Ciclo de aperto deve ser prolongado
Na quarta reunião deste ano, nos dias 7 e 8, o Comitê de Política Monetária
(Copom) deve aumentar a taxa Selic em 0,25 ponto percentual e indicar o quão
"prolongado" será o ciclo de aperto monetário. A aposta majoritária do mercado
é de mais dois aumentos de 0,25, o que elevaria a meta da taxa básica para
12,5% ao ano. Mas não se descarta uma trajetória mais dura de aperto, com três
novos aumentos, levando a Selic a 12,75% ao ano.
A expressão "prolongado", por ora, não deve sair do vocabulário do Copom, que
está disposto a fazer o que for preciso para levar a inflação ao centro da meta
em 2012.
Os sinais vindos da autoridade monetária são de que o Copom não se deixará
influenciar pelos dados correntes, seja a redução da inflação em maio e as
expectativas de um índice bem baixo em junho e julho, seja a queda de 2,1% da
produção industrial em abril sobre março.
O Banco Central sabe que tem um duro trabalho pela frente para dobrar as
expectativas dos agentes econômicos em relação à inflação de 2012. O último
boletim Focus estima o IPCA do próximo ano em 5,1%. Cabe à política monetária,
com seu principal instrumento, a taxa de juros, levar as expectativas para algo
próximo do centro da meta, de 4,5%. Mesmo que, por ventura, o Copom venha a
aceitar, no futuro, uma taxa ligeiramente acima da meta para o ano que vem, não
é agora que ele vai jogar a toalha.
Mercado de trabalho ainda está aquecido
Para a inflação convergir para a meta no ano que vem é necessário que o
crescimento da economia, nos próximos 12 meses ou mais, fique aquém do Produto
Interno Bruto (PIB) potencial. Apesar de não haver medida segura para o produto
potencial, há consenso de que ele gira em torno de 4,5%.
Os dados do IBGE sobre o primeiro trimestre saem hoje e, tal como o IBC-BR do
Banco Central, índice que mede a atividade econômica e estimou aumento de 1,28%
do produto para o trimestre, deverá mostrar um crescimento ainda forte no
início do ano.
Há indícios seguros, no entanto, de que está em curso uma desaceleração da
economia no segundo trimestre - com o PIB crescendo mais perto do seu potencial
-, mas o não suficiente para levar a inflação para o centro da meta em 2012.
O objetivo da política monetária é esfriar o consumo e o desaquecimento ainda
se mostra distante de afetar o mercado de trabalho. A demanda por bens e
serviços depende da renda e da garantia do emprego, que não se abalaram depois
de três aumentos da taxa Selic este ano.
Cálculos de economistas privados mostram que um aumento da oferta de emprego da
ordem de 90 mil a 100 mil vagas por mês é praticamente neutro para a taxa de
desemprego, hoje de 6,4% da população ativa. Abaixo disso, o desemprego
aumenta. Acima disso, cai. Segundo dados do Caged, em abril foram criados
272.225 novos postos de trabalho e, no quadrimestre, 880.717.
O crédito, conforme os dados do BC, teve forte expansão nos últimos 12 meses
até abril, de 21%. O crescimento no quadrimestre, anualizado, porém, aponta
para um aumento de 13%, percentual condizente com as expectativas do Banco
Central (de 15% no ano). A migração das pessoas físicas para o cartão de
crédito e para o cheque especial são evidências, para o BC, de que o aperto
está funcionando.
Nessa seara, o que destoa é o comportamento dos bancos federais, cujas metas de
crescimento do crédito são mais ambiciosas: de 18% para o Banco do Brasil e de
30% para a Caixa Econômica Federal.
Ao entregar, nos primeiros quatro meses do ano, praticamente metade do
superávit fiscal prometido para o ano, o governo quis provar que cumpre seus
compromissos e deu uma importante ajuda ao trabalho do Banco Central para domar
a inflação. O setor público como um todo gastou R$ 57,3 bilhões menos do que
arrecadou, cifra que representa 49% da meta anual de superávit primário de R$
117,8 bilhões.
O sexto mês do governo da presidente Dilma Rousseff começa, assim, com mais
confiança e menos tensão do lado da inflação. Está na conta do Banco Central
que, de junho a setembro, o IPCA mensal será baixo e pode haver até uma pequena
deflação, mas o IPCA acumulado em 12 meses chegará à casa dos 7%.
Esse será um momento crucial para o futuro da inflação, pois o mês de setembro
concentra os dissídios de importantes categorias e os empresários vão ter que
decidir entre conceder reajustes salariais olhando para o IPCA futuro ou para a
inflação passada.
A partir de outubro, o índice de preços sobe um pouco, mas a inflação anual
começa a cair. Considera-se, nesse cenário, que os preços internacionais das
commodities cedem moderadamente, que não haverá "default" na Grécia e que as
economias maduras continuarão se arrastando.
A condição política do governo, fragilizado pelas suspeitas quanto ao
enriquecimento súbito do ministro-chefe da Casa Civil, Antônio Palocci, é a
nota que desafina. Enquanto o ministro - portador da racionalidade econômica,
na ótica dos mercados - não se explica, seus adversários no governo se
fortalecem e novas dúvidas vão surgindo.
Uma delas é especialmente intrigante. A questão que se coloca é se o Copom terá
autonomia para continuar aumentando os juros, se considerar necessário, nos
meses em que a inflação estiver baixa ou se ocorrer deflação. Num eventual
embate dessa natureza, a presença de um Palocci forte poderia ser útil, supõem
fontes do mercado.
Quem esteve com dirigentes do Banco Central nos últimos dias saiu convencido
que a autoridade monetária tem autonomia, conferida pela presidente da
República, para levar a inflação ao centro da meta em 2012; sabe que, para
isso, o ciclo de aperto terá que ser prolongado; e fará o que for necessário
para cumprir essa missão. Se fosse para definir um viés, o BC, agora, seria
"hawkish" (falcão) em oposição a "dovish" (pombo), definiu um interlocutor.
O que de pior pode acontecer ao governo de Dilma Rousseff é perder essa batalha.
Claudia Safatle é diretora adjunta de Redação - Valor
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