Pão de Açúcar se mexe e surpreende o mercado
Mais uma vez o empresário Abílio Diniz surpreende o mercado com a proposta feita pelo Pão de Açúcar de fusão de suas operações com as do Carrefour no Brasil. Apesar de todos os obstáculos que existem para que o negócio realmente ocorra, os analistas gostaram da notícia. As ações preferenciais (PN, sem voto) do Pão de Açúcar chegaram a subir mais de 14% durante o pregão e fecharam em alta de 12,65%, de longe a maior alta no Indice Bovespa, que também teve um dia positivo e subiu 1,77%.Na proposta, as operações do Pão de Açúcar e do Carrefour no Brasil migrariam para uma nova companhia batizada de Novo Pão de Açúcar (NPA), que teria as ações negociadas na bolsa. A empresa de participações do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico Social (a BNDESPar) injetaria ? 1,7 bilhão nessa NPA e o banco BTG Pactual outros ? 300 milhões.A aposta é que Casino acabará concordando com a ofertaA grande pedra no sapato dessa operação é o Casino, sócio do Pão de Açúcar, e que já se mostrou fortemente contra o negócio. O Grupo Casino disse que tem autoridade suficiente para se opor ao acordo e que qualquer tipo de negociação sobre o futuro do Grupo Pão de Açúcar precisa contar obrigatoriamente com a sua anuência. Ou seja, se Abílio Diniz e Casino não chegarem a bom termo, nada feito.Apesar de ressaltarem esse risco nada desprezível, os analistas se mostraram otimistas com a possibilidade do negócio entre Pão de Açúcar e Carrefour. Em relatório, os analistas da Fator Corretora Renato Prado e Ronaldo Kasinsky dizem que a oferta traz valor para todos os envolvidos, "especialmente ao criar o maior varejista brasileiro, com possibilidade de geração de sinergias operacionais decorrentes de melhor negociação com fornecedores, ganhos de escala e logísticos, além de uma melhor precificação em diversos segmentos de operação em função de um maior nível de informações". Eles acreditam que a oferta deve fazer com que as ações do Pão de Açúcar tenham, no curto prazo, um desempenho melhor do que o Ibovespa, sem contar que os papéis da varejista estão bastante descontados.Para um gestor de recursos, o pulo do gato nessa operação e que deve fazer o Casino dizer sim é que, por meio do Novo Pão de Açúcar, o grupo francês entrará no bloco de controle do seu concorrente Carrefour. "Conseguir entrar no concorrente, estando ainda por cima no grupo de controle, é o sonho de consumo de qualquer companhia", diz o gestor.A outra grande questão por trás dessa oferta é se faz algum sentido o BNDES, um banco em tese criado para fomentar o setor privado brasileiro, financiar uma empresa do porte do Pão de Açúcar? E para ela, no fim das contas, se tornar uma companhia francesa?Chovem críticas de analistas à estratégia do BNDES de, não é de hoje, financiar grandes conglomerados em operações que parecem agregar pouco ou nada ao mundo corporativo brasileiro. Com apoio do BNDES, Diniz afaga Carrefour Um grande negócio foi anunciado ontem em São Paulo: a combinação entre Pão de Açúcar e Carrefour no Brasil. A operação, contudo, ainda não passa de uma grande ideia, com R$ 5,75 bilhões disponíveis na mesa, oferecidos pela BNDESPar (68%) e pelo BTG Pactual (32%), ainda que o negócio não envolva dinheiro, apenas troca de ações. Por enquanto, trata-se apenas de uma proposta que precisa ser aprovada por todos os envolvidos - Carrefour e seus acionistas e Pão de Açúcar e seus controladores, família Diniz e grupo Casino. A proposta tem validade de 60 dias.Como o negócio foi desenhado por Abilio Diniz e um grupo de acionistas do Carrefour liderado pela Blue Capital, a sua concretização está nas mãos do Casino, que vem publicamente mostrando seu descontentamento pelas negociações há cerca de um mês - tendo, inclusive, iniciado um processo de arbitragem contra Diniz.A operação pretendida colocaria as rivais francesas Carrefour e Casino como acionistas do grupo Pão de Açúcar, junto dos Diniz. Além disso, os atuais acionistas da varejista brasileira se tornariam o maior sócio individual do Carrefour na França, com no mínimo 11,7% e no máximo 18% do capital.O poder de sim ou não está todo com o Casino. O rede que controla o Pão de