A ciência e o Código Florestal Por Reinhold Stephanes
Reclamo, há tempos, que falta ciência e racionalidade ao debate sobre o Código Florestal. Porém, não me iludo que os argumentos racionais sempre prevaleçam na defesa de um ideal. O meio ambiente é uma causa capaz de mobilizar seguidores que, de tão bem-intencionados, repudiam qualquer mudança, mesmo em áreas em que nem sequer conhecem a realidade. E quem tenta apontar alternativas é visto como inimigo da natureza, o que deixa em segundo plano os reais motivos para revisar a legislação.
Esse lapso ficou claro no seminário da Frente Parlamentar Ambientalista, da qual participo, com membros da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência) e da Esalq-USP (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz). Sob a aprovação do público, técnicos defenderam três teses, com as quais há consenso: o Código Florestal de 1934 e o de 1965 foram feitos com base na ciência; a agricultura deve crescer por produtividade e sem avançar em novas áreas; e, antes de desmatar, áreas degradadas devem ser recuperadas.
Portanto, o seminário nenhuma novidade trouxe ao debate, embora a discussão seja oportuna já que votaremos o projeto que altera o atual Código. E isso vai ocorrer para simplificar legislação com mais de 16 mil itens e longe de ser aquela definida pelos especialistas em 1965.
Na verdade, 80% das normas tiveram mudanças profundas de conceito, principalmente por meio de medida provisória que, em 2001, deixou de fora do processo produtores, Ministério da Agricultura e cientistas. Desde os códigos de 1934 e 1965, houve novidades expressivas na ciência agrícola, como a descoberta da fixação biológica de nitrogênio e o plantio direto na palha.
O primeiro permitiu alimentos mais baratos e saudáveis e valeu a indicação ao Prêmio Nobel de Química, em 1997, da pesquisadora da Embrapa Johanna Döbereiner, que aperfeiçoou o processo. O segundo chegou ao Brasil nos anos 1970, sendo eficiente no controle da erosão, reduzindo custos e aumentando a produtividade.
Ambos se aliam a outras técnicas modernas difundidas pela Embrapa, por 17 unidades estaduais de pesquisa e por instituições afins.
A prova incontestável do avanço da ciência agrícola está nos números, conhecidos por líderes e dirigentes do setor: a produção vem crescendo 3% ao ano, por aumento de produtividade e sem expansão da área de plantio.
Além disso, nos últimos dez anos, somos o país que mais cresce em eficiência. Também a recuperação de áreas degradadas já é realidade no campo e na Embrapa, sendo orientação de governo, com financiamento aos produtores. A questão concreta que o seminário ignorou é o que acontecerá, em três meses, quando se tornar inviável um milhão de pequenas e médias propriedades, em áreas consolidadas há décadas, por cumprir uma legislação elaborada sem critérios técnicos?
Quando for proibido o plantio em encostas e morros, o que será feito com as plantações de maçã em São Joaquim na serra catarinense; com cafezais em Minas Gerais e no Espírito Santo; e com os vinhedos e arrozais do Rio Grande do Sul? Como retirar dos agricultores o direito de produzir e até de viver nessas regiões? E como isso vai afetar o bolso dos trabalhadores? Essas são questões práticas que se colocam.
O debate sobre o Código tem que caminhar na direção de encontrar amparo legal para mantermos, de forma sustentável, a produção de alimentos que abastece o país e mais de 180 mercados fora daqui. Não podemos deixar que prevaleçam posições ideológicas e doutrinárias, afetadas pelo preconceito contra o campo daqueles que nem sequer conhecem o meio ambiente que defendem. Estou certo de que há ciência disponível para equilibrar o desejo de ambos os lados.
Economista e deputado federal pelo PMDB/PR. Foi ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.
Nenhum comentário:
Postar um comentário