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quarta-feira, 6 de julho de 2011

`O investidor acha que fizemos um mau negócio`, diz Barbassa

`O investidor acha que fizemos um mau negócio`, diz Barbassa

A Petrobras atingiu seu maior valor de mercado no dia 21 de maio de 2008, quando chegou a R$ 510,4 bilhões. Em setembro de 2010, época da capitalização seguida da "cessão onerosa" de barris pelo acionista controlador, o governo, o valor foi a R$ 362,8 bilhões. Ontem, estava em R$ 325,6 bilhões. Neste ano, a empresa perdeu R$ 55 bilhões.Para especialistas ouvidos pelo Valor, a destruição de valor só deve ser revertida quando aumentar a confiança do mercado na empresa. Parte dessa retomada depende da qualidade dos investimentos que a companhia planeja executar, alguns já em marcha.Almir Barbassa, diretor financeiro da estatal, acha que a perda de valor das ações é resultado de um conjunto de fatores que passa pela capitalização com barris de petróleo (cujo preço foi considerado elevado na época), aumento da percepção de interferência do governo na companhia e a impossibilidade, momentânea, de ampliar a comunicação com o mercado."A capitalização não foi bem entendida e ainda não foi digerida. O investidor acha que fizemos mau negócio", admite. O executivo também menciona um ponto nevrálgico: o controle da companhia pelo governo, que aumentou sua fatia de 39,8% para 48,3% do capital social após a capitalização com 5 bilhões de barris do pré-sal."Os investidores julgam que houve falta de governança e que pagamos caro pelos barris [da cessão onerosa] porque o governo era o vendedor. Veem problema no preço acertado. Mas estamos convencidos de que fizemos um ótimo negócio", diz.Uma das reclamações dos investidores na capitalização dizia respeito ao preço de cada barril negociado entre a Petrobras e a Agência Nacional do Petróleo (ANP) e Ministérios da Fazenda, Minas e Energia e Casa Civil. O valor fixado no contrato de cessão onerosa foi de US$ 42,5 bilhões (R$ 74,8 bilhões). A revisão do preço está prevista para 2014 no contrato com a União e esses barris, cuja aquisição serviu para aumentar o valor patrimonial da empresa, podem estar até mais caros quando forem recalculados. Nesse caso, a Petrobras ainda terá que pagar a diferença para o governo.Barbassa lembra que o preço dos 5 bilhões de barris negociados no ano passado é "quase provisório", mas acha que o mercado não está percebendo as possibilidades de a Petrobras adicionar valor ao negócio. Ele destaca duas coisas que, a seu ver, estão sendo deixadas de lado nas avaliações (negativas) feitas pelo mercado depois da capitalização. A primeira delas é o fato de a companhia ficar exposta ao preço do petróleo (que tende a subir) com grande volume de reservas adicionadas; a segunda são efeitos benéficos das sinergias e da evolução tecnológica que serão colocadas em práticas na fase de exploração do pré-sal. Também não ajuda o fato de a companhia estar tendo dificuldades óbvias para ter aprovado seu novo plano de negócios. E isso se soma às críticas quanto ao aumento dos investimentos em refino construindo quatro novas refinarias de grande porte e ao aumento dos investimentos em produção de etanol. São projetos que vêm aumentando a percepção de risco político da companhia e que colocam a estatal diante do velho dilema: tudo que é bom para a Petrobras é bom para o Brasil? E vice-versa? Se de um lado é benéfico para o país aumentar a capacidade de refino para evitar déficits bilionários na balança comercial, o mesmo pode ser dito com relação à Petrobras? Por que ela não pode aumentar primeiro a produção de petróleo para então, fortalecida e com caixa, investir em refino mais à frente? Para Barbassa, esse dilema não existe e os temores são infundados. "Se o governo tivesse intenção de fazer coisas ruins para o acionista não colocaria US$ 42,2 bilhões na capitalização. Nem iria fazer algo para perder arrecadação e dividendos com prejuízos para a economia", pondera, ressaltando que ao vender petróleo bruto e importar derivados a companhia perde margem de US$ 8 por barril.O diretor também contesta as suspeitas de controle, pelo governo, do preço dos derivados com o objetivo de conter a inflação. E repete que a companhia pratica uma política que garante, no médio prazo, preços iguais aos do mercado americano. "Um aumento nos preços seria insignificante em termos de variação de caixa. Claro que não estamos falando de se segurar [os preços] por anos, aí se poderia alegar controle de preços. Mas o que temos feito é trabalhar com a média." Barbassa acha que grande parte das dúvidas poderá ser sanada depois que o novo plano de negócios for divulgado. Ele não entra em detalhes sobre o plano, que tem 580 projetos orçados em mais de US$ 25 milhões cada um. Diz apenas que os investimentos estão sendo analisados para serem consistentes, garantirem a saúde financeira da companhia, preservarem os "ratings" e a capacidade de alavancagem, sem colocar a empresa em risco e sem a necessidade de novas emissões. O executivo respondeu a uma comparação feita na semana passada por Frederic Fromm, gestor especializado em recursos naturais da Franklin Equity Group, braço da Franklin Templeton, para quem empresas sem controle governamental pagam dividendos especiais para os investidores ou recompram ações. "Com a carteira de projetos que a Petrobras tem, que é única no mundo, alguém ainda fala em recompra de ações? Quem está fazendo isso não deve ter projetos. A ação da Petrobras tem um grande potencial. Comprar Petrobras hoje é a forma mais barata do mundo de se adquirir petróleo", rebate.