Açúcar com a família Diniz recebeu a proposta na madrugada de ontem, quase junto com a divulgação ao público, o que mais uma vez deixou-a indignada. Agora, recai sobre o grupo francês a pressão de aceitar ou recusar uma operação capaz de gerar sinergias estimadas de R$ 1,3 bilhão a R$ 1,8 bilhão e que tem R$ 3,9 bilhões de aval do banco de fomento estatal, o BNDES, em tempos de capital escasso no Hemisfério Norte.No negócio proposto, a BNDESPar se tornaria acionista do que seria o Novo Pão de Açúcar (NPA), com 18%. O BTG colocaria outros R$ 690 milhões e receberia 3,2% das ações. Além do aporte, o banco de investimentos ainda emprestaria R$ 1,15 bilhão à empresa. O argumento para o dinheiro novo é "preparar a empresa para novos desafios". E o apelo político é a criação de um grupo de varejo com atuação nacional e internacional. Ainda que, ao final, os franceses - Carrefour e Casino - devam ficar com 65% do capital da empresa operacional.Há grande expectativa de que o Casino diga não à proposta. Resta saber se as características da operação serão suficientes para seduzir o sócio francês ou se alguns termos poderão ser revisados. Casino deve resistir ao projeto de fusão com o rival francês A guerra foi declarada e deverá ser longa e envolver artilharia pesada. O grupo francês Casino, sócio do Pão de Açúcar, promete defender com todas as forças seus interesses no Brasil e também resistir ao projeto "manifestamente hostil" de fusão entre a varejista brasileira e seu rival Carrefour, anunciado ontem oficialmente, após mais de um mês de rumores.O Casino não demorou para lembrar seu "direito de se opor à proposta" de fusão. Por enquanto, o grupo francês "estuda" as medidas que pretende tomar, sobre as quais prefere não dar detalhes. O descontentamento do presidente do Casino, Jean-Charles Naouri, é tão grande que ele nem quis receber o sócio brasileiro em Paris.O empresário Abilio Diniz passou os últimos dois dias na capital francesa tentando marcar um encontro com Naouri. Mas a "agenda" do presidente do Casino, segundo uma fonte ligada à empresa, não previa nada com o sócio. Restou a Diniz voltar ontem ao Brasil, sem explicar as razões da aproximação com o Carrefour. "Jean-Charles Naouri se nega a dialogar e prefere me atacar pela imprensa. Não entendo o propósito disso", afirmou Diniz em uma carta enviada ontem à Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Diniz deverá voltar a Paris na sexta-feira ou na próxima semana e tentará novamente se reunir com o sócio francês.Na sede do Casino, o anúncio da proposta de fusão com a rede brasileira soou como uma bomba. Diniz ainda divulgou, praticamente no mesmo instante que o Carrefour, comunicado em francês no qual afirma "sempre estar à busca de novas oportunidades de crescimento para o Pão de Açúcar" e que as conversas iniciadas com os principais acionistas do Carrefour (admitidas pela primeira vez oficialmente) acabaram evoluindo para uma "ideia de associação global".Mas para o Casino, as negociações são "ilegais", já que realizadas sem o conhecimento do grupo, diz a fonte. "Uma operação desse tipo é preparada em conjunto, com discussões, não de uma maneira violenta", afirma. Por isso, o contra-ataque veio rápido e em tom agressivo. Logo nas primeiras linhas do comunicado, o Casino marca seu território relembrando sua participação na varejista. O grupo francês afirma "ter descoberto o projeto de operação financeira que implica a Companhia Brasileira de Distribuição (grupo Pão de Açúcar), empresa na qual o Casino é o principal acionista, compartilha o controle com Abilio Diniz e adquiriu, em 2005, junto à família Diniz, o direito de ser o único acionista controlador em 2012".Essa é a parte mais amena do texto, que menciona, ainda, "negociações secretas e ilícitas" e "um projeto preparado de longa data e ilegalmente por Carrefour e Abilio Diniz". O Casino diz também que "nenhuma negociação sobre o futuro da CBD pode ocorrer sem a participação do Casino" e que, apesar disso, as negociações continuaram, "ignorando tanto o direito quanto a ética elementar dos negócios".O Pão de Açúcar, por sua vez, contesta o fato de que simples prospecções de negócios precisariam ser levadas ao