou se em alguns meses terão ser mobilizados novos esforços.Conforme notou o diretor-executivo da NGO Corretora, Sidnei Moura Nehme, no fundo, é tudo um "faz de conta" para se evitar o pior dos cenários, já que não há saídas confiáveis e exequíveis sem moratória da dívida.No entanto, a única "solução" de fato para o problema, que seria a moratória, precisa ser evitada de toda forma, tendo em vista o risco que tal "solução" traria para o sistema financeiro europeu e mundial.Os analistas do Standard Bank também têm uma postura crítica com relação a essa euforia com a Grécia. "A zona do euro enfrenta risco sistêmico e não uma crise específica de um país. E mesmo que o caso da Grécia tenha um desfecho favorável, há muito mais problemas na região, que podem forçar a cotação do euro para a linha de US$ 1,20", escreveu a instituição.Os especialistas do banco chamam a crise na região de "crise dominó". No ano passado, a Grécia foi a primeira a receber ajuda, seguida por Irlanda e Portugal. E esse episódio de pedir resgate novamente, liderado pela Grécia, tem grande chance de ser seguido, também, pelos mesmos Irlanda e Portugal. Na visão do banco, esse é o sinal extraído do mercado de títulos desses países, onde a taxas dispararam nos últimos dias."Se, no fim das contas, a Grécia for forçada a sair do euro, o mercado vai esperar o mesmo efeito dominó. Como resultado, a única pergunta plausível parece ser qual o tamanho dessa fila de dominós", completou o Stantard Bank.Falando em outros membros da zona do euro, Portugal e Espanha parecem se antecipar às exigências do FMI, ou mesmo, aproveitar a "onda" da Grécia, e também anunciaram planos de austeridade. Portugal listou em seu site de oficial planos de privatização e aumento de impostos. E na Espanha se estudam regras de responsabilidade fiscal para as províncias do país.Esse voto de confiança nos Gregos deu fôlego ao euro no pregão de ontem. A moeda comum subiu cerca de 0,5%, retomando a linha de US$ 1,43. Outro vetor de alta para o euro foi o presidente do Banco Central Europeu (BCE), Jean-Claude Trichet, que falou estar em modo de "forte vigilância", termo associado a elevações na taxa básica de juros. O BCE tem reunião na quinta-feira da próxima semana.No câmbio local, a pressão vendedora foi ainda mais forte. O dólar comercial caiu 1,12%, para R$ 1,578, mesmo preço do começo do mês.No mercado futuro, o dólar para julho perdia 1,15%, a R$ 1,5775, e o dólar para agosto, que já ganha liquidez, recuava 1,08%, a R$ 1,590, antes do ajuste final de posições.Por ora, os vendidos estão fazendo a festa. Salvo algum desastre na Grécia, essa formação de Ptax (média das cotações ponderada pelo volume) também será deles nessa virada de mês.No mercado de juros futuros, as taxas apontaram para cima acompanhando preços externos. Hoje, foco nos modelos apresentados pelo Relatório trimestral de Inflação, e na leitura do IGP-M de junho, que deve mostrar deflação de 0,25%, pelas contas da Máxima Asset.Outro assunto que dominou as mesas de negociação foi a propostas de fusão entre Pão de Açúcar e Carrefour. Até aí sem grandes novidades. O que chamou atenção e gerou uma infinidade de perguntas aqui e no mercado externo foi surgimento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) no meio da elaborada proposta, que também passou a contar com os sagazes banqueiros do BTG Pactual.A explicação dada pelo BNDES de que caso o negócio seja concretizado fica aberto "o caminho para maior inserção de produtos brasileiros no mercado internacional" não convenceu ninguém.

Commodities já representam 71% das exportações do país

Commodities já representam 71% das exportações do país

As commodities representaram 71% do valor total exportado pelo Brasil no acumulado de janeiro a maio deste ano. No mesmo período do ano passado a participação das commodities foi de 67%. As vendas ao exterior desse tipo de produto avançaram em ritmo mais acelerado do que as de manufaturados. Nos primeiros cinco meses do ano, a exportação de commodities cresceu 39,1% em relação a igual período de 2010, enquanto os embarques de manufaturados subiram 15,1%.O cálculo é da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) e não considera somente as commodities classificadas pelo Ministério do Desenvolvimento (Mdic) entre os básicos. Ela leva em consideração também as commodities classificadas como semimanufaturados e também as que, em razão de incorporarem alguma industrialização, estão enquadrados nas estatísticas oficiais como manufaturados. Entre as commodities industrializadas estão açúcar refinado, combustíveis, café solúvel, alumínio em barras, entre outros. "Isso significa que temos 71% de nossas exportações baseadas em commodities. Ou seja, em produtos cujos preços não controlamos", diz José Augusto de Castro, presidente em exercício da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB). Ele lembra que o avanço dos produtos primários na pauta de exportação brasileira se intensificou desde 2009. Naquele ano, a fatia das commodities nas vendas ao exterior era de 65,6%. No ano passado todo, foi de 69%. O aumento de participação do total das commodities foi influenciado, principalmente, pelo avanço dos produtos mais básicos, cujas exportações subiram 45,6% de janeiro a maio de 2011, na comparação com o mesmo período do ano passado. As commodities beneficiadas e as industrializadas, classificadas pelo Mdic entre os semimanufaturados e manufaturados tiveram, respectivamente, crescimento de 30,9% e 20,5% - ainda um ritmo mais acelerado que o dos produtos manufaturados de maior valor agregado, que tiveram aumento de 15,1%.Enquanto os produtos primários avançam nos embarques brasileiros, diz Rogério César de Souza, economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento da Indústria (Iedi), a balança comercial de manufaturados no Brasil vem acumulando déficits cada vez maiores. De acordo com levantamento do Iedi, no primeiro trimestre do ano passado a indústria brasileira de manufaturados teve déficit de US$ 7,5 bilhões. O saldo negativo saltou para US$ 10 bilhões nos primeiros três meses de 2011. No acumulado do ano passado, o déficit chegou a US$ 35 bilhões. "Para este ano estimamos que esse valor ultrapasse os US$ 50 bilhões." O que explica o avanço das commodities foi basicamente preço, diz Castro. No acumulado de janeiro a maio, o valor exportado em minério de ferro cresceu 107,3% em relação aos primeiros cinco meses do ano passado. No período, o volume exportado cresceu 4,49% enquanto o preço subiu 98,4%. A soja exportada aumentou 22,7% em valores. De novo, foi o preço quem comandou o crescimento, com alta de 30,7%, enquanto o volume embarcado caiu 6,2%.Os preços dos produtos primários, lembra Souza, não seguem apenas o movimento de oferta e demanda. "Esses preços são pressionados também pelo mercado secundário, que pode buscar outros ativos mais rentáveis a qualquer momento", diz ele. Para castro, "há ainda uma grande liquidez no mundo, embora os preços das commodities nos últimos meses tenham mostrado que há uma certa saturação nesses mercados".Em termos de demanda, lembra Castro, a exportação brasileira de commodities está fortemente baseada no crescimento econômico da China. Se houver desaceleração do crescimento chinês o impacto na demanda será global e isso contribuirá para reduzir mais rapidamente o valor das exportações brasileiras do que o das importações, diz Souza. A volatilidade de preços das commodities é muito alta e tem efeitos imediatos, explica o economista do Iedi. Já os preços dos manufaturados, que representam 80% da importação brasileira, diz Castro, vão demorar a sentir o recuo. "Os manufaturados têm contratos fechados por prazos mais longos e há maior fidelidade ao fornecedor." Castro lembra ainda que alguns mercados importantes de manufaturados brasileiros, como os países da América do Sul, têm economia atualmente impulsionada por um motor semelhante ao brasileiro: a exportação de commodities. "Caindo a capacidade de exportação desses países, haverá também menor demanda para importação, o que afeta as vendas brasileiras de manufaturados ao exterior."O resultado para o Brasil pode ser uma redução de superávit ou geração de déficit, com os efeitos resultantes nas contas fiscais e eventualmente na inflação.Castro acredita, porém, que o atual cenário deve ser mantido pelo menos até o fim de 2011. Importantes produtos na pauta brasileira de commodities, como a soja, por exemplo, diz, já foram vendidas. "Os contratos foram fechados, com preços já definidos. O grão só não foi entregue", diz. O minério de ferro, outro item primário importante, já está com o preço para o terceiro trimestre definido. "O quarto trimestre ainda está em aberto, mas deve manter patamar de preço semelhante ao atual, a menos que haja alguma mudança repentina no mercado externo."