Nespresso para bebê faz mamadeira

Nespresso para bebê faz mamadeira
A maioria dos pais passou pelo menos uma noite na vida procurando freneticamente uma mamadeira limpa, misturando e esquentando leite em pó e esperando esfriar até a temperatura adequada - tudo isso enquanto tentava acalmar um bebê faminto. A Nestlé, a empresa que transformou suas máquinas domésticas de café expresso Nespresso em uma divisão de US$ 3,9 bilhões, acha que tem como ajudar: uma pequena máquina Nespresso só para as crianças. A nova máquina BabyNes da empresa suíça esquenta cápsulas de leite em pó Nestlé, eliminando os grumos que às vezes se formam quando se mistura leite em pó, e despeja uma quantidade exata numa mamadeira deixada em espera. Pode ser operada com uma só mão, deixando a outra livre para lidar com a criança aflita. Essa praticidade não sai barato. O BabyNes - que estreou no mercado suíço em maio e vai ser comercializado em âmbito mundial a partir de 2012 - custa US$ 300. As cápsulas de leite em pó Nestlé próprias para a máquina custam o triplo do preço do café expresso lacrado da empresa. O uso diário do BabyNes aumenta em US$ 650 o custo anual de uma nova boca a alimentar, comparativamente ao leite em pó tradicional, segundo cálculos da Bloomberg. Susanne Seibel, analista do Barclays Capital, considera que o BabyNes é um produto para famílias sem restrições orçamentárias e que não vai se tornar de uso generalizado de imediato. Isso pode explicar por que a Nestlé - a maior empresa de produtos alimentícios do mundo - está começando na Suíça, onde uma em cada dez famílias tem um patrimônio de mais de US$ 1 milhão, segundo o Boston Consulting Group. "Não há sensibilidade ao preço quando o assunto são bebês", diz Seibel. "As pessoas até tendem a ultrapassar ligeiramente o limite." O BabyNes reforça as fileiras dos produtos caros e sofisticados desse segmento que vão desde os carrinhos Bugaboo, que custam US$ 979, para todos os tipos de superfície, até um aparelho de US$ 29,95 que esquenta lenços umedecidos antes que eles toquem a pele dos bebês. Entre os produtos dessa área mais vendidos da Amazon.com estão um monitor de vídeo em cores, a US$ 139, e o aspirador nasal NoseFrida Snotsucker, comercializado a US$ 14,54. As vendas anuais das máquinas BabyNes poderão alcançar 500 milhões de francos suíços (US$ 600 milhões) dentro de dois anos, estima Jon Cox, analista da Kepler Capital Markets de Zurique. O sistema, que livra de apuros, também poderá contribuir para prolongar o tempo que os pais dão leite em pó aos bebês antes de iniciá-los na ingestão de comida sólida, diz ele. Ansiosa por reeditar as taxas de crescimento das vendas anuais do Nespresso, de 40%, a Nestlé está fabricando máquinas que preparam chá e até "smoothies" (uma espécie de vitamina ou milk-shake de frutas). Ao vender as máquinas e cápsulas exclusivas on-line, a empresa suíça "prende" os clientes a suas marcas e elimina intermediários. A Nestlé concorre com a Béaba, a fabricante francesa do Bib'expresso, que custa cerca de metade do preço do BabyNes e não aprisiona os pais a uma única marca de leite em pó. A publicidade pode ser uma dificuldade maior, no entanto, uma vez que o código de marketing da Organização Mundial de Saúde (OMS) para leite em pó e fórmulas para bebês recomenda que os países proíbam a promoção de substituto ao leite materno. A Nestlé é alvo de boicotes desde 1977, quando um grupo chamado Infant Feeding Action Coalition disse que os bebês estavam morrendo nos países em desenvolvimento, onde as mães diluíam excessivamente o leite em pó para fazer com que durasse mais, ou o misturavam a água contaminada. Martin Grieder, que trabalhou por oito anos na Nespresso antes de chefiar a divisão de leite em pó, diz que a Nestlé adota o código da OMS. Uma porta-voz diz que a Nestlé segue as diretrizes em 152 mercados "de alto risco", como China, Índia e Rússia. Em países de baixo risco, como os Estados Unidos, a empresa segue a legislação nacional, que pode ser mais liberal. O site e o manual do usuário do BabyNes dizem aos consumidores que a amamentação é a melhor opção. Para contribuir para aumentar as vendas, a Nestlé permite que os compradores devolvam uma máquina BabyNes dentro de 30 dias, caso não gostem. Na tentativa de atender às preocupações com custo, a Nestlé também planeja autorizar os consumidores a alugar os aparelhos ou a devolvê-los por cerca de 30 francos suíços (cerca de US$ 36) assim que o bebê crescer e deixar de precisar deles. Mesmo assim, nem todos os pais estão convencidos que o BabyNes seja um produto obrigatório. "É gasto desnecessário", diz Andrea Pantoja, mãe de uma garota de 21 meses de Genebra. "Para fazer uma mamadeira de leite em pó, não se precisa mais do que esquentar água."