conhecimento do Casino. Nas operações com a Casas Bahia ou o Ponto Frio, a proposta foi apresentada ao grupo francês quando já estava madura, como é o caso agora, afirma uma fonte ligada à varejista brasileira.Mas essas transações no Brasil não envolviam o rival do Casino na França. "Essa operação é um movimento desesperado do Carrefour para se reequilibrar", diz uma fonte ligada ao caso, fazendo alusão aos problemas da rede varejista em seu principal mercado, a França.O Casino prevê que o caso "deverá durar longos meses" e poderá ser bloqueado por inúmeros procedimentos, a começar pelos acionistas das empresas, "que podem não aceitar o projeto", ou pelas autoridades de defesa da concorrência no Brasil.Naouri é o principal acionista e controlador do Casino. Em abril, ele adquiriu, por meio de operações com holdings intermediárias, participação de 50,19% do capital do Casino e 61,57% das ações com direito a voto, diz a AMF, a CVM francesa.No início dos anos 90, Naouri assumiu o controle do grupo Rallye (principal acionista da rede Go Sport). O restante está dividido entre a família dos fundadores da empresa, a Galeries Lafayette, o grupo CNP, entre outros, que têm participações menores que 2%, e investidores. A ação do grupo caiu 5,61% ontem. O Casino, que há um mês abriu processo de arbitragem contra Diniz, alegando quebra de contrato por conta da aproximação deste do Carrefour, obteve apenas na sexta-feira a confirmação das negociações, após a apreensão de documentos na sede do Carrefour pelo Tribunal de Comércio de Nanterre. Ontem, deparou-se com o anúncio da proposta de fusão. Abilio Diniz igualaria poder ao Casino na nova empresa Abílio Diniz, que atuou no desenho da proposta para combinação de Pão de Açúcar e Carrefour, pode conseguir uma reviravolta em seu futuro no varejo brasileiro caso obtenha aprovação do sócio Casino para a transação. No lugar de sócio minoritário do Pão de Açúcar, pois está previsão em acordo de acionistas que o Casino assumirá o controle do negócio a partir de 2012, Diniz pode igualar seus poderes ao grupo francês numa companhia maior, sem nenhum desembolso.A previsão é que o controle das empresas combinadas seja dividido igualmente entre Carrefour França e os atuais acionistas do Pão de Açúcar, que serão agrupados numa nova empresa - chamada Novo Pão de Açúcar (NPA). Esse veículo ainda se tornaria a maior acionista do Carrefour França, com direito a três cadeiras no conselho de administração. A fatia final na companhia internacional deve variar entre 11,7% e 18%. Haverá ainda um acordo de acionistas entre NPA e os atuais maiores sócios do Carrefour França, liderados por Blue Capital. Em dois anos, essa participação poderia dobrar.A proposta foi desenhada pela Estáter, assessora de longa data do Pão de Açúcar, e pelo BTG Pactual, que entrou na negociação há um mês. A estrutura final é complexa e possui diversas etapas. Diniz, Casino e todos os atuais acionistas de Pão de Açúcar migrarão para a holding chamada NPA. Nessa nova empresa, que só teria ações ordinárias e o controle disperso na bolsa, Abilio Diniz e família teriam direta e indiretamente 16,9% e Casino, 29,8%. A fatia de Wilkes, participação indireta de ambos, sairia de 25,2% para 20,5%.O estatuto dessa nova companhia, porém, limita o poder de votar de um acionista a 15% do capital, independentemente da participação econômica detida. Esse dispositivo abre espaço para que Diniz e Casino tenham o mesmo poder político - ainda que o grupo francês tenha quase o dobro em dinheiro investido. Para preservar a estrutura dispersa do capital, NPA ainda terá em estatuto a previsão de que quem superar 39% de participação deve lançar oferta pública para todos os acionistas.O primeiro passo, porém, seria transformar o Pão de Açúcar numa companhia apenas com ações ordinárias, embora não listada no Novo Mercado. As preferenciais seriam convertidas em ordinárias na proporção de uma para 0,95.O segundo movimento é a incorporação da empresa aberta por NPA, que seria sucessora como empresa listada na BM&FBovespa. Nessa companhia, os atuais acionistas seriam diluídos pela entrada da BNDESPar e do Pactual, com aporte total de R$ 4,6 bilhões, que ficariam com 