CAFÉ: ONU ALERTA QUE AQUECIMENTO GLOBAL AMEAÇA LAVOURAS BRASILEIRAS
Alimento mais consumido pelo brasileiro, à frente do arroz e
do feijão, o popular cafezinho pode perder o lugar cativo nas mesas de todo o
país devido às mudanças climáticas. Dados da segunda parte do quinto
relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU
(IPCC, na sigla em inglês), divulgada neste domingo (30), revelam que o aumento
da temperatura média global pode reduzir as áreas destinadas ao cultivo do
grão, especialmente o da variação arábica, que responde por 70% da demanda
global.
O impacto seria maior em países como o Brasil, maior produtor e exportador
mundial de café. Hoje, uma a cada três xícaras de café consumidas no mundo
é produzida em solo brasileiro. Outros alimentos, como cacau e chá, também
poderiam ser severamente afetados pela onda de calor.
Baseado em uma compilação de estudos já publicados sobre o efeito do
aquecimento global na produção de café, o relatório, divulgado em Yokohama,
no Japão, aponta que a combinação de altas temperaturas e escassez de
recursos hídricos diminuiria consideravelmente o cultivo do grão nos
principais Estados produtores no Brasil, como Minas Gerais e São Paulo. Nesses
Estados, diz o IPCC, um aumento de 3 C na temperatura global reduziria o
potencial de cultivo das áreas destinadas ao plantio de café de 70-75% para
20-25%, enquanto que a produção em Goiás seria eliminada.
Em São Paulo, que responde por 10% do total de café colhido no Brasil, o
aquecimento global reduziria a produção em 60%, causando perdas equivalentes a
US$ 300 milhões (R$ 680 milhões). "Essa tendência já vem sendo observada
nos últimos anos. Entre 1998 e 2008, somente o Estado de São Paulo perdeu 35%
de área cultivada com café arábica, a maioria substituídas por seringueira e
cana-de-açúcar, que são plantas mais tolerantes ao calor e às estiagens
mais longas. Nessas áreas, as temperaturas médias subiram mais de 1,5 C,
afetando diretamente o florescimento (dessas plantas)", afirmou à BBC Brasil
Hilton Silveira Pinto, professor da Unicamp e um dos autores do estudo citado no
relatório do IPCC.
"Por outro lado, poderá haver um incremento de produção em regiões
hoje mais frias, como Paraná, Santa Catarina e do Rio Grande do Sul, mas esse
acréscimo não será capaz de compensar as perdas gerais da cultura",
acrescentou ele.
Cálculos matemáticos
A partir de simulações matemáticas, Silveira Pinto, da Unicamp, e
Eduardo Assad, da Empraba, fizeram uma estimativa futura sobre a redução da
área destinada ao cultivo do café em dois cenários: um otimista (B2), segundo
o qual a temperatura global deve crescer entre 1,4C e 3,8C até 2100, e
outro pessimista (A1), que prevê uma onda de calor entre entre 2C e 5,4C no
mesmo período.
No primeiro cenário, os pesquisadores estimaram uma queda de 6,75% na
área destinada ao cultivo do café até 2020. Mas em 2050, o total de terrenos
propícios ao plantio do grão poderia diminuir 18,3%, chegando a 27,6% em 2070.
Nesse contexto, o aquecimento global poderia trazer prejuízos de R$ 600
milhões em 2020, R$ 1,7 bilhão em 2050 e R$ 2,55 bilhões em 2070,
acrescentam.
Já no segundo cenário, o mais pessimista, a queda da área de baixo risco
começa com 9,48% em 2020, subindo para 17,15% em 2050 e chegando a 33% em
2070, o que representaria um perda de R$ 882 milhões, R$ 1,6 bilhão e R$ 3
bilhões, respectivamente.
Brasil
Em 2013, ano considerado de safra curta, a produção total de café no
Brasil foi de 2.918.652 quilos, o equivalente a 48,6 milhões de sacas de 60
quilos. Neste ano, o IBGE prevê um aumento de apenas 0,1% na produção, que
deve alcançar 2.922.303 quilos.
No entanto, estima-se que haverá uma redução de 3,2% da área destinada
à colheita do café arábica, que responde por dois terços da produção
total. Se a previsão for confirmada, será a primeira vez em mais de 20 anos
que não será observada a alternância de safras.
Isto é, safra cheia nos anos pares e safra curta nos ímpares. De 1992 a
2013, a tendência foi observada sem interrupções. As estimativas já levam em
consideração o impacto do clima extremo que atingiu as fazendas de café
brasileiras neste ano, depois que uma seca de grandes proporções eliminou 25%
das lavouras e forçou 140 cidades a racionar água.
Porém, entidades do setor dizem que as previsões do IBGE estão
descoladas do mercado. Segundo elas, a produção será ainda menor do que a
prevista pelo instituto, dadas as intempéries relacionadas às mudanças
climáticas.
Por causa das altas temperaturas, a colheita do café também teve de ser
antecipada neste ano entre 15 a 25 dias. No caso do arábica, a colheita, que
normalmente ocorre no final de maio, foi adiantada para o início do mesmo mês.
Já os produtores da variação robusta (ou conilon) que tradicionalmente
é colhida antes do arábica devido à fenologia, deverão começar para valer a
colheita em meados de abril, quando isso seria feito somente no início de
maio, após chuvas abundantes terem antecipado as floradas e favorecido a
formação do grão, segundo a agência de notícias Reuters. As informações
são da BBC.