Risco e oportunidade

Risco e oportunidade
FSP Governo não tem muitas opções contra a valorização do real, mas deve usar alta de commodities para fortificar a competitividade nacional Já não causa mais tanta surpresa o longo processo de valorização do câmbio, que levou a moeda nacional ao patamar de R$ 1,55 por dólar, menor cotação desde o início do regime de livre flutuação cambial, em janeiro de 1999.Ajustado pela inflação, o dado se mostra ainda mais contundente: hoje o real se encontra no ponto de máxima valorização diante do dólar desde o início do Plano Real, em meados de 1994.Algumas das causas da valorização são antigas e bem conhecidas. Em especial, a permanência dos juros altos.É fato que os juros reais (descontada a inflação) no Brasil recuaram do patamar superior a 10% ao ano, no início da década passada, para cerca de 6% atualmente. Mas ainda é grande a diferença em relação à média global, em particular diante de taxas próximas de zero no mundo desenvolvido. Isso atrai os dólares do investidor estrangeiro, que aqui embolsa o diferencial entre as taxas de juros ("arbitragem").Trata-se de poderoso incentivo para a vinda do capital especulativo, que não dá mostras de ceder mesmo com o aumento do imposto sobre captações externas de curto prazo. O juro alto também induz empresas a se endividarem no exterior, a custo mais baixo. Do fim de 2009 a maio último, a dívida externa privada cresceu 43%, para US$ 284 bilhões.Há, porém, outras e novas causas para a valorização, cada vez mais determinantes. A que chama mais atenção é o aumento vertiginoso dos preços em dólar dos produtos exportados pelo país, como alimentos e minério de ferro, que avoluma o fluxo de moeda forte.Trata-se de um "presente" do restante do mundo ao Brasil, um choque de riqueza de quase 2% do PIB ao ano, que tende a se manter, no cenário atual de escassez global de commodities. Considerando também o potencial impacto das exportações de petróleo do pré-sal, o país poderá viver longo período de sobra de dólares.A questão é o que fazer com esse saldo, a princípio benéfico, mas que traz efeitos colaterais. O principal é a perda de competitividade dos setores não ligados às matérias-primas, que veem os custos subir em moeda nacional e perdem com o câmbio valorizado, o que encarece seus produtos exportáveis. O país enfrenta um risco sério de perda de densidade industrial, com a decadência dos ramos menos competitivos, o que poderá comprometer a geração de empregos no médio prazo.A bonança de dólares não durará para sempre. Tão importante quanto tentar mitigar a presente e quase irrefreável valorização do real é usar receitas de exportações para restaurar a competitividade, com capacitação de mão de obra, investimento em logística, cortes de custos e políticas inteligentes para a indústria e a inovação.Do contrário, o país desperdiçará sua maior oportunidade em décadas, sem consolidar um sistema produtivo diversificado, capaz de manter o crescimento quando piorarem as condições externas.