18% e 3,2% do capital, respectivamente.Abilio Diniz e família teriam a participação reduzida de 21,4% para 16,9% e Casino sairia de 36,9% para 29,8%. Os minoritários, que hoje detêm 41,6% do Pão de Açúcar, ficariam com 32,1% de NPA. Em seguida, Pão de Açúcar deveria incorporar Carrefour Brasil, numa transação que daria 31% do negócio ao Carrefour na França.Nesse momento NPA teria os outros 69% do negócio. Para igualar a participação em 50% para cada lado, os 19% excedentes do NPA seriam trocados por uma participação de 11,7% no capital do Carrefour França em ações preferenciais, incluindo voto mais direitos para participação na gestão. Há a expectativa - mas não a obrigação - de que NPA compre mais ações do Carrefour França no mercado, ampliando sua participação para algo entre 16% e 18%. Como NPA terá 50% do Pão de Açúcar, a participação efetiva de cada sócio na empresa operacional será equivalente à metade do que possuem nessa holding. O motivo de o Casino não gostar da proposta num primeiro olhar - embora a decisão final ainda não esteja tomada - é justamente o fato dela significar o fim de seu direito de ser o dono do Pão de Açúcar a partir de 2012. "Não abriremos mão de nosso direito de controle", disse um interlocutor do grupo francês. Apesar disso, os acionistas que desenharam o negócio acreditam que a pressão política - pela sinalização de apoio do BNDES - e a chance de o Casino tornar-se indiretamente (via NPA) o segundo maior acionista de Carrefour França levarão o Casino a conceder seu aval para a transação. Acordo pode representar revitalização para o Carrefour Com inúmeros problemas na França, maior mercado do Carrefour, a proposta de fusão entre o grupo francês e o Pão de Açúcar pode representar uma grande oportunidade de revitalização para o vice-líder mundial do varejo. O Carrefour reiterou na semana passada que "um dos pilares de sua estratégia" é reforçar suas atividades em mercados emergentes com forte potencial de crescimento.Analistas avaliam que a operação de fusão seria benéfico para o Carrefour, que ampliaria seu tamanho em um mercado-chave e se beneficiaria da experiência - e da liderança - do Pão de Açúcar. As ações do grupo, que caíram 25% de novembro até a semana passada, fecharam ontem em alta, de 3,74%.Nem mesmo o anúncio da agência de classificação de riscos Fitch - que reduziu ontem a nota do grupo de A- para BBB+, indicando uma tendência negativa - estragou a festa dos acionistas. O rebaixamento ocorreu em razão das previsões, do próprio Carrefour, de queda de 35% no resultado operacional neste semestre na França, do desmembramento da rede de descontos Dia, aprovada semana passada, e, ainda, de preocupações sobre o ritmo de recuperação das atividades em sua terra natal.O ritmo é considerado "lento" pelos os próprios acionistas. Na assembleia realizada semana passada, eles bombardearam de críticas a direção da empresa.As vendas do grupo vêm perdendo velocidade na França. Para tentar frear a queda nas vendas, a companhia lançou um vasto programa de modernização de seus hipermercados, batizados de "Planet" - que representam a maior parte de seu faturamento -, que custará € 1,5 bilhãoO fraco desempenho dos hipermercados ocorre em razão da mudança de comportamento do consumidor em países desenvolvidos, que vêm preferindo as lojas de bairro. O Carrefour aposta nesse segmento, com a abertura de supermercados nesse modelo. Segundo as previsões pouco otimistas para o semestre, porém, a recuperação do grupo ainda não é palpável, apesar de o Carrefour ressaltar que alguns novos hipermercados têm obtido bons resultados e que a expansão das lojas de bairro vai continuar.Por isso, a pressão do principal acionista do Carrefour, a Blue Capital, holding formada pelo grupo do empresário Bernard Arnault (da LVMH, líder mundial do setor de luxo) e pelo fundo americano Colony Capital. Juntos, eles detêm 14,1% do capital e 20,2% das ações com direito a voto do grupo. Eles teriam perdido, segundo analistas, mais de € 2 bilhões com a desvalorização do CarrefourO mercado estima que Arnault e o Blue Capital estão por trás da iniciativa do Carrefour de cisão da rede de descontos Dia, cujas ações devem ser lançadas