Fed vai injetar mais US$ 600 bi e parte vai para os emergentes
A decisão do Fed, banco central americano, de injetar mais US$ 600 bilhões na
economia até o final do segundo trimestre de 2011, veio dentro das expectativas
do mercado e por isso trouxe poucos impactos nos preços dos ativos. O quanto o
Fed conseguirá reativar da economia americana com a medida ainda é incerto.
Mas, ao manter a liquidez em dólar abundante no mundo, amplia a tendência de
desvalorização da moeda americana e o interesse dos investidores por títulos e
ações dos mercados emergentes. A busca por rendimento certamente vai se
aprofundar.
Como a injeção de recursos será feita por meio da compra de títulos do Tesouro
americano, de aproximadamente US$ 75 bilhões por mês, provocará alta no preço
desses papéis, devido à maior demanda, e consequente trará redução nos seus
rendimentos, que se movem no sentido contrário.
Com a queda nos juros americanos, que são a base para o mercado de renda fixa
no mundo todo, as emissões de papéis de dívida vão se tornar ainda mais
interessantes em uma ano que já é recorde para esses títulos. Os emissores
brasileiros de menor risco de crédito, como o governo e as companhias maiores,
terão de alongar prazo se quiserem atrair investidores, que não vão se
interessar pelos rendimentos baixos demais do curto prazo. As emissões de novas
ações também são favorecidas, assim como o preço das commodities.
O dólar tende a perder valor no mundo todo, com os impactos comerciais
decorrentes. "A decisão do Fed consolida o ambiente de guerra cambial que já
assistimos", diz José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Banco
Fator. No entanto, o risco de uma maior intervenção por parte do governo
brasileiro no mercado de câmbio pesa para conter uma valorização maior do real,
comenta Marcelo Salomon, estrategista do Barclays Capital.
Segundo Salomon, os títulos do Tesouro brasileiro em reais de longo prazo
continuam atrativos para o investidor internacional, que no entanto pode querer
comprar esses papéis no mercado internacional por causa do risco de maior
imposto no mercado interno brasileiro.
Para Michael Schoen, do Credit Suisse, a tendência é de a curva de juros dos
títulos do Tesouro americano ampliar sua inclinação positiva, visto que a maior
parte dos papéis que o Fed pretende comprar será de vencimento em até dez anos
(ver tabela nesta página), segundo anunciou ontem. Por isso, diz ele, para
emissores de eurobônus brasileiros mais novatos, o prazo mais curto poderá ser
mais atrativo.
Salomon lembra que a maior parte do mercado esperava injeção de US$ 100 bilhões
por mês. Mas diz que o Fed pretende reavaliar sua política constantemente,
dependendo da inflação e do desemprego no país.
Gonçalves considerou o anúncio do Fed "inteligente" por manter aberta a
possibilidade de rever o montante da recompra de títulos, e portanto da injeção
de liquidez na economia, dependendo dos indicadores de atividade e inflação. "O
Fed mostrou que está comprometido com o seu mandato que é zelar pela inflação e
emprego", afirma. Desta vez, o Fed usou inclusive uma expressão pouco usual que
é "emprego máximo", notou ele.
Para Gonçalves, "o Fed rodou a baiana". Segundo ele, o banco central americano
foi bem explícito num dia peculiar em que o presidente Barack Obama e o Partido
Democrata sofreram derrota na Câmara e no Senado reduzido. "O resultado da
eleição parlamentar nos EUA sugere que as medidas para recuperar a economia
daqui para a frente não passarão pela política fiscal", comenta o economista.
Zeina Latif, economista-sênior do Royal Bank of Scotland (RBS) no Brasil,
pondera que "ainda que o afrouxamento quantitativo fosse maior, não acredito
que haveria otimismo". Segundo lembra ela, menos afrouxamento significa
justamente que a economia americana está indo melhor. Por isso, segundo
especialista do mercado, os investidores ficarão ainda mais atentos aos dados
que serão divulgados sobre emprego e inflação para atuar daqui para frente.
Para Zeina, o crescimento fraco nos EUA se deve a questões estruturais e não de
falta de liquidez. Portanto, a eficácia do afrouxamento quantitativo tende a
ser pequena, no seu entender, além de poder trazer expectativas de "bolhas de
ativos e de mais inflação à frente".
Para a economista do RBS, a discussão sobre a falta de liquidez internacional é
exagerada, e para os países emergentes em geral e para o Brasil em particular,
a inflação preocupa. "A inflação já vem aparecendo nas economias emergentes,
além da apreciação das taxas de câmbio", comenta. Para o Brasil, "as pressões
inflacionárias globais, se agravadas, podem reverter o sinal dado pelo próprio
Banco Central que vem contando com desinflação nas economias centrais", comenta
Zeina, que alerta também para a melhora dos últimos indicadores da economia
americana.
Além de ampliar seu balanço em mais US$ 600 bilhões, o Fed vai comprar títulos
do Tesouro também toda a vez que vencerem papéis que já tem em carteira. Hoje,
antes do chamado "relaxamento quantitativo 2", o Fed tem cerca de US$ 2,1
trilhões em ativos em carteira, adquiridos para evitar uma quebradeira no
sistema financeiro internacional com a crise de 2008. Seu balanço deverá ir
para US$ 2,7 trilhões.
Segundo os cálculos do Fed, serão reinvestidos de US$ 250 bilhões a US$ 300
bilhões até o final do segundo trimestre de 2011, o que soma de US$ 850 bilhões
a US$ 900 bilhões com a injeção de liquidez de US$ 600 bilhões. Serão
aquisições de US$ 110 bilhões por mês em média - US$ 75 bilhões em dinheiro
novo e US$ 35 bilhões em reinvestimento de dinheiro dos títulos que forem
vencendo.
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