Pão de Açúcar se mexe e surpreende o mercado

Pão de Açúcar se mexe e surpreende o mercado

Mais uma vez o empresário Abílio Diniz surpreende o mercado com a proposta feita pelo Pão de Açúcar de fusão de suas operações com as do Carrefour no Brasil. Apesar de todos os obstáculos que existem para que o negócio realmente ocorra, os analistas gostaram da notícia. As ações preferenciais (PN, sem voto) do Pão de Açúcar chegaram a subir mais de 14% durante o pregão e fecharam em alta de 12,65%, de longe a maior alta no Indice Bovespa, que também teve um dia positivo e subiu 1,77%.Na proposta, as operações do Pão de Açúcar e do Carrefour no Brasil migrariam para uma nova companhia batizada de Novo Pão de Açúcar (NPA), que teria as ações negociadas na bolsa. A empresa de participações do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico Social (a BNDESPar) injetaria ? 1,7 bilhão nessa NPA e o banco BTG Pactual outros ? 300 milhões.A aposta é que Casino acabará concordando com a ofertaA grande pedra no sapato dessa operação é o Casino, sócio do Pão de Açúcar, e que já se mostrou fortemente contra o negócio. O Grupo Casino disse que tem autoridade suficiente para se opor ao acordo e que qualquer tipo de negociação sobre o futuro do Grupo Pão de Açúcar precisa contar obrigatoriamente com a sua anuência. Ou seja, se Abílio Diniz e Casino não chegarem a bom termo, nada feito.Apesar de ressaltarem esse risco nada desprezível, os analistas se mostraram otimistas com a possibilidade do negócio entre Pão de Açúcar e Carrefour. Em relatório, os analistas da Fator Corretora Renato Prado e Ronaldo Kasinsky dizem que a oferta traz valor para todos os envolvidos, "especialmente ao criar o maior varejista brasileiro, com possibilidade de geração de sinergias operacionais decorrentes de melhor negociação com fornecedores, ganhos de escala e logísticos, além de uma melhor precificação em diversos segmentos de operação em função de um maior nível de informações". Eles acreditam que a oferta deve fazer com que as ações do Pão de Açúcar tenham, no curto prazo, um desempenho melhor do que o Ibovespa, sem contar que os papéis da varejista estão bastante descontados.Para um gestor de recursos, o pulo do gato nessa operação e que deve fazer o Casino dizer sim é que, por meio do Novo Pão de Açúcar, o grupo francês entrará no bloco de controle do seu concorrente Carrefour. "Conseguir entrar no concorrente, estando ainda por cima no grupo de controle, é o sonho de consumo de qualquer companhia", diz o gestor.A outra grande questão por trás dessa oferta é se faz algum sentido o BNDES, um banco em tese criado para fomentar o setor privado brasileiro, financiar uma empresa do porte do Pão de Açúcar? E para ela, no fim das contas, se tornar uma companhia francesa?Chovem críticas de analistas à estratégia do BNDES de, não é de hoje, financiar grandes conglomerados em operações que parecem agregar pouco ou nada ao mundo corporativo brasileiro. Com apoio do BNDES, Diniz afaga Carrefour Um grande negócio foi anunciado ontem em São Paulo: a combinação entre Pão de Açúcar e Carrefour no Brasil. A operação, contudo, ainda não passa de uma grande ideia, com R$ 5,75 bilhões disponíveis na mesa, oferecidos pela BNDESPar (68%) e pelo BTG Pactual (32%), ainda que o negócio não envolva dinheiro, apenas troca de ações. Por enquanto, trata-se apenas de uma proposta que precisa ser aprovada por todos os envolvidos - Carrefour e seus acionistas e Pão de Açúcar e seus controladores, família Diniz e grupo Casino. A proposta tem validade de 60 dias.Como o negócio foi desenhado por Abilio Diniz e um grupo de acionistas do Carrefour liderado pela Blue Capital, a sua concretização está nas mãos do Casino, que vem publicamente mostrando seu descontentamento pelas negociações há cerca de um mês - tendo, inclusive, iniciado um processo de arbitragem contra Diniz.A operação pretendida colocaria as rivais francesas Carrefour e Casino como acionistas do grupo Pão de Açúcar, junto dos Diniz. Além disso, os atuais acionistas da varejista brasileira se tornariam o maior sócio individual do Carrefour na França, com no mínimo 11,7% e no máximo 18% do capital.O poder de sim ou não está todo com o Casino. O rede que controla o Pão de Açúcar com a família Diniz recebeu a proposta na madrugada de ontem, quase junto com a divulgação ao público, o que mais uma vez deixou-a indignada. Agora, recai sobre o grupo francês a pressão de aceitar ou recusar uma operação capaz de gerar sinergias estimadas de R$ 1,3 bilhão a R$ 1,8 bilhão e que tem R$ 3,9 bilhões de aval do banco de fomento estatal, o BNDES, em tempos de capital escasso no Hemisfério Norte.No negócio proposto, a BNDESPar se tornaria acionista do que seria o Novo Pão de Açúcar (NPA), com 18%. O BTG colocaria outros R$ 690 milhões e receberia 3,2% das ações. Além do aporte, o banco de investimentos ainda emprestaria R$ 1,15 bilhão à empresa. O argumento para o dinheiro novo é "preparar a empresa para novos desafios". E o apelo político é a criação de um grupo de varejo com atuação nacional e internacional. Ainda que, ao final, os franceses - Carrefour e Casino - devam ficar com 65% do capital da empresa operacional.Há grande expectativa de que o Casino diga não à proposta. Resta saber se as características da operação serão suficientes para seduzir o sócio francês ou se alguns termos poderão ser revisados. Casino deve resistir ao projeto de fusão com o rival francês A guerra foi declarada e deverá ser longa e envolver artilharia pesada. O grupo francês Casino, sócio do Pão de Açúcar, promete defender com todas as forças seus interesses no Brasil e também resistir ao projeto "manifestamente hostil" de fusão entre a varejista brasileira e seu rival Carrefour, anunciado ontem oficialmente, após mais de um mês de rumores.O Casino não demorou para lembrar seu "direito de se opor à proposta" de fusão. Por enquanto, o grupo francês "estuda" as medidas que pretende tomar, sobre as quais prefere não dar detalhes. O descontentamento do presidente do Casino, Jean-Charles Naouri, é tão grande que ele nem quis receber o sócio brasileiro em Paris.O empresário Abilio Diniz passou os últimos dois dias na capital francesa tentando marcar um encontro com Naouri. Mas a "agenda" do presidente do Casino, segundo uma fonte ligada à empresa, não previa nada com o sócio. Restou a Diniz voltar ontem ao Brasil, sem explicar as razões da aproximação com o Carrefour. "Jean-Charles Naouri se nega a dialogar e prefere me atacar pela imprensa. Não entendo o propósito disso", afirmou Diniz em uma carta enviada ontem à Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Diniz deverá voltar a Paris na sexta-feira ou na próxima semana e tentará novamente se reunir com o sócio francês.Na sede do Casino, o anúncio da proposta de fusão com a rede brasileira soou como uma bomba. Diniz ainda divulgou, praticamente no mesmo instante que o Carrefour, comunicado em francês no qual afirma "sempre estar à busca de novas oportunidades de crescimento para o Pão de Açúcar" e que as conversas iniciadas com os principais acionistas do Carrefour (admitidas pela primeira vez oficialmente) acabaram evoluindo para uma "ideia de associação global".Mas para o Casino, as negociações são "ilegais", já que realizadas sem o conhecimento do grupo, diz a fonte. "Uma operação desse tipo é preparada em conjunto, com discussões, não de uma maneira violenta", afirma. Por isso, o contra-ataque veio rápido e em tom agressivo. Logo nas primeiras linhas do comunicado, o Casino marca seu território relembrando sua participação na varejista. O grupo francês afirma "ter descoberto o projeto de operação financeira que implica a Companhia Brasileira de Distribuição (grupo Pão de Açúcar), empresa na qual o Casino é o principal acionista, compartilha o controle com Abilio Diniz e adquiriu, em 2005, junto à família Diniz, o direito de ser o único acionista controlador em 2012".Essa é a parte mais amena do texto, que menciona, ainda, "negociações secretas e ilícitas" e "um projeto preparado de longa data e ilegalmente por Carrefour e Abilio Diniz". O Casino diz também que "nenhuma negociação sobre o futuro da CBD pode ocorrer sem a participação do Casino" e que, apesar disso, as negociações continuaram, "ignorando tanto o direito quanto a ética elementar dos negócios".O Pão de Açúcar, por sua vez, contesta o fato de que simples prospecções de negócios precisariam ser levadas ao conhecimento do Casino. Nas operações com a Casas Bahia ou o Ponto Frio, a proposta foi apresentada ao grupo francês quando já estava madura, como é o caso agora, afirma uma fonte ligada à varejista brasileira.Mas essas transações no Brasil não envolviam o rival do Casino na França. "Essa