Governo age no etanol, mas patina nos alimentos

Governo age no etanol, mas patina nos alimentos
Embora tenha dado um refresco a bolsos mais sensíveis nos últimos dois meses, o aumento dos preços dos alimentos, e seu impacto nos índices de inflação, ainda provoca preocupação no governo. E as previsões pouco otimistas sobre a produção de etanol têm deixado consumidores apreensivos e ministros em alerta máximo.Ainda longe do auge da colheita da cana-de-açúcar, os preços do etanol hidratado subiram 72% em 12 meses encerrados em março deste ano. Entre abril e maio, recuaram 28%. Mas ainda continuam altos, bem acima do que era esperado. Diante disso, o governo enxergou a urgência de agir para conter expectativas de nova alta nos preços ao longo da entressafra - além de sinalizar com a garantia do abastecimento interno.Em meio ao cenário de eventual escassez de etanol, a presidente Dilma Rousseff já decidiu reduzir, de 25% para 18%, a mistura do etanol anidro na gasolina. A medida será formalizada pelos quatro ministros integrantes do Conselho Interministerial do Açúcar e do Álcool (Cima) até a próxima semana. Estima-se, com isso, diminuir o consumo anual do anidro em 2,2 bilhões de litros, o que significaria uma "folga" de 30% na demanda pelo combustível. E, talvez, um sono mais tranquilo aos formuladores da política energética.Dilma decidiu reduzir mistura do etanol na gasolinaA medida ajudará a "preservar" a "demanda própria" pelo etanol hidratado nas bombas dos postos, informou um ministro ao Valor. "O desempenho da cana está aquém do esperado. Há mais dificuldades e são necessárias medidas para garantir o abastecimento. O aumento da produção demandará tempo", diz o ministro.Em jogo, estão um bem intangível, que é a confiança dos milhões de donos de veículos com motor "flex fuel", e um dado objetivo: o futuro da cadeia produtiva do etanol. E foi essa mensagem que Dilma deu pessoalmente a um grupo de usineiros, reunidos há 20 dias na casa do ministro da Agricultura, Wagner Rossi, em Ribeirão Preto (SP). É preciso preservar, de qualquer maneira, o programa do etanol.A redução da mistura do anidro terá um efeito colateral, avalia o governo. O consumo de gasolina será maior. Mas não existe saída fácil nessa equação, já que situação semelhante ocorreria com a redução da oferta do etanol hidratado. Entretanto, no lado do controle inflacionário, haverá ganhos. A medida ajudará a domar os preços monitorados pelo governo. Neste ano, eles subiram quase 6% até maio. E boa parte dessa carestia foi provocada pelo etanol anidro misturado à gasolina.A saída perfeita planejada no governo é estimular a produção de etanol. Por isso, a presidente Dilma já determinou ao BNDES medidas para retomar os investimentos no segmento. O banco começou a negociar com usineiros, nesta semana, a criação de duas linhas: uma para a construção de novas plantas industriais de etanol ("greenfield") e outra para a ampliação de usinas em atividade ("brownfield"). A atenção dispensada ao etanol tem uma razão mais ampla. O governo projeta dificuldades com os índices inflacionários de produtos agrícolas neste segundo semestre. Em 12 meses, até maio, o grupo alimentos e bebidas registrou inflação de 8,2%. É um índice bem acima do IPCA, cuja variação foi de 6,55% no mesmo período. O grupo alimentos responde por 21% do conjunto do IPCA. Alguns preços se mantiveram em alta e outros recuaram abaixo do esperado durante o pico da comercialização da safra recorde de grãos, fibras e cereais.Avaliações internas do governo mostram que, nos próximos seis meses, os preços da comida devem voltar a subir, ainda que em menor intensidade do que observado no início deste ano. O consumo interno continuará aquecido, ainda sob o efeito da ascensão de milhões de brasileiros à chamada classe C. E a demanda externa, puxada por China, Rússia, parte do Oriente Médio e países asiáticos, seguirá forte. Há procura cada vez maior por proteínas e carboidratos. É uma questão estruturante, avalia-se no governo. O crescimento da renda, somado ao quase pleno emprego, segue como fator "fundamentalista" internamente. E a oferta não cresce no mesmo ritmo da demanda. Os preços subiram e devem permanecer acima do degrau anterior. Os alimentos, segundo essa análise, não vão contribuir para reduzir a inflação. Os efeitos da sazonalidade serão cada vez menores e os preços serão mais elevados do que em períodos anteriores. Alguns exemplos ilustram a projeção. O preço da arroba do boi gordo descolou-se da média histórica de R$ 56,70, entre 2007 e 2011, chegando a R$ 93,14 nos últimos dois anos. Neste ano, a média subiu ainda mais, atingindo R$ 102,30. A saca de açúcar passou de R$ 38,77 para R$ 62,28 na mesma comparação. E o café saltou de R$ 220,65 para R$ 375,40. Uma ida ao supermercado comprova remarcações no leite, no feijão, na farinha de trigo e até no arroz, que exibe uma supersafra no Sul do país. E os efeitos das severas geadas têm prejudicado produtos hortigranjeiros, também bastante influentes na composição dos índices.Como se vê, o Banco Central terá um bom trabalho para garantir, em 2012, a convergência da inflação para o centro da meta de 4,5%. Em 2011, parece difícil até mesmo cumprir o teto de 6,5%.Mauro Zanatta