na bolsa de Madri em 5 de julho. A operação poderia permitir a alta das ações Carrefour, já que o rendimento do grupo é maior do que o da rede de descontos. O diretor-geral e novo presidente do Carrefour, o sueco Lars Olofsson, havia declarado que o objetivo da operação com a rede Dia "é tornar o grupo mais focado em suas atividades operacionais e criar valor para os acionistas".Por enquanto, o projeto de cisão de 25% da Carrefour Property, de bens imobiliários, foi suspenso. Em 2010, o Carrefour havia vendido suas atividades na Tailândia justamente ao Casino, por € 868 milhõesPara o grupo Casino, a proposta de fusão entre o Carrefour e o Pão de Açúcar "é um movimento desesperado" do rival para reequilibrar suas atividades e também "a confissão do fracasso em recuperar as contas da filial brasileira". Em 2010, o Carrefour anunciou um rombo de € 550 milhões nas contas no Brasil, relativas a encargos, o que levou o grupo a realizar alertas de lucrosOntem, em Paris, na sede do Carrefour, a conta foi outra: o faturamento atual no Brasil, de €12,4 bilhões, incluindo a rede Dia, passaria para € 30 bilhões se o projeto de fusão for aprovado. Olofsson disse na semana passada que o Carrefour manteria o controle de suas operações no Brasil. Agora, o eventual controle em conjunto não representa um problema. Galeazzi costurou entrada do BTG no negócio No início da tarde de ontem, o engenheiro Pércio de Souza, sócio da butique de investimentos Estáter, explicava aos jornalistas a intrincada operação de associação entre Pão de Açúcar e Carrefour, estruturada por ele. Depois de uma rápida saída da sala para um café, Souza voltou confiante: "As ações do Pão de Açúcar estão subindo 11%", disse o engenheiro. "Sinal que o mercado está recebendo bem a notícia." Ao mencionar o "mercado", Souza se referia aos investidores. O papel fechou o dia com alta de 12,64%. Mas a operação que torna o Pão de Açúcar sócio do Carrefour mundial, com a manutenção de Abilio Diniz à frente do negócio, provavelmente na presidência do conselho de administração do Novo Pão de Açúcar (NPA), segundo apurou o Valor , não interessa aos demais players do setor varejista - rivais e fornecedores. A nova companhia concentrará quase um terço do varejo no Brasil. Em um setor que movimentou R$ 201,6 bilhões em 2010, o Pão de Açúcar respondeu por 17,9% das vendas (considerando Casas Bahia e Ponto Frio), enquanto a fatia do Carrefour ficou em 14,4%. O terceiro colocado no ranking, o Walmart, tem 11%.Na justificativa da possível concentração, o sócio do BTG Claudio Galeazzi - um dos responsáveis pela área de "merchant banking" do banco, onde estão as operações de varejo - disse que, nos Estados Unidos, o Walmart é dono de 32% das vendas. Na França, o Carrefour teria 26%. Daí ser natural, diz, que o Brasil tenha uma operação forte nacional, com participação inclusive no exterior. "A concentração é muito menor do que pensávamos no começo", afirmou. Em relação a sinergias entre as duas empresas, que ficarão reunidas no NPA, Galeazzi estima € 560 milhões, ou algo em torno de R$ 1,3 bilhão a R$ 1,8 bilhão. "Também teremos a chance de implantar as melhores práticas de gestão nas bandeiras do Carrefour Brasil, a fim de aumentar a eficiência da empresa." No ano passado, a filial brasileira da rede francesa foi responsável por um rombo contábil de € 550 milhões nas contas da matriz, devido a créditos de fornecedores contabilizados de maneira indevida. Segundo Galeazzi, essa conta ficou com o Carrefour na FrançaSegundo apurou o Valor, Galeazzi, famoso pelas reestruturações de empresas como Lojas Americanas e o próprio Pão de Açúcar, do qual participou do conselho de administração até ir para o BTG, na metade de 2010, foi o responsável pela entrada do banco no negócio. No início deste mês, Galeazzi teria mandado um e-mail para Abilio Diniz e para Pércio de Souza demonstrando o interesse do banco em participar da operação.Foi prontamente atendido por Souza, que colocou o BTG na estrutura do negócio, com uma participação de 3,2%, o equivalente a € 300 milhões. Além disso, o banco se comprometeu a captar € 500 milhões para o NPA. Mas a missão não foi tão simples. Galeazzi teve que vencer a