operação é um movimento desesperado do Carrefour para se reequilibrar", diz uma fonte ligada ao caso, fazendo alusão aos problemas da rede varejista em seu principal mercado, a França.O Casino prevê que o caso "deverá durar longos meses" e poderá ser bloqueado por inúmeros procedimentos, a começar pelos acionistas das empresas, "que podem não aceitar o projeto", ou pelas autoridades de defesa da concorrência no Brasil.Naouri é o principal acionista e controlador do Casino. Em abril, ele adquiriu, por meio de operações com holdings intermediárias, participação de 50,19% do capital do Casino e 61,57% das ações com direito a voto, diz a AMF, a CVM francesa.No início dos anos 90, Naouri assumiu o controle do grupo Rallye (principal acionista da rede Go Sport). O restante está dividido entre a família dos fundadores da empresa, a Galeries Lafayette, o grupo CNP, entre outros, que têm participações menores que 2%, e investidores. A ação do grupo caiu 5,61% ontem. O Casino, que há um mês abriu processo de arbitragem contra Diniz, alegando quebra de contrato por conta da aproximação deste do Carrefour, obteve apenas na sexta-feira a confirmação das negociações, após a apreensão de documentos na sede do Carrefour pelo Tribunal de Comércio de Nanterre. Ontem, deparou-se com o anúncio da proposta de fusão. Abilio Diniz igualaria poder ao Casino na nova empresa Abílio Diniz, que atuou no desenho da proposta para combinação de Pão de Açúcar e Carrefour, pode conseguir uma reviravolta em seu futuro no varejo brasileiro caso obtenha aprovação do sócio Casino para a transação. No lugar de sócio minoritário do Pão de Açúcar, pois está previsão em acordo de acionistas que o Casino assumirá o controle do negócio a partir de 2012, Diniz pode igualar seus poderes ao grupo francês numa companhia maior, sem nenhum desembolso.A previsão é que o controle das empresas combinadas seja dividido igualmente entre Carrefour França e os atuais acionistas do Pão de Açúcar, que serão agrupados numa nova empresa - chamada Novo Pão de Açúcar (NPA). Esse veículo ainda se tornaria a maior acionista do Carrefour França, com direito a três cadeiras no conselho de administração. A fatia final na companhia internacional deve variar entre 11,7% e 18%. Haverá ainda um acordo de acionistas entre NPA e os atuais maiores sócios do Carrefour França, liderados por Blue Capital. Em dois anos, essa participação poderia dobrar.A proposta foi desenhada pela Estáter, assessora de longa data do Pão de Açúcar, e pelo BTG Pactual, que entrou na negociação há um mês. A estrutura final é complexa e possui diversas etapas. Diniz, Casino e todos os atuais acionistas de Pão de Açúcar migrarão para a holding chamada NPA. Nessa nova empresa, que só teria ações ordinárias e o controle disperso na bolsa, Abilio Diniz e família teriam direta e indiretamente 16,9% e Casino, 29,8%. A fatia de Wilkes, participação indireta de ambos, sairia de 25,2% para 20,5%.O estatuto dessa nova companhia, porém, limita o poder de votar de um acionista a 15% do capital, independentemente da participação econômica detida. Esse dispositivo abre espaço para que Diniz e Casino tenham o mesmo poder político - ainda que o grupo francês tenha quase o dobro em dinheiro investido. Para preservar a estrutura dispersa do capital, NPA ainda terá em estatuto a previsão de que quem superar 39% de participação deve lançar oferta pública para todos os acionistas.O primeiro passo, porém, seria transformar o Pão de Açúcar numa companhia apenas com ações ordinárias, embora não listada no Novo Mercado. As preferenciais seriam convertidas em ordinárias na proporção de uma para 0,95.O segundo movimento é a incorporação da empresa aberta por NPA, que seria sucessora como empresa listada na BM&FBovespa. Nessa companhia, os atuais acionistas seriam diluídos pela entrada da BNDESPar e do Pactual, com aporte total de R$ 4,6 bilhões, que ficariam com 18% e 3,2% do capital, respectivamente.Abilio Diniz e família teriam a participação reduzida de 21,4% para 16,9% e Casino sairia de 36,9% para 29,8%. Os minoritários, que hoje detêm 41,6% do Pão de Açúcar, ficariam com 32,1% de NPA. Em seguida, Pão de Açúcar deveria incorporar Carrefour Brasil, numa transação que daria 31% do negócio ao Carrefour na França.Nesse momento NPA teria os outros 69% do negócio. Para igualar a participação em 50% para cada lado, os 19% excedentes do NPA seriam trocados por uma participação de 11,7% no capital do Carrefour França em ações preferenciais, incluindo voto mais direitos para participação na gestão. Há a expectativa - mas não a obrigação - de que NPA compre mais ações do Carrefour França no mercado, ampliando sua participação para algo entre 16% e 18%. Como NPA terá 50% do Pão de Açúcar, a participação efetiva de cada sócio na empresa operacional será equivalente à metade do que possuem nessa holding. O motivo de o Casino não gostar da proposta num primeiro olhar - embora a decisão final ainda não esteja tomada - é justamente o fato dela significar o fim de seu direito de ser o dono do Pão de Açúcar a partir de 2012. "Não abriremos mão de nosso direito de controle", disse um interlocutor do grupo francês. Apesar disso, os acionistas que desenharam o negócio acreditam que a pressão política - pela sinalização de apoio do BNDES - e a chance de o Casino tornar-se indiretamente (via NPA) o segundo maior acionista de Carrefour França levarão o Casino a conceder seu aval para a transação. Acordo pode representar revitalização para o Carrefour Com inúmeros problemas na França, maior mercado do Carrefour, a proposta de fusão entre o grupo francês e o Pão de Açúcar pode representar uma grande oportunidade de revitalização para o vice-líder mundial do varejo. O Carrefour reiterou na semana passada que "um dos pilares de sua estratégia" é reforçar suas atividades em mercados emergentes com forte potencial de crescimento.Analistas avaliam que a operação de fusão seria benéfico para o Carrefour, que ampliaria seu tamanho em um mercado-chave e se beneficiaria da experiência - e da liderança - do Pão de Açúcar. As ações do grupo, que caíram 25% de novembro até a semana passada, fecharam ontem em alta, de 3,74%.Nem mesmo o anúncio da agência de classificação de riscos Fitch - que reduziu ontem a nota do grupo de A- para BBB+, indicando uma tendência negativa - estragou a festa dos acionistas. O rebaixamento ocorreu em razão das previsões, do próprio Carrefour, de queda de 35% no resultado operacional neste semestre na França, do desmembramento da rede de descontos Dia, aprovada semana passada, e, ainda, de preocupações sobre o ritmo de recuperação das atividades em sua terra natal.O ritmo é considerado "lento" pelos os próprios acionistas. Na assembleia realizada semana passada, eles bombardearam de críticas a direção da empresa.As vendas do grupo vêm perdendo velocidade na França. Para tentar frear a queda nas vendas, a companhia lançou um vasto programa de modernização de seus hipermercados, batizados de "Planet" - que representam a maior parte de seu faturamento -, que custará € 1,5 bilhãoO fraco desempenho dos hipermercados ocorre em razão da mudança de comportamento do consumidor em países desenvolvidos, que vêm preferindo as lojas de bairro. O Carrefour aposta nesse segmento, com a abertura de supermercados nesse modelo. Segundo as previsões pouco otimistas para o semestre, porém, a recuperação do grupo ainda não é palpável, apesar de o Carrefour ressaltar que alguns novos hipermercados têm obtido bons resultados e que a expansão das lojas de bairro vai continuar.Por isso, a pressão do principal acionista do Carrefour, a Blue Capital, holding formada pelo grupo do empresário Bernard Arnault (da LVMH, líder mundial do setor de luxo) e pelo fundo americano Colony Capital. Juntos, eles detêm 14,1% do capital e 20,2% das ações com direito a voto do grupo. Eles teriam perdido, segundo analistas, mais de € 2 bilhões com a desvalorização do CarrefourO mercado estima que Arnault e o Blue Capital estão por trás da iniciativa do Carrefour de cisão da rede de descontos Dia, cujas ações devem ser lançadas na bolsa de Madri em 5 de julho. A operação poderia permitir a alta das ações Carrefour, já que o rendimento do grupo é maior do que o da rede de descontos. O diretor-geral e novo presidente do Carrefour, o sueco Lars Olofsson, havia declarado que o objetivo da operação com a rede Dia "é tornar o grupo mais focado em suas atividades operacionais e criar valor para os acionistas".Por enquanto, o projeto de cisão de 25% da Carrefour Property, de bens imobiliários, foi suspenso. Em 2010, o Carrefour havia vendido suas atividades na Tailândia justamente ao Casino, por € 868 milhõesPara o grupo Casino, a proposta