"Indice de miséria" segue baixo no país, ainda estimulando o consumo

"Indice de miséria" segue baixo no país, ainda estimulando o consumo
A soma da taxa de desemprego e da inflação segue no mesmo nível desde dezembro do ano passado, mantendo-se em patamares baixos para padrões brasileiros. O recente aumento do Indice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumulado em 12 meses foi compensado pelo recuo da taxa de desocupação, feito o ajuste sazonal. Em maio, o chamado "índice de miséria" ficou em 12,4 pontos, resultado da combinação de um desemprego de 5,8%, em termos dessazonalizados, e de um IPCA de 6,6% em 12 meses, segundo números da MB Associados. Nos últimos seis meses, o indicador tem oscilado entre 12,2 pontos e 12,4 pontos. É um pouco acima da mínima atingida em agosto e setembro de 2010, de 11,1, mas confortavelmente abaixo da média de 16,9 observada entre 2002 e 2009. Para o economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale, é um patamar que ainda tende a estimular o consumo, embora com menos intensidade do que no melhor momento do ano passado. "O 'índice de miséria' é um conceito tradicional que mede a percepção da população em relação a sua situação econômica", diz Vale. A queda mais significativa do número se deu a partir de 2006, período a partir do qual a popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva subiu com força, até atingir níveis recordes, superando os 80% de aprovação. No começo do governo Lula, porém, o "índice de miséria" alcançou números bastante elevados, chegando a beirar 30 em maio de 2003. O desemprego chegou a 12,5% e o IPCA em 12 meses, em 17,2%, com o forte impacto inflacionário provocado pela desvalorização do câmbio ocorrida no ano anterior.Com a redução da inflação para níveis mais próximos do centro da meta perseguida pelo Banco Central, de 4,5%, e a progressiva queda do desemprego, o "índice de miséria" caiu bastante nos anos seguintes. No terceiro trimestre de 2009, chegou à casa dos 12 pontos.Vale não acredita em novas reduções expressivas do indicador daqui para frente. Ele espera que o índice termine o ano em 11,9, considerando que o IPCA fecha 2010 em 6,3% e a taxa de desemprego em 5,6%, na série com ajuste sazonal. Desse modo, a percepção da população em relação à situação econômica tende a ficar estagnada, um quadro que pode se repetir até 2014, acredita Vale, por não ver uma redução significativa da inflação ou do desemprego nos próximos anos. O economista José Márcio Camargo, da Opus Gestão de Recursos, vê com ressalvas o "índice de miséria", por ser um indicador composto que atribui pesos iguais às taxas de inflação e de desemprego. Ele chama a atenção também para o fato de que um número baixo não necessariamente reflete uma situação favorável. Um país pode ter um desemprego mais alto e uma inflação bastante baixa, mas num ambiente recessivo, que resulte numa soma modesta dos dois indicadores. No caso brasileiro, houve uma combinação bastante virtuosa entre maio e agosto de 2010, quando ocorreu uma diminuição simultânea da taxa de desemprego e da inflação em 12 meses. No terceiro trimestre de 2010, o consumo das famílias cresceu 1,7% sobre o trimestre anterior, na série livre de influências sazonais, uma alta considerável. No ano, houve alta de 7% do principal componente da demanda. Para os próximos meses, Camargo acredita que a taxa de desemprego pode cair ainda mais, em termos dessazonalizados. "O segundo semestre tende a ser sazonalmente mais aquecido no mercado de trabalho", diz ele. A questão é que, ao mesmo tempo, o quadro favorável para o emprego e a renda mantém a inflação sob pressão. Hoje, os analistas esperam que, o IPCA siga em alta no acumulado em 12 meses até alcançar a casa de 7% no terceiro trimestre, para só então recuar e fechar o ano um pouco acima de 6%. Em resumo, a aposta dominante dos economistas aponta para pouco espaço para uma queda relevante do "índice de miséria" neste ano. Vendas do varejo têm leve desaceleração no 1º semestre O comércio brasileiro encerrou o primeiro semestre com crescimento de 9,6% em relação ao mesmo período do ano passado, o que representa leve desaceleração da atividade, mostra o levantamento da empresa de análise de crédito Serasa Experian, com base no volume de consultas mensais feitas por estabelecimentos comerciais à base de dados da empresa. Entre janeiro e junho de 2010, o comércio varejista havia apresentado avanço um pouco maior, de 10,7%, em relação aos primeiros seis meses do ano anterior. No segundo semestre, a alta foi de 10%, frente ao mesmo período de 2009. Apesar do ciclo de aumento da taxa básica de juros e das medidas de restrição ao crédito adotadas pelo Banco Central desde o ano passado, o bom momento do mercado de trabalho conseguiu sustentar desempenho favorável para a atividade varejista na primeira metade do ano, avaliam os economistas da Serasa.Para o segundo semestre a previsão é de que a desaceleração da atividade do comércio seja mais intensa, por conta da continuidade do aperto monetário e da perspectiva de crescimento mais moderado da economia.Na análise por setores, o destaque foi o segmento de material de construção, que registrou avanço de 12,8% frente ao primeiro semestre do ano passado. Em seguida, aparecem as categorias móveis, eletrônicos e informática, com alta de 9,3%, e combustíveis e lubrificantes, com incremento de 9,3%. Apenas os segmentos de tecidos, vestuário, calçados e acessórios encerraram o semestre com queda (-0,9%)Em relação a maio, os resultados de junho ficaram estáveis, na comparação livre das influências sazonais. Quatro segmentos caíram: combustíveis e lubrificantes (0,2%), veículos, motos e peças (2,5%), tecidos, vestuário, calçados e acessórios (-0,3%) e material de construção (-2,8%). Apenas dois tiveram variação positiva: supermercados, hipermercados, alimentos e bebidas (+0,7%) e móveis, eletroeletrônicos e informática (+0,1%).