resistência do banqueiro André Esteves, controlador do BTG, para participar do negócio. "Há um certo conflito de vaidades", diz um interlocutor que acompanhou a operação, referindo-se a Esteves e DinizSe a proposta da associação entre Carrefour e Pão de Açúcar for aprovada, Galeazzi, que completou 71 anos na segunda-feira, terá capitaneado o seu primeiro grande negócio à frente do BTG. A operação ainda terá que enfrentar as possíveis restrições impostas pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e uma forte pressão dos grandes fornecedores. Galeazzi afirmou que, no NPA, as compras ficarão a cargo do Brasil - mesmo considerando que o Carrefour costuma costurar acordos mundiais com fornecedores multinacionais, a exemplo da Nestlé. "O Brasil manteria certa independência", afirmou.Em relação às lojas, Galeazzi afirmou que deve haver sobreposição especialmente no Rio e em São Paulo. "Nada impede que possamos transferir bandeiras, mudar formatos de loja ou, eventualmente, fechar algum ponto." Enquanto BTG, Estáter e Diniz pensam no futuro de uma companhia única, o Casino, sócio de Diniz na Wilkes, atual controladora do Pão de Açúcar, já pediu a Diniz uma reunião de acionistas. Diniz tem sete dias para responder. Na nova estrutura, além de ter sua participação diluída, o Casino perderia a oportunidade de assumir o controle do Pão de Açúcar, que já era, sozinho, líder nacional do varejo. O Brasil é a mais importante operação do Casino no mundo. Na França, sede da companhia, a empresa tem apenas 12% do mercado, contra 60% do Carrefour. As conversas entre Diniz e o Carrefour vieram a público no fim de maio. Quando soube, Jean-Charles Henri Naouri, o presidente do Casino, pediu explicações a Diniz. O brasileiro teria confirmado a aproximação, mas não deu detalhes. Em 31 de maio, o Casino recorreu à Câmara Internacional de Comércio, em São Paulo, pedindo arbitragem contra Diniz para manter os acordos fechados entre as partes em novembro de 2006 na Wilkes. Cade pode congelar negócio para análise Assim que for anunciada, a fusão entre o Pão de Açúcar e o Carrefour deve ser congelada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) no Brasil.Em seguida, o negócio terá de seguir uma análise minuciosa pela qual a Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae) do Ministério da Fazenda vai verificar todas as cidades do país onde estão os supermercados das duas redes e recomendar a venda de unidades nas quais a presença de lojas de concorrentes é fraca. Essas unidades seriam vendidas para redes que competem com Pão de Açúcar e Carrefour. No caso de grandes cidades, como São Paulo e as capitais do país com mais de um milhão de habitantes, a análise deverá ser feita bairro a bairro.O caso também vai ser encaminhado à Secretaria de Direito Econômico (SDE) do Ministério da Justiça que pode fazer novas recomendações para atenuar o domínio do Pão de Açúcar e do Carrefour na concorrência."Não é algo trivial", afirmou um integrante de um órgão antitruste do governo. Segundo ele, o governo entende que seria prudente que uma operação desse tamanho fosse apresentada previamente ao Cade. Ele explicou que o órgão antitruste pode até analisar eventuais argumentos da empresa de que os efeitos do negócio podem ser maiores na França, mas o foco do julgamento será o impacto nos consumidores brasileiros.Nessa análise, o Cade deve primeiro suspender o negócio para manter as estruturas das redes de supermercados separadas e, depois, discutir a adoção de uma decisão com restrições para evitar prejuízos a concorrentes.Essa prática foi seguida no caso da união entre Pão de Açúcar, Casas Bahia e Ponto Frio. Em fevereiro de 2010, o Cade chamou representantes das empresas para assinar um acordo em que não poderiam fechar lojas e manteriam as marcas separadas e em funcionamento até o julgamento final do negócio.Após o acordo, a Seae indicou um primeiro pacote de restrições ao negócio, que seriam: a venda de ativos em 12 cidades com lojas, instalações, carteiras de clientes e cadastros da Casas Bahia ou do Ponto Frio. Agora, o caso retornou ao Cade, onde o pacote de restrições está em debate.Durante conferência internacional do Instituto Brasileiro