de fusão entre o Carrefour e o Pão de Açúcar "é um movimento desesperado" do rival para reequilibrar suas atividades e também "a confissão do fracasso em recuperar as contas da filial brasileira". Em 2010, o Carrefour anunciou um rombo de € 550 milhões nas contas no Brasil, relativas a encargos, o que levou o grupo a realizar alertas de lucrosOntem, em Paris, na sede do Carrefour, a conta foi outra: o faturamento atual no Brasil, de €12,4 bilhões, incluindo a rede Dia, passaria para € 30 bilhões se o projeto de fusão for aprovado. Olofsson disse na semana passada que o Carrefour manteria o controle de suas operações no Brasil. Agora, o eventual controle em conjunto não representa um problema. Galeazzi costurou entrada do BTG no negócio No início da tarde de ontem, o engenheiro Pércio de Souza, sócio da butique de investimentos Estáter, explicava aos jornalistas a intrincada operação de associação entre Pão de Açúcar e Carrefour, estruturada por ele. Depois de uma rápida saída da sala para um café, Souza voltou confiante: "As ações do Pão de Açúcar estão subindo 11%", disse o engenheiro. "Sinal que o mercado está recebendo bem a notícia." Ao mencionar o "mercado", Souza se referia aos investidores. O papel fechou o dia com alta de 12,64%. Mas a operação que torna o Pão de Açúcar sócio do Carrefour mundial, com a manutenção de Abilio Diniz à frente do negócio, provavelmente na presidência do conselho de administração do Novo Pão de Açúcar (NPA), segundo apurou o Valor , não interessa aos demais players do setor varejista - rivais e fornecedores. A nova companhia concentrará quase um terço do varejo no Brasil. Em um setor que movimentou R$ 201,6 bilhões em 2010, o Pão de Açúcar respondeu por 17,9% das vendas (considerando Casas Bahia e Ponto Frio), enquanto a fatia do Carrefour ficou em 14,4%. O terceiro colocado no ranking, o Walmart, tem 11%.Na justificativa da possível concentração, o sócio do BTG Claudio Galeazzi - um dos responsáveis pela área de "merchant banking" do banco, onde estão as operações de varejo - disse que, nos Estados Unidos, o Walmart é dono de 32% das vendas. Na França, o Carrefour teria 26%. Daí ser natural, diz, que o Brasil tenha uma operação forte nacional, com participação inclusive no exterior. "A concentração é muito menor do que pensávamos no começo", afirmou. Em relação a sinergias entre as duas empresas, que ficarão reunidas no NPA, Galeazzi estima € 560 milhões, ou algo em torno de R$ 1,3 bilhão a R$ 1,8 bilhão. "Também teremos a chance de implantar as melhores práticas de gestão nas bandeiras do Carrefour Brasil, a fim de aumentar a eficiência da empresa." No ano passado, a filial brasileira da rede francesa foi responsável por um rombo contábil de € 550 milhões nas contas da matriz, devido a créditos de fornecedores contabilizados de maneira indevida. Segundo Galeazzi, essa conta ficou com o Carrefour na FrançaSegundo apurou o Valor, Galeazzi, famoso pelas reestruturações de empresas como Lojas Americanas e o próprio Pão de Açúcar, do qual participou do conselho de administração até ir para o BTG, na metade de 2010, foi o responsável pela entrada do banco no negócio. No início deste mês, Galeazzi teria mandado um e-mail para Abilio Diniz e para Pércio de Souza demonstrando o interesse do banco em participar da operação.Foi prontamente atendido por Souza, que colocou o BTG na estrutura do negócio, com uma participação de 3,2%, o equivalente a € 300 milhões. Além disso, o banco se comprometeu a captar € 500 milhões para o NPA. Mas a missão não foi tão simples. Galeazzi teve que vencer a resistência do banqueiro André Esteves, controlador do BTG, para participar do negócio. "Há um certo conflito de vaidades", diz um interlocutor que acompanhou a operação, referindo-se a Esteves e DinizSe a proposta da associação entre Carrefour e Pão de Açúcar for aprovada, Galeazzi, que completou 71 anos na segunda-feira, terá capitaneado o seu primeiro grande negócio à frente do BTG. A operação ainda terá que enfrentar as possíveis restrições impostas pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e uma forte pressão dos grandes fornecedores. Galeazzi afirmou que, no NPA, as compras ficarão a cargo do Brasil - mesmo considerando que o Carrefour costuma costurar acordos mundiais com fornecedores multinacionais, a exemplo da Nestlé. "O Brasil manteria certa independência", afirmou.Em relação às lojas, Galeazzi afirmou que deve haver sobreposição especialmente no Rio e em São Paulo. "Nada impede que possamos transferir bandeiras, mudar formatos de loja ou, eventualmente, fechar algum ponto." Enquanto BTG, Estáter e Diniz pensam no futuro de uma companhia única, o Casino, sócio de Diniz na Wilkes, atual controladora do Pão de Açúcar, já pediu a Diniz uma reunião de acionistas. Diniz tem sete dias para responder. Na nova estrutura, além de ter sua participação diluída, o Casino perderia a oportunidade de assumir o controle do Pão de Açúcar, que já era, sozinho, líder nacional do varejo. O Brasil é a mais importante operação do Casino no mundo. Na França, sede da companhia, a empresa tem apenas 12% do mercado, contra 60% do Carrefour. As conversas entre Diniz e o Carrefour vieram a público no fim de maio. Quando soube, Jean-Charles Henri Naouri, o presidente do Casino, pediu explicações a Diniz. O brasileiro teria confirmado a aproximação, mas não deu detalhes. Em 31 de maio, o Casino recorreu à Câmara Internacional de Comércio, em São Paulo, pedindo arbitragem contra Diniz para manter os acordos fechados entre as partes em novembro de 2006 na Wilkes. Cade pode congelar negócio para análise Assim que for anunciada, a fusão entre o Pão de Açúcar e o Carrefour deve ser congelada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) no Brasil.Em seguida, o negócio terá de seguir uma análise minuciosa pela qual a Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae) do Ministério da Fazenda vai verificar todas as cidades do país onde estão os supermercados das duas redes e recomendar a venda de unidades nas quais a presença de lojas de concorrentes é fraca. Essas unidades seriam vendidas para redes que competem com Pão de Açúcar e Carrefour. No caso de grandes cidades, como São Paulo e as capitais do país com mais de um milhão de habitantes, a análise deverá ser feita bairro a bairro.O caso também vai ser encaminhado à Secretaria de Direito Econômico (SDE) do Ministério da Justiça que pode fazer novas recomendações para atenuar o domínio do Pão de Açúcar e do Carrefour na concorrência."Não é algo trivial", afirmou um integrante de um órgão antitruste do governo. Segundo ele, o governo entende que seria prudente que uma operação desse tamanho fosse apresentada previamente ao Cade. Ele explicou que o órgão antitruste pode até analisar eventuais argumentos da empresa de que os efeitos do negócio podem ser maiores na França, mas o foco do julgamento será o impacto nos consumidores brasileiros.Nessa análise, o Cade deve primeiro suspender o negócio para manter as estruturas das redes de supermercados separadas e, depois, discutir a adoção de uma decisão com restrições para evitar prejuízos a concorrentes.Essa prática foi seguida no caso da união entre Pão de Açúcar, Casas Bahia e Ponto Frio. Em fevereiro de 2010, o Cade chamou representantes das empresas para assinar um acordo em que não poderiam fechar lojas e manteriam as marcas separadas e em funcionamento até o julgamento final do negócio.Após o acordo, a Seae indicou um primeiro pacote de restrições ao negócio, que seriam: a venda de ativos em 12 cidades com lojas, instalações, carteiras de clientes e cadastros da Casas Bahia ou do Ponto Frio. Agora, o caso retornou ao Cade, onde o pacote de restrições está em debate.Durante conferência internacional do Instituto Brasileiro de Estudos de Concorrência, Consumo e Comércio Internacional (Ibrac) sobre megafusões, há duas semanas, o secretário de Acompanhamento Econômico, Antonio Henrique Silveira, pediu a advogados de empresas que discutam soluções reais para manter a competição no mercado. Essas soluções podem ser a venda de marcas, fábricas e sistemas de distribuição de produtos. "Parem de dizer que uma fusão com concentração de, por exemplo, 80% é amigável", afirmou Silveira, sem se referir a nenhum processo específico. "As pessoas têm que reconhecer que alguns processos causam prejuízos à competição e temos que ter um diálogo para achar alternativas."No mesmo debate, o presidente do Cade, Fernando Furlan, cobrou das empresas que discutam os efeitos de seus negócios no Brasil, e não apenas os benefícios no exterior. Para ele, não é o Cade que está mais rigoroso com as empresas, mas sim o movimento da economia que leva a casos complexos de