Mantega afirma ainda ter armas para usar na "guerra cambial"

Mantega afirma ainda ter armas para usar na "guerra cambial"
O Brasil está preparando uma série de medidas adicionais para conter a prejudicial valorização do real, num momento em que a guerra cambial mundial não dá mostras de estar chegando ao fim, segundo Guido Mantega, o ministro da Fazenda do país.Em entrevista concedida ao "Financial Times" em Londres, Mantega disse que os países do G-20 ainda estão longe de conquistar sua meta de pactuar novas diretrizes para administrar o câmbio. Afirmou ainda haver "brigas entre países", como EUA e China, e que a guerra cambial mundial "absolutamente não acabou".O lento crescimento e as baixas taxas de juros das economias avançadas continuam a impor pressões de alta à moeda brasileira, disse Mantega, o que obriga as autoridades a estudar novas medidas de intervenção nos mercados cambiais e de derivativos a fim de impedir a divisa de disparar para níveis não recomendáveis."Sempre temos novas medidas a adotar", disse ele ao "Financial Times", paralelamente a um encontro com investidores, dando indícios de que elas não serão pré-anunciadas, mas que incluiriam intervenção no mercado. Na terça-feira, o Banco Central brasileiro anunciou também um leilão no mercado à vista para a compra de dólares americanos, em mais uma iniciativa destinada a aumentar as reservas cambiais do país e conter a pressão de valorização sobre o real.As medidas tomadas pelo Brasil para conter a valorização da moeda chamam a atenção para o dilema com que se defrontam muitas economias de crescimento acelerado - como Turquia, Chile, Colômbia e Rússia -, uma vez que permitir a valorização da moeda restringe o superaquecimento interno, ao mesmo tempo em que também solapa a competitividade da indústria doméstica."Fiz um pronunciamento aos investidores, e espero que eles não o tenham recebido com excesso de entusiasmo", brincou Mantega, "porque há a tendência de entrada de um volume excessivo de capital". O Brasil teve de tomar outras medidas, acrescentou ele, porque as taxas de juros domésticas já estão elevadas, a fim de coibir a inflação, e novos aumentos da taxa, por si sós, tendem a estimular novos afluxos de capital. O Brasil já instituiu uma série de medidas, como a taxação dos ingressos para investimentos em bônus, para testar e conter a valorização do real."A política monetária é muito restritiva no Brasil e o nível [das taxas de juros] em termos reais é mais elevado que o de outros países [emergentes]", insistiu Mantega. Com a taxa referencial de juros em 12,25%, ele recusou a ideia de que o Brasil passa por superaquecimento, dizendo que as taxas de crescimento são sustentáveis, que a inflação está recuando e que o déficit público está diminuindo. A economia brasileira deverá crescer 4% este ano, segundo previsões, depois de registrar uma expansão de 7,5% em 2010.O crescimento do crédito -de 15% este ano - foi menor que os 22% registrados em 2010, acrescentou ele, em parte em decorrência das restrições impostas pelo governo à tomada de empréstimos baratos por parte dos bancos, a baixas taxas de juros, junto aos Estados Unidos, mas ele disse ansiar pelo dia em que uma inflação mais baixa proporcionará "mais flexibilidade de política monetária".Os comentários de Mantega chamam a atenção para o baixo nível da guerra cambial travada entre economias emergentes e avançadas que desestabilizou os mercados financeiros mundiais. Essa será uma das questões a ser enfrentadas por Christine Lagarde, que estreou ontem como diretora-executiva do Fundo Monetário Internacional (FMI).O Brasil apoiou a nova diretora-executiva francesa em detrimento de seu concorrente mexicano, Agustín Carstens, mas Mantega insistiu em afirmar que não há "rivalidade regional" entre as duas maiores economias da América Latina. Ele disse ter sentido que Lagarde seria mais eficiente em impulsionar a causa dos países em desenvolvimento.

