Crise se aproxima da Itália e UE flerta com o desastre
As sucessivas tentativas de resolver a crise grega, envoltas em má vontade, divergências, paliativos e planos mal concebidos, acabaram por colocar a terceira maior economia da zona do euro à beira de um desastre. Com isso, a crise deixa a periferia da união monetária e caminha para seu centro - uma enorme mudança de qualidade, para pior, do cenário econômico e institucional na zona do euro. Hesitação e complacência contribuíram para que se criasse, com a deterioração acentuada das expectativas do mercado, a maior ameaça à existência da moeda comum desde sua criação, em 2000.Itália e Espanha são grandes demais para ruírem e também para serem socorridas. A dívida italiana em poder do mercado é de US$ 2 trilhões, com cerca de US$ 500 bilhões nas mãos de não residentes. Os bancos europeus têm exposição de US$ 327 bilhões em títulos soberanos do país e mais US$ 256 bilhões em congêneres espanhóis. Os débitos italianos corresponderão a 120% do PIB do país este ano, com um avanço desprezível sobre a situação do ano passado. Ainda assim, a situação italiana é mais sólida do que a de seus companheiros de infortúnio. O déficit público declinou de 5,3% do PIB em 2009 para 4,52% em 2010, com os menores gastos reais primários desde os anos 90. O indicador deve chegar a 3% em 2012 e perto do zero em 2014, se um pacote de austeridade de US$ 55 bilhões for aprovado em tempo recorde pelo Parlamento na sexta-feira. A bagunça crônica da política italiana contribuiu para elevar em alguns graus a fervura dos mercados. O partido do premiê Silvio Berlusconi vem colecionando derrotas nas urnas e Berlusconi anda às turras com o ministro das Finanças, Giulio Tremonti, entre outras coisas porque o pacote de austeridade deprime ainda mais as chances de vitórias eleitorais do governo. Berlusconi se convenceu de que não há outro caminho agora e pediu sacrifícios à população, que ela terá mesmo de fazer. O pacote é regressivo, com a maior parte da conta recaindo sobre as camadas de renda mais baixas. A esperança dos analistas é a de que a histórica blindagem do Tesouro em relação às estripulias dos políticos prevaleça, embora ela venha sendo erodida há tempos. Na largada do euro, a Itália pré-Berlusconi tinha um superávit primário de 5,5% do PIB. A aprovação do pacote, diante da ameaça de um desastre econômico, é vital e deve ocorrer.Mas a parte mais importante da história se desenrola fora da Itália. A cada pacote mal costurado lançado pelas autoridades da zona do euro para aliviar a situação da Grécia, mais as coisas pioram. Está claro que apenas despejar dinheiro não resolverá o problema da crise dos países da periferia do euro e a reunião de ministros das Finanças da zona na sexta-feira pode começar, com muito atraso, a alinhavar soluções mais duradouras. Aparentemente, os governos da união monetária resolveram ceder diante da pressão alemã para que os credores arquem com uma parte da conta da dívida grega, renovando prazos dos débitos voluntariamente e aceitando algum desconto. Por outro lado, os alemães cederam e aceitaram que o fundo de estabilização de € 440 bilhões (US$ 622 bilhões) possa ser utilizado na compra de títulos soberanos dos países sob intensa desconfiança dos mercados. Um semicalote em uma dívida que não poderá de qualquer forma ser paga nos termos atuais, mais a compra das dívidas pelo fundo de estabilização fariam com que os Estados da união monetária assumissem conjuntamente a dívida soberana dos países em dificuldades, apropriando-se também do deságio de mercado e abatendo o peso dos débitos dos governos socorridos. As agências de classificação de riscos, que falharam pavorosamente antes da crise financeira de 2008, rebaixarão à vontade os títulos da Grécia, mas o fato é que, se os ministros reunidos em Bruxelas quiserem, as dívidas estarão garantidas pela União Europeia e o risco da insolvência será afastado. Esse é um arranjo que poderia ter sido acordado desde o início, quando já era clara a magnitude do problema das dívidas soberanas, e é capaz de reverter a crise por algum tempoCom a socialização das dívidas pelos governos, resta ao bloco caminhar para uma política fiscal comum, que permita aos governos perdulários em apuros pagar em melhores condições suas contas. A alternativa a isso será o caos e uma implosão na união monetária.
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