megafusões. Indústria vê menor poder de barganha O temor da indústria de alimentos e bebidas - e também de varejistas concorrentes - em relação à possível fusão entre Carrefour e grupo Pão de Açúcar se resume a uma palavra: concentração. "Quanto mais concentração, pior é para os fabricantes", disse o presidente de uma indústria de bebidas, que prefere não ser identificado. "Se nosso poder de barganha diminui, o varejista acaba impondo seus preços", acrescentou. "Com certeza, essa fusão nos prejudica", disse um representante da indústria de carnes. "Havia três varejistas, agora, com esse negócio, serão só dois", lamentou outra executivo do setor. Segundo ele, a maior parte do volume de vendas das indústrias de carne se dirige ao grande varejo, ou seja: Walmart, Carrefour e grupo Pão de Açúcar. No Brasil, segundo a Associação Brasileira de Supermercados (Abras), existem hoje 7.565 supermercados que no ano passado somaram um faturamento de R$ 201,6 bilhões. O grupo Pão de Açúcar (sem incluir lojas de eletrodomésticos, como Casas Bahia e Ponto Frio) entra nessa conta com 615 lojas e vendas de R$ 36,1 bilhões em 2010. O Carrefour tem 236 lojas (sem incluir a rede Dia, que está sendo separada do grupo) e faturamento de R$ 29 bilhões. Nacionalmente, caso a fusão se concretize, as empresas teriam 851 lojas - 11,2% do total - e vendas de R$ 65,1 - o equivalente a 32,2% do faturamento do setor."Olhando para o mercado nacional, a possível fusão não resultaria em aumento da concentração", disse João Galassi, presidente da Associação Paulista de Supermercados (Apas). "Mas se considerarmos só São Paulo, o cenário seria diferente", acrescentou. Em São Paulo - Estado que concentra 36% do faturamento do varejo de bens não duráveis do país - existem 2.473 supermercados. Desse total, 426 são do grupo Pão de Açúcar (17,2%) e 109, do Carrefour (4,4%). Juntas, as duas empresas teriam 588 lojas ou 23,7% do total paulista. Nenhuma das duas companhias divulga quanto faturam só no Estado, mas a Apas calcula que as duas companhias teriam juntas 30% dessa receita. "Com certeza, a indústria vai fazer uma pressão velada ao Cade para que essa fusão não saia", disse um fabricante de alimentos, se referindo ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica. "Nenhum representante irá se posicionar publicamente contra, ou fará essa pressão explicitamente porque a não é do feitio da indústria tomar partido. Mas com certeza o setor vai procurar se defender", afirmou o empresário. Entre os varejistas concorrentes, há interpretações diferentes. "Todo movimento de fusão ou de compra nesses últimos 12 anos se concentrou entre as maiores empresas do setor, que detém cerca de 40% das vendas", afirmou Galassi, que também é dono de uma rede de quatro supermercados em Campinas (SP). "Mesmo com tudo que aconteceu nesse período, os pequenos continuaram crescendo e conquistaram seu espaço", disse ele. Outro varejista, que preferiu não se identificar, prevê que a tradicional "pesquisa de preços" possa estar com os dias contados. "No Brasil, a concentração é ainda pequena, o que faz com que cada loja tenha seu preço. No México, por outro lado, o varejo é muito concentrado e os preços não variam."

Equilíbrio macro: em busca da perplexidade perdida

Equilíbrio macro: em busca da perplexidade perdida
Nós economistas nunca explicitamos a pergunta mais relevante que deveríamos nos fazer e debater abertamente: como é possível um país harmonizar perspectivas tão alvissareiras e construtivas dos agentes econômicos com um equilíbrio macroeconômico que poderia ser qualificado como ruim? Esse é o Brasil, reconhecido como cheio de oportunidades, que atrai investimentos, melhora socialmente e exibe avanços institucionais de dar inveja aos demais países emergentes, sendo ainda o país com os juros mais altos do planeta e dentre os mais caros do mundo. A questão que mais me interessa é a dessa primeira contradição e não tanto a do complexo e aparentemente insuperável enigma dos juros distorcidamente altos no Brasil que iremos discutir adiante. Fazendo a mea culpa, acho que esse é o ponto que deveria intrigar a todos nós economistas: inexplicavelmente, há bastante tempo exibimos certa inapetência intelectual diante da constatação de o Brasil ser o "queridinho" dos mercados e dos investidores na vigência de um equilíbrio macro de qualidade sofrível. Ou seja, o país avança muito bem, ganha status, progride econômica e socialmente, é credor externo líquido, grau de investimento por todas as agências classificadoras de risco, previsível, democracia parruda, tudo isso em sintonia supostamente perfeita com estáveis e confortáveis gastos de 5,6% do Produto Interno Bruto (PIB) apenas em função da elevada carga de juros da dívida pública (últimos 12 meses), a segunda maior do mundo depois da Grécia, por acaso virtualmente quebrada. Diga-se de passagem, a média mundial de carga de juros da dívida pública sobre o PIB é de 1,89%, sendo 1,97% nos emergentes e 1,78% nas economias maduras. Há duas décadas gastamos anualmente cerca de 4,5% do PIB a mais com juros do que a média dos países emergentes. É isso, é só fazer as contas e concluir estupefato que, no Brasil, a média de gastos com juros da dívida pública desde o Plano Real é de 6,5% do PIB. Perdemos a nossa capacidade de ficar perplexos."Ao tentar explicar os juros brasileiros a investidores chineses, percebi que quem 'falava chinês' era eu" É crônico, e durante todos esses anos assistimos a isso em um silêncio intelectual inacreditável, sobretudo diante dos olhares incrédulos dos estrangeiros. Nos últimos 12 meses, gastamos a bagatela R$ 213,9 bilhões em juros da dívida pública, os quais, descontando os R$ 119,6 bilhões de superávit primário, nos levam a um déficit público nominal de R$ 94,3 bilhões, equivalentes a 2,5% do PIB."Mas tudo bem", me dizia essa semana um insuspeito colega do mercado, discutindo um surpreendente quadro com o Brasil exibindo a segunda melhor posição fiscal do G-20. "Olhe só aonde nós chegamos" - dizia ele - "para o fiscal do Brasil ser considerado um dos melhores do mundo, com todos os problemas de qualidade do gasto que temos, o G-20 está realmente em uma situação lastimável. Mas fato é que em termos de solvência estamos entre os melhores", disparou.No turismo, os brasileiros gastam por ano US$ 18 bilhões no exterior e os gringos colocam apenas US$ 6 bilhões no Brasil bonito por natureza. Ou seja, gastamos cerca de três vezes mais. Patético. Por que os brasileiros representam 40% dos compradores de imóveis em Miami? Algo no mínimo estranho. Essa não é nem uma questão de sustentação no médio e longo prazo, porque tal cenário também já vem se mantendo há um bom tempo. A taxa de câmbio está sem dúvida excessivamente apreciada. Ninguém pense que eu esteja aqui sugerindo que possa ser diferente. Razões não faltam para a apreciação, mas da missa, só sabemos a metade: termos de troca altamente favoráveis por conta das commodities em alta, atração de investimentos, sobreliquidez internacional, arbitragem de juros etc. Ou seja, são hipóteses razoavelmente robustas, mas possivelmente insuficientes para explicar toda a apreciação real.A discussão econômica no Brasil passa ao largo da distorção macro como se isso fosse algo intrínseco à trajetória brasileira. Damos de barato que é assim e ponto. Discutimos com uma impassível complacência se os juros reais de equilíbrio no Brasil estão em torno de 6%, 7% ou 8% ao ano, como se a resposta definisse um estado de coisas consolidado e quase insuperável. O que leva o Brasil a ser o queridinho do mercado com um (des)equilíbrio macro desses? Para dar essa resposta, costumo lançar mão do velho argumento de que é assim mesmo, um processo lento e custoso que começou lá os anos 90 quando os juros reais eram 23%, caindo gradualmente para 17%, para 13%, 10%, e hoje, passados 20 anos, estão em torno de 7%. Subirão a 8% no curto prazo segundo o Boletim Focus, mas isso é algo temporário, logo volta para uns 6,5%, me lembra um membro de minha equipe. Nem precisava. Avançamos muito!!! Dentro de uns 10 anos poderemos facilmente chegar a juros reais neutros próximos do que se pratica na média dos países emergentes. Tenho por hábito dizer publicamente que são avanços institucionais cumulativos, inerciais que nos levarão à normalidade um dia. Que alento! Não é necessário decifrar o enigma, basta esperar que chegaremos lá."Resisto a aceitar o argumento de que a indexação seja a causadora de todos os males inflacionários" Essa mera profissão de fé, na prática, acaba gerando uma dificuldade adicional que seria pensar o contrafactual: imagine a economia brasileira com juros reais de 2% (média dos emergentes) e uma taxa de câmbio hoje de uns R$ 2,00 por