Tombini destaca risco externo no cenário de inflação

Tombini destaca risco externo no cenário de inflação
O presidente do Banco Central (BC), Alexandre Tombini, reforçou o cenário do BC traçado no último Relatório de Inflação, com mais riscos à frente, mas aproveitou a apresentação que fez ontem no Senado para ponderar os fatores externos. Segundo ele, o quadro hoje é mais incerto, mas o ritmo de crescimento das economias desenvolvidas está mais lento do que o esperado e isso pode levar, inclusive, à queda nos preços de commodities, o que seria benéfico para a inflação doméstica. "No plano internacional temos um cenário de grande incerteza. Tem havido revisões na economia global para baixo e isso pode, no futuro próximo, ser traduzido em preços de commodities que ajudem no processo de controle de inflação no país", disse Tombini, após participar de audiência pública trimestral na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, ontem em Brasília.Segundo ele, no entanto, o fluxo de recursos estrangeiros para o país ainda preocupa, pois o mundo desenvolvido vive uma "segunda volta" da crise internacional e a solução que os governos vêm adotando para enfrentar os problemas é "jogar muita liquidez no mercado", disse. Ainda assim, o Brasil está preparado e vem tomando as medidas necessárias para proteger a estabilidade financeira, completou, sem dizer se novas ações estão em estudo.Com relação ao combate à inflação, ele afirmou que os resultados iniciais das medidas adotadas já começam a ser sentidos. "As ações do Banco Central e as demais políticas do governo têm sido calibradas no sentido de a inflação no Brasil convergir para a meta em 2012. Esse é o processo que está em curso e os resultados já começam a aparecer." Ele citou os índices de inflação mensal, que apontam números próximos da meta em termos anualizados. Além disso, a economia real já tem mostrado maior moderação na margem.Ainda de acordo com o presidente do Banco Central, o efeito das políticas que estão sendo adotadas é percebido com defasagem sobre a economia e sobre a inflação. Por isso, as projeções do BC, que hoje apontam taxa acima do centro da meta, também devem recuar. "O impacto máximo das políticas já adotadas será sentido agora no terceiro e quarto trimestres deste ano. Portanto há uma grande chance de uma convergência maior nas projeções para 4,5% nos próximos meses."