de Estudos de Concorrência, Consumo e Comércio Internacional (Ibrac) sobre megafusões, há duas semanas, o secretário de Acompanhamento Econômico, Antonio Henrique Silveira, pediu a advogados de empresas que discutam soluções reais para manter a competição no mercado. Essas soluções podem ser a venda de marcas, fábricas e sistemas de distribuição de produtos. "Parem de dizer que uma fusão com concentração de, por exemplo, 80% é amigável", afirmou Silveira, sem se referir a nenhum processo específico. "As pessoas têm que reconhecer que alguns processos causam prejuízos à competição e temos que ter um diálogo para achar alternativas."No mesmo debate, o presidente do Cade, Fernando Furlan, cobrou das empresas que discutam os efeitos de seus negócios no Brasil, e não apenas os benefícios no exterior. Para ele, não é o Cade que está mais rigoroso com as empresas, mas sim o movimento da economia que leva a casos complexos de megafusões. Indústria vê menor poder de barganha O temor da indústria de alimentos e bebidas - e também de varejistas concorrentes - em relação à possível fusão entre Carrefour e grupo Pão de Açúcar se resume a uma palavra: concentração. "Quanto mais concentração, pior é para os fabricantes", disse o presidente de uma indústria de bebidas, que prefere não ser identificado. "Se nosso poder de barganha diminui, o varejista acaba impondo seus preços", acrescentou. "Com certeza, essa fusão nos prejudica", disse um representante da indústria de carnes. "Havia três varejistas, agora, com esse negócio, serão só dois", lamentou outra executivo do setor. Segundo ele, a maior parte do volume de vendas das indústrias de carne se dirige ao grande varejo, ou seja: Walmart, Carrefour e grupo Pão de Açúcar. No Brasil, segundo a Associação Brasileira de Supermercados (Abras), existem hoje 7.565 supermercados que no ano passado somaram um faturamento de R$ 201,6 bilhões. O grupo Pão de Açúcar (sem incluir lojas de eletrodomésticos, como Casas Bahia e Ponto Frio) entra nessa conta com 615 lojas e vendas de R$ 36,1 bilhões em 2010. O Carrefour tem 236 lojas (sem incluir a rede Dia, que está sendo separada do grupo) e faturamento de R$ 29 bilhões. Nacionalmente, caso a fusão se concretize, as empresas teriam 851 lojas - 11,2% do total - e vendas de R$ 65,1 - o equivalente a 32,2% do faturamento do setor."Olhando para o mercado nacional, a possível fusão não resultaria em aumento da concentração", disse João Galassi, presidente da Associação Paulista de Supermercados (Apas). "Mas se considerarmos só São Paulo, o cenário seria diferente", acrescentou. Em São Paulo - Estado que concentra 36% do faturamento do varejo de bens não duráveis do país - existem 2.473 supermercados. Desse total, 426 são do grupo Pão de Açúcar (17,2%) e 109, do Carrefour (4,4%). Juntas, as duas empresas teriam 588 lojas ou 23,7% do total paulista. Nenhuma das duas companhias divulga quanto faturam só no Estado, mas a Apas calcula que as duas companhias teriam juntas 30% dessa receita. "Com certeza, a indústria vai fazer uma pressão velada ao Cade para que essa fusão não saia", disse um fabricante de alimentos, se referindo ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica. "Nenhum representante irá se posicionar publicamente contra, ou fará essa pressão explicitamente porque a não é do feitio da indústria tomar partido. Mas com certeza o setor vai procurar se defender", afirmou o empresário. Entre os varejistas concorrentes, há interpretações diferentes. "Todo movimento de fusão ou de compra nesses últimos 12 anos se concentrou entre as maiores empresas do setor, que detém cerca de 40% das vendas", afirmou Galassi, que também é dono de uma rede de quatro supermercados em Campinas (SP). "Mesmo com tudo que aconteceu nesse período, os pequenos continuaram crescendo e conquistaram seu espaço", disse ele. Outro varejista, que preferiu não se identificar, prevê que a tradicional "pesquisa de preços" possa estar com os dias contados. "No Brasil, a concentração é ainda pequena, o que faz com que cada loja tenha seu preço. No México, por outro lado, o varejo é muito concentrado e os preços não variam."
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