dólar. Onde estaríamos em termos de inflação, de PIB, de equilíbrio externo? Seria o caos, algum colega diria intuitivamente. Pode ser. Mas, francamente, ninguém tem convicções na previsão das reais consequências. Na verdade, não nos é dado o direito sequer de refletir sobre. Muitos de nós só fazemos o questionamento da distorção dos juros privadamente, jamais em público. Como diz um grande amigo meu, "poucos tem a modéstia de reconhecer a perplexidade que o tema causa ou tem medo de ser taxado de inimigo da boa causa econômica". Entenda-se que estou aqui apenas especulando intelectualmente e jamais sugerindo que atalhos possam ser descobertos para um incerto paraíso. Muito longe disso. A política monetária não pode jamais ser dominada fiscalmente. Tem que seguir fazendo a parte que lhe cabe no latifúndio com autonomia, foco na meta de inflação (de preferência mais baixa) e inteligência estratégica considerando as condições gerais da economia. Isso tem sido um grande avanço do país. Mas a impressão que se tem é que estamos falando da sobrevida de um paciente, que se encontra em condições aparentemente normais, mas que depende de um medicamento muito forte que tem que ser tomado em bases regulares. Caso contrário, ele pode morrer. Ou o que seria mais surpreendente: pode viver. Viver em outro equilíbrio. Qual? Ninguém sabe. Ninguém quer saber. A doença deve ser realmente grave.Em outras palavras, o Brasil está muito bem, sorridente, confiança em alta, todo mundo investindo, e não paramos de ouvir a seguinte frase: "Mas me conta aí, como é que vocês fazem com esse negócio da taxa de juros real de 7% em um mundo de juros reais generalizadamente negativos?" "Como pode uma coisa dessas?" "Como é que se financiam os projetos?"Temos que explicar o inexplicável. É sempre um imenso desconforto ter que catequizar interlocutores, sobretudo os de fora do Brasil, com a tese de que a distorção que experimentamos é algo natural e tranquilo. Não nos afeta em nada e já estamos acostumados. Outro dia tive que explicar o fenômeno para um grupo grande de investidores chineses. No fim das contas, percebi que quem estava "falando chinês" era eu. Por mais talentoso que eu pudesse me julgar nessas ocasiões, ninguém entende esse que talvez seja um caso único na história considerando as décadas de juros reais espetacularmente distanciados da média mundial. A literatura econômica mundial não registra caso similar tão duradouro na história.Fazemos uma ginástica imensa nos argumentos ou, na maior seriedade, partimos direto para o conjunto de explicações supostamente mais fácil que já está na ponta da língua: falta de poupança, risco jurisdicional de conversibilidade, excesso de políticas sociais dando incentivos errados, indexação excessiva, taxa de impaciência alta do brasileiro, muito crédito direcionado, desequilíbrio crônico de oferta e demanda por falta de reformas, incertezas quanto à solvência fiscal de longo prazo, alta volatilidade da inflação, a cultura deletéria do CDI etc. Resisto heroicamente a teses conspiratórias e confesso que já estou na fase de me divertir com a explicação de alguns interlocutores atribuindo o fenômeno ao "rentismo exagerado no Brasil", "interesses escusos" ou à "visão excessivamente ortodoxa de alguns economistas". Se fosse essa a explicação, já teríamos resolvido o tema em cinco minutos.Karl Popper, uma de minhas principais referências teóricas, dizia que a verdade é inalcançável e precisamos nos aproximar dela por tentativas. O estado atual da ciência é sempre provisório. Ao encontrarmos uma teoria ainda não refutada pelos fatos e pelas observações, devemos nos perguntar: será que é mesmo assim?Todos os argumentos que apresentamos aos nossos incrédulos interlocutores são bastante lógicos, fazem algum ou muito sentido, mas isoladamente não explicam os juros distorcidamente altos no Brasil. São todos, sem exceção, refutáveis com contraexemplos aqui e em outros países. A resposta para o enigma possivelmente não está em nenhum dos temas abordados isoladamente, mas tem grandes chances de ser encontrada em todos os temas acumulados, combinados e batidos no liquidificador. Mesmo assim, não é possível afirmar categoricamente que o enigma vá ser decifrado assim. Humildade é requerida diante de nossa incapacidade de compreender totalmente e de endereçar soluções respeitosas às regras do mercado para que os juros convirjam um pouco mais rapidamente para a média dos emergentes. Mas inevitável é que sempre aparecerá alguém dizendo tal como o assessor de Bill Clinton: "É o fiscal, estúpido!" O reducionismo é democrático.Na minha modesta opinião, só nos resta seguir trabalhando muito sério em todas as frentes, incluindo o fiscal, de forma que, subitamente, nos depararemos em algum momento com a convergência das taxas de juros no Brasil para patamares que serão considerados civilizados. Atalhos? Nem ouso, sobretudo para quem acredita piamente como eu que a moeda é uma construção institucional que requer um desenho permanente de incentivos para que seja legitimada socialmente. Não posso, porém, deixar de sobrevoar e questionar algumas das teses mais frequentes sobre os juros altos no Brasil. Chama a atenção a fragilidade maior parte das explicações sobre o tema. Ao fim e ao cabo, todos os argumentos sugerem que se os juros são altos é porque a inflação é alta. Mas, como explicar que países com um nível de inflação similar à do Brasil ou mais alto operam sistematicamente com taxas de juros tão mais reduzidas? Da mesma forma, o argumento campeão é o de que a taxa de poupança no Brasil é baixa, com o que concordamos total e irrestritamente. Mas tantos outros países registram uma taxa de poupança similar à do Brasil com juros muito mais baixos. É claro que precisamos também distinguir a poupança a que estamos nos referindo: a financeira das famílias ou a macroeconômica? A poupança macroeconômica poderia, sem dúvida, ser bem maior com um ajuste fiscal de longo prazo, o que ajudaria muito a resolver imensos problemas no Brasil, inclusive os penduricalhos tributários que engordam a taxa de juros. Uma reforma políticamente viável da previdência cairia muito bem considerando que o Brasil é um "fora de série" na relação entre a idade média da população e os gastos com previdência. Mas atribuir os juros excessivamente altos à ausência de reformas como a da previdência me parece estar a léguas de distância do racional. Afinal, todos os países do mundo precisam dramaticamente fazer reformas da previdência e experimentam juros muito baixos. Superar a péssima qualidade do gasto público no Brasil é agenda para toda uma vida democrática. Quando vejo que aberrações como os gastos com pensões por morte como proporção do PIB (3% do PIB no Brasil contra a metade ou menos nos países da OCDE) serem usadas como argumento quase central para explicar os juros altos no Brasil, fico estarrecido. Reconhecer a pertinência do grave problema responde de forma apenas tangencial à questão em tela. O caminho me parece errado. O questionamento da solvência de longo prazo do setor público também me parece fazer pouco sentido ainda para explicar o grau de distorção dos juros no Brasil. Afinal, como já sugerimos, a despeito das excepcionais circunstâncias internacionais, o Brasil hoje exibe indicadores fiscais bastante razoáveis tanto no que diz respeito à relação dívida como proporção do PIB como em termos de déficit nominal do setor público. Em outras palavras, a pressão dos gastos públicos sobre a demanda não justificaria por si só juros historicamente tão altos. O Brasil está muito longe de ter o monopólio do descalabro fiscal.Por outro lado, faz sentido que a poupança das famílias seja baixa em um país com demanda reprimida por décadas de concentração de renda. Mas mesmo nesse capítulo, outros países emergentes com a mesma propensão a consumir que a brasileira, conhecem taxas de juros substantivamente menores. Ainda com relação a esse tema, um argumento forte é o de que a taxa de impaciência do brasileiro é possivelmente maior do que a observada em outros países. Será mesmo? Em outros países emergentes encontramos as mesmas ansiedades de melhora de vida e convivendo com juros muito baixos. Isso significaria que o brasileiro tem um grau de ansiedade tão grande para obter hoje os bens que poderia esperar alguns anos para acumular que se dispõe a pagar o dinheiro que for (juros que o mercado pedir) visando antecipar o acesso a eles. Em outras palavras, taxa de juros é sinônimo de taxa de impaciência. Essa tese sugere que se os juros fossem a metade dos atuais, teríamos uma explosão de consumo de bens gerando forte pressão inflacionária. Faz sentido? Sim. Explica os juros espetacularmente altos? Muito longe