A hora da verdade na zona do euro por Martin Wolf

A hora da verdade na zona do euro
Martin Wolf
A maior questão em qualquer crise de dívida é determinar se há possibilidade de se encontrar um caminho viável de volta à solvência. Para a Grécia, isso agora parece muito improvável. O mesmo vale, em menor grau, para a Irlanda e Portugal. Isso traz três outras questões. Primeira, qual o tamanho de qualquer reestruturação necessária? Segunda, quem deveria arcar com os custos? Por fim, a reestruturação é suficiente? Se a resposta para a última pergunta for "não", então, é preciso perguntar-se se a união monetária continuará em sua atual forma.Quanto à primeira das questões, uma análise do Citigroup traz respostas negativas. De acordo com o estudo, até 2014, a relação entre dívida bruta e Produto Interno Bruto (PIB) terá aumentado para 180% na Grécia, 145% na Irlanda e 135% em Portugal. Em nenhum desses casos, o quociente de endividamento começará a cair nesse horizonte. A Espanha parece um pouco melhor, com uma razão de endividamento de 90% do PIB em 2014, embora, também sem queda no período.As suposições por trás dessas previsões são: aperto fiscal acumulativo de 2011 a 2014 incluído, de 10,8% do PIB na Grécia, 8,3% em Portugal, 7,3% na Irlanda e 5,7% na Espanha; juros para os novos financiamentos subindo de quase 5% para 5,6% em 2014 na Grécia, Portugal e Irlanda (determinado pela média ponderada das taxas do Fundo Monetário Internacional e Fundo Europeu de Estabilização Financeira) e taxas maiores para a Espanha, já que o país dependerá do mercado; e, por fim, privatizações e pacotes de socorro financeiro. A análise também presume que um ponto porcentual de aperto fiscal reduz o crescimento em 0,5 ponto porcentual.Vamos presumir que esses países poderiam captar a preços acessíveis nos mercados privados se tivessem taxa de endividamento de 80% do PIB. Vamos presumir, também, que os governos europeus assegurem que o FMI não assuma perda. Então, a redução no valor do resto da dívida teria de ser de até 65% do PIB na Grécia, de 50% na Irlanda e 45% em Portugal. O corte total seria de ? 423 bilhões: ? 224 bilhões para a Grécia, ? 107 para a Irlanda e ?92 bilhões para Portugal.Alguém poderia fazer objeções a alguns números: os dados talvez sejam pessimistas demais. Sem uma grande reestruturação, no entanto, é bem provável que esses países não consigam financiar-se atualmente em condições acessíveis no mercado. É isso também que os mercados estão dizendo: a diferença em relação ao rendimento dos bônus de dez anos desses países em relação aos papéis alemães está em 1.340 pontos-base, ou 13,4 pontos percentuais, para a Grécia; 875 pontos-base para a Irlanda; e 818 pontos-base para Portugal. É por isso que todos estão agora em programas de resgate.Em algum momento, o valor presente do custo da dívida precisará ser drasticamente reduzido. Não precisa acontecer hoje, mas precisa ser cedo o suficiente para dar esperança às pessoas. Sem isso, o fracasso não é apenas provável. É quase uma certeza.De forma preocupante, os spreads da Espanha também estão incomodamente altos, em 240 pontos-base, enquanto os da Itália chegaram a 190 pontos-base. A região do euro, em resumo, depara-se com um desafio assustador quanto às dívidas soberanas, agravado pela dependência de seus bancos do apoio concedido pelos governos e pela dependência dos governos do financiamento concedido pelos seus bancos.Agora, vamos à segunda questão: quem deveria arcar com as perdas? Se todos os cortes fossem recair sobre os credores privados, suas perdas em 2014 seriam de 97% do que possuem das dívidas gregas, 63% das dívidas irlandesas e 60% das dívidas portuguesas. Os credores oficiais, até lá, teriam de arcar com parte substancial das perdas totais. Como os governos também teriam de resgatar alguns dos detentores de dívidas reestruturadas, particularmente os bancos, a região do euro se revelaria como uma "união de transferências". Notem, além disso, que isso ocorreria apesar do grande esforço fiscal nos países afetados. Mesmo isso, contudo, seria insuficiente para reverter a dinâmica desfavorável das dívidas no médio prazo, em parte, porque o crescimento do PIB provavelmente continuará fraco.Com esse cenário de pano de fundo, as propostas de rolagem pelos bancos, sejam ou não consideradas tecnicamente como inadimplência, pouco mudam. Muito mais efetivo seriam recompras de dívidas por valores próximos aos preços atuais do mercado, como discutido na semana passada no comunicado sobre a Grécia do Instituto Internacional de Finanças (IIF), que agrupa os maiores bancos internacionais. Isso cristalizaria as perdas. Então, que seja assim. Deixem que se admita a realidade. Como também argumentou o "Financial Times" nesta semana, os pontos favoráveis de se oferecer um menu de opções com garantias parciais, similar ao plano Brady de 1989 para a dívida latino-americana, são fortes.Não é uma questão de saber se os ajustes terão de ser feitos, mas quando. A história de tais crises sugere veementemente que isso deveria ser feito antes cedo do que tarde. Apenas depois que a dívida estiver em um caminho sustentável, a confiança deverá retornar. Permitir que instituições de crédito insensatas, reguladores incompetentes e autoridades negligentes se escondam atrás de erros passados é uma desculpa esfarrapada para os intermináveis atrasos.A dúvida, na verdade, não é se a redução do valor presente do serviço da dívida é necessária. As verdadeiras questões são outras. Uma é como administrar uma reestruturação cooperativa da dívida. Outra é sobre a competitividade e o retorno ao crescimento. Alguns citam o sucesso da Letônia em administrar o que se chamou de sua desvalorização interna. Seu PIB, no entanto, está 23% abaixo do que estava no pico antes da crise. Isso é uma depressão. Portanto, a reestruturação da dívida é meramente uma condição necessária para se encontrar uma saída. Como uma alternativa, os políticos poderiam tirar seus países da região do euro, independente dos custos de curto prazo. Ainda é muito cedo para presumir que esse será o resultado, embora alguns já o façam. Para que exista alguma chance de evitar tal resultado, entretanto, é preciso realismo. Em algum momento, o valor presente do custo da dívida precisará ser drasticamente reduzido. Não precisa acontecer hoje, mas precisa ser cedo o suficiente para dar esperança às pessoas. Sem isso, o fracasso não é apenas provável. É quase uma certeza. Martin Wolf é editor e principal comentarista econômico do FT