disso. Patético é o argumento que ouvimos recentemente de que o caminho mais rápido para a convergência dos juros para a normalidade seria retroceder na política social brasileira. Nossa política social daria incentivos errados e as pessoas não poupariam por isso. Nada mais lógico e absurdo ao mesmo tempo. Um belo corte nas politicas sociais e os juros iriam rapidinho para a convergência. Está resolvido! Ou então poderíamos adotar a fórmula australiana de gerar um sistemático megadéficit externo e desmantelar o setor industrial para que os juros convergissem rapidamente para o normal. É prático e igualmente inacreditável. Partamos então para a questão da indexação. Eu pergunto: afinal a inflação é alta por causa da indexação ou a indexação está presente porque a inflação é alta? Prefiro o segundo argumento. Qualquer que seja o caso, resisto muito a aceitar o argumento de que a indexação seja a causadora de todos os males inflacionários brasileiros. Em muitos outros países onde a indexação é um esporte amplamente praticado, as taxas de juros são bastante baixas. Isso não significa que devamos abandonar a agenda da desindexação que envolve a construção de um moderno desenho de incentivos para mitigar o problema. Sobre o argumento de um estrutural e histórico desequilíbrio de oferta e demanda, nada mais refutável. Ou seja, essa é a tese de que a oferta cresce sempre atrás da demanda por fatores que travam a produção e os investimentos, diga-se de passagem, que estão crescendo forte e ininterruptamente desde o primeiro trimestre de 2005. Ou seja, o argumento é o de que a falta de reformas impede que a produção acompanhe o crescimento acelerado da demanda. Bem, nesse caso faz sentido, porém o gap de oferta e demanda no Brasil não é tão significativo que não possa ser coberto com importações em uma economia já razoavelmente aberta como a brasileira. Insistimos em crescer acima do potencial. Que teimosia! Esse argumento também me parece bastante frágil para explicar a inflação alta e os juros distorcidos.Há também o argumento da excessiva indexação da dívida pública que me parece bastante robusto ainda que esteja longe de ser uma questão pacificada. A dívida indexada à Selic e o implacável parâmetro do CDI trazem para o curto prazo um custo que deveria ser apenas da dívida de longo prazo.Mesmo que desse mato possa não sair muito coelho, nesse debate me surpreende que os meus ídolos economistas que, no passado, foram criticados por descobrirem a pólvora da moeda indexada quando a corrente majoritária insistia que o problema central da superinflação era o desequilíbrio fiscal, hoje desqualificam, os que veem no tema da indexação da dívida pública um elemento forte para, modestamente, ajudar a explicar os juros elevados no Brasil. Ora, essa questão, no mínimo, merece profunda reflexão. Falta sentido de urgência não apenas aos governos em geral para avançar nas reformas como a nós economistas que, há anos, assistimos de camarote o desfile da carga distorcida de juros no Brasil, sem qualquer perplexidade.
Octavio de Barros é economista-chefe do Bradesco.

Crise do euro e unificação política

Crise do euro e unificação política
Passados mais de 10 anos da introdução do euro surgem dúvidas cada vez maiores sobre sua sustentabilidade a médio prazo. Além de faltar ao euro um Estado para garanti-lo, coube a ele unificar o sistema monetário de países muito diferentes. Podemos identificar dois grupos de países na área do euro. No primeiro, liderado pela Alemanha, o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) é orientado para as exportações, a taxa real de câmbio permanece em patamares razoavelmente competitivos e a situação permite o uso moderado da política fiscal por vários anos como instrumento de política anticíclica. Num contexto de forte apreciação do euro, a competitividade externa da economia alemã foi mantida nos últimos 10 anos graças a uma política de "moderação salarial" adotada pelos sindicatos alemães, os quais, em troca da manutenção dos empregos industriais na Alemanha, aceitaram um crescimento do salário real muito abaixo da produtividade do trabalho. Essa política salarial permitiu uma queda acentuada do custo unitário do trabalho na Alemanha relativamente aos demais países da área do euro, viabilizando a manutenção da competitividade da economia alemã e a importância da indústria e das exportações como motor do crescimento de longo prazo da maior economia da Europa.O problema genético do euro é que ele é uma moeda sem Estado. Isso cria um dilema para a política monetáriaO segundo grupo de países é constituído pelos Piigs: Portugal, Itália, Irlanda, Grécia e Espanha. Nesses países não houve um acordo salarial semelhante, sua taxa de câmbio implícita se apreciou, e tanto o setor público quanto o privado se endividaram. Assim agravou-se o seu problema crônico de competitividade externa, o qual se reflete em grandes déficits em conta corrente (no caso da Espanha quase 10% do PIB em 2008) somado com desequilíbrios fiscais que variam de moderado (no caso da Espanha) a gravíssimo (o caso da Grécia). O regime de crescimento desses países nos últimos anos foi, em larga medida, finance-led, ou seja, liderado pelo aumento do consumo (e investimento imobiliário) financiado com endividamento e aumento dos preços dos ativos. A combinação entre desequilíbrios nos balanços do setor privado e desequilíbrios nas contas públicas nos Piigs cria importantes dilemas de política econômica. Com efeito, o retorno ao crescimento sustentado exige um aumento da demanda doméstica, o que demandaria um forte aumento dos gastos do governo; mas o desequilíbrio fiscal não só torna impossível o uso de uma expansão fiscal como exige, pelo contrário, uma contração fiscal significativa para impedir que a dívida pública como proporção do PIB entre numa trajetória explosiva, o que levaria a um inevitável calote nas dívidas soberanas nesses países com consequências imprevisíveis sobre o combalido sistema bancário europeu. Uma alternativa a esse quadro sombrio seria o Banco Central Europeu (BCE) adotar uma política monetária altamente expansionista com o objetivo explicito de desvalorizar o euro e assim permitir uma elevação da competitividade de todos os países da União Monetária. No entanto, essa alternativa esbarra em duas dificuldades. A primeira é que uma forte expansão monetária provavelmente resultaria em elevação dos índices de inflação naquele grupo de países que não tem problemas de competitividade externa, ou seja, a Alemanha. Dado o peso da economia alemã na área do Euro parece pouco provável que esse tipo de solução possa ser aprovado no âmbito da União Monetária. A segunda dificuldade, ainda mais grave, é de natureza "genética". O euro é provavelmente o único caso na história da humanidade em que uma unificação monetária precedeu a uma unificação política. Isso cria importante dilema para a administração da política monetária. Isso porque, com base na abordagem Cartalista, a moeda é criação do Estado (não do mercado), tendo o seu valor atrelado à capacidade do Estado em impor determinado instrumento como unidade de conta e meio de pagamento. Sendo assim, o problema "genético" do euro é que o mesmo é uma "moeda sem Estado": não há uma autoridade estatal central que imponha o uso do Euro como unidade de conta e meio de pagamento, essa tarefa é exercida pelos governos soberanos dos países que compõe a União Monetária, os quais podem, se assim o desejarem, abandonar a União Monetária. Na ausência de uma autoridade estatal supra-nacional, o valor do Euro tem que ser mantido com base apenas na confiança que o público tem no órgão emissor, ou seja, no BCE. Essa confiança, por sua vez, exige um alto grau de conservadorismo por parte da autoridade monetária europeia, ou seja, exige que o BCE mantenha o valor da moeda por intermédio de uma forte restrição na disponibilidade da mesma, conduzindo assim uma política monetária estruturalmente apertada. Neste quadro, ou se dá um passo atrás, os países endividados saem do Euro, depreciam sua moeda, reduzindo assim os salários e recuperando a competitividade, ou se dá um passo à frente para resolver a o defeito "genético" do euro, qual seja, os países europeus aceleram o processo de unificação política, com a criação dos Estados Unidos da Europa. A segunda alternativa não é fácil, mas foi sempre o objetivo dos países que aderiram ao Euro. Muitas vezes os momentos de crise são momentos de inovação e de avanço. Quem sabe isto poderá ser verdade também desta vez. Luiz Carlos Bresser-Pereira é professor emérito da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo.José Luis Oreiro é professor do departamento de Economia da Universidade de Brasília.

A desindustrialização que ameaça o Brasil

A desindustrialização que ameaça o Brasil

O Brasil festeja a escolha para sede da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016. Comemora o fato de ter saído incólume da crise financeira mundial, e a perspectiva de que a economia continue crescendo. Tudo isso é positivo, mas o país ainda possui deficiências estruturais que precisam ser atacadas agora. Veja o que está acontecendo na indústria.Neste momento, o Brasil corre o risco de se transformar apenas em um grande revendedor de produtos tecnológicos e se desindustrializar. Para se chegar a essa conclusão, a conta é simples: importamos muito mais produtos com alguma tecnologia agregada do que exportamos.Hoje o déficit de tecnologia do Brasil cresce cerca de 20% ao ano. Caminha para ultrapassar os US$ 100 bilhões em 2011. Muitas fábricas - de chips a eletroeletrônicos completos - abriram mão de parte de sua produção. Se antes fabricavam o produto do começo ao fim, agora importam, principalmente da China, uma parte de seus componentes. Os preços são mais baixos do que se fossem produzidos aqui.Os chineses tiram proveito da decisão de empresários ocidentais que preferem terceirizar a produção para ficar apenas com a parte que "agrega valor" à sua marca.As empresas e os empresários ganham rios de dinheiro comprando dos chineses por centavos e vendendo por centenas de dólares, interessados apenas no lucro imediato e a qualquer preço, mesmo ao custo do fechamento de suas fábricas e do brutal desemprego. É o que se pode chamar de "estratégia do avestruz". O boom de empregos gerados atualmente acontece em setores de produtos com baixo valor agregadoO problema é que essa atitude não agrega valor, muito menos ao Brasil, um país que ainda tem muito a fazer para conquistar seu espaço no mercado mundial e está longe de oferecer aos brasileiros, de todas as classes sociais, condições de vida comparáveis às dos chamados países do primeiro mundo. Enquanto os empresários ocidentais terceirizam as táticas e ganham no curto prazo, a China assimila essas táticas, cria unidades produtivas de alta performance e vai dominar o mercado de produtos de massa no longo prazo.A substituição da produção local pela importação de produtos chineses - sejam eles componentes ou mercadoria acabada - leva, a longo prazo, ao sucateamento do parque industrial brasileiro.A magnitude dos números é um bom exemplo: se uma fábrica brasileira produz um milhão de unidades do produto X, uma só fábrica chinesa produz quarenta milhões de unidades. A qualidade dos dois é equivalente, mas a velocidade de produção e atendimento que a China oferece são impressionantes.Os chineses colocam qualquer produto no mercado, em qualquer lugar do planeta, em semanas, com os preços que são uma fração dos praticados aqui.Com a importação dos produtos chineses, o preço do produto final cai, o que é bom para o consumidor, mas é péssimo para o trabalhador brasileiro que, no final das contas, perde seu emprego para um trabalhador chinês.No Brasil, o boom de empregos gerados atualmente acontece em setores de produtos com baixo valor agregado. Ou seja, onde se contrata mão de obra barata e de baixa qualificação.Recebemos só neste primeiro trimestre de 2011 investimentos da ordem de US$ 17,5 bilhões.Mas eles não se refletem em ganhos em tecnologia já que o déficit, nesse setor, não para de crescer. Uma parte desse dinheiro estrangeiro pousa no país, atraída pelos ganhos financeiros proporcionados pelos juros altos. E a fatia que vai para instalação de fábricas repete o modelo prejudicial ao Brasil: são empresas que importam componentes e produtos acabados de fora - ou seja, são apenas montadoras e maquiadoras de produtos.É esse modelo que precisa ser revisto. Se mantido o atual perfil de investimento em produção, num futuro próximo a China se mostrará ainda mais inalcançável.Veremos os produtos chineses aumentando os seus preços, com as empresas produzindo um choque de produtos de valor agregado, como aconteceu com o choque do petróleo nos anos 70. E aí já será tarde demais. O mundo então perceberá que reerguer as suas fábricas terá um custo proibitivo e irá render-se ao poderio chinês; pois, alimentou um enorme dragão e acabou se tornando refém da criatura.O resultado desse modelo é desastroso. Num ranking global de competitividade, que mede o ambiente de negócios de uma nação, o Brasil, que é a oitava economia do mundo, ficou em 44 lugar, perdendo seis posições em relação ao levantamento do ano passado.O estudo foi feito pelo Instituto Internacional para o Desenvolvimento da Administração, da Suíça, em parceria com a Fundação Dom Cabral, de Minas Gerais. Fomos ultrapassados por países como Peru, Filipinas, Turquia e Emirados Árabes.E o ciclo é vicioso, já que quanto mais se importam produtos de tecnologia agregada, menos precisamos da nossa mão de obra especializada, colocando nossos jovens qualificados com dilema difícil, ou se sujeitam a ficar no Brasil em funções aquém de sua capacidade ou vão buscar alternativas em outros países.O cenário nos coloca a perspectiva de o Brasil se tornar um país importante, entre as cinco economias mais poderosas do mundo, mas sem liderar seu próprio desenvolvimento tecnológico. É isso que queremos? Certamente não.Nossas deficiências não são novas e estão aliadas a dificuldades igualmente antigas, como um câmbio que favorece a importação de peças e componentes, a alta carga tributária incidente sobre a produção e uma legislação trabalhista ultrapassada. Sem contar a burocracia e a ineficiência do setor público que ano após ano seguem inalteradas.Muitos desses acertos podem ser feitos de imediato, mesmo sem as famosas mudanças estruturais. É possível ajustar tarifas para que o Brasil importe o que necessita e abra espaço para o uso de tecnologia na produção local. A carga tributária pode ser usada como mecanismo de incentivo a quem investe em pesquisa & desenvolvimento. A burocracia pode ser reduzida, com mais agilidade para quem quer fazer negócios. Tudo isso sem contar que a legislação trabalhista precisa ser modernizada e o setor público carece de um choque de eficiência.Sem que nada disso se altere, a perspectiva é preocupante para a indústria brasileira. Reflitam, corremos ou não o risco da desindustrialização?José Milton Dallari, ex-secretário de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda, integrante da equipe que implantou o Plano Real. É sócio da Decisão Consultores.