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segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Volatilidade afeta cafeicultura sustentável

Volatilidade afeta cafeicultura sustentável
O mineiro Robério Oliveira Silva, diretor-executivo da Organização Internacional do Café (OIC), com sede em Londres, assumiu o cargo há um ano com o desafio de "arrumar a casa" na entidade, que em 2013 completará 50 anos e realizará seu tradicional encontro anual no Brasil, em setembro.Silva vem tentando ampliar a captação de recursos para os projetos da entidade e trabalha na definição de bases para fomentar uma cafeicultura cada vez mais "sustentável", inclusive do ponto de vista econômico.Nesse contexto, a OIC tem na queda das cotações internacionais da commodity nos últimos meses um obstáculo de peso, e Silva é realista ao reconhecer os limites impostos por essa tendência principalmente em regiões nas quais os custos de produção são mais elevados.Em entrevista ao Valor durante o 20 Encontro Nacional das Indústrias de Café (Encafé), realizado em Mata de São João, na Bahia, na semana passada, ele falou sobre esse e outros desafios da OIC, criada sob o guarda-chuva da Organizações das Nações Unidas com a missão de mitigar as flutuações de preços do produto e que hoje é um foro de debates e desenvolvimento de projetos para o segmento. Valor:  Atualmente há muitas informações desencontradas sobre o real quadro mundial de oferta e demanda do grão. Qual é a perspectiva da OIC sobre o mercado?Robério Silva:  A perspectiva da OIC é técnica, não vai levar em conta a posição de qualquer agente do mercado. Nós nos baseamos nos dados que temos e eles mostram que há grande dinamismo no consumo e que os estoques estão em níveis confortáveis para a indústria [cerca de 20 milhões de sacas nos últimos três anos]. Não temos nenhuma modificação nos fundamentos do mercado, que continua bastante apertado. Qualquer movimentação pode dar uma reversão nos preços. Não temos uma bola de cristal para prever o comportamento de preços. Mas o mercado, nos níveis atuais, está perto de um ponto de afetar a sustentabilidade do setor. Valor:  Isso pode desestimular a cafeicultura em países que já enfrentam problemas climáticos?Silva:  Exatamente. Aqui no Brasil, a cafeicultura de montanha, que produz um café de excelente qualidade, está ameaçada. Valor:  Qual é o cenário para o Brasil nesta conjuntura?Silva:  Eu vejo o Brasil como o grande fornecedor de café do mundo e o país que traz a estabilidade aos fluxos de oferta. Valor:  Qual o futuro da sustentabilidade e das certificações para o setor produtivo, levando-se em conta que a maior parte da produção global vem de pequenos produtores. Eles poderão arcar com os custos?Silva:  Entre os aspectos positivos da certificação, está a adequação a processos modernos de gestão da lavoura. Mas, mesmo com custos mais elevados, os produtores não conseguem receber prêmios mais elevados. Essa equação tem de ser fechada em algum momento. E vai depender de um esforço conjunto da iniciativa privada e do governo no sentido de criar mecanismos próprios de certificação. No caso do Brasil, nós temos um excelente produto, que é o Certifica Minas. E a Embrapa está trabalhando em outros processos que podem viabilizar um tipo de certificação que garanta um nível mínimo de sustentabilidade, que é o da produção integrada. Valor:  Quais são as características dessa produção integrada?Silva:  A indústria global fez promessas de que só compraria café sustentável. Mas, para isso, terá de saber o que significa café sustentável. No Brasil, temos uma grande oferta de café sustentável, mas temos que ter mais investimentos. O governo está promovendo esses investimentos por meio da Embrapa. E há o Certifica Minas, que tem demanda para fazer parte de processos de certificações lá de fora. Valor: A tendência é que o Brasil continue a liderar o ranking mundial de fontes de café sustentável?Silva:  Teremos também investimentos das grandes multinacionais. Elas se reuniram e criaram o Instituto de Desenvolvimento Sustentável [Idh]. Um dos países-foco da atuação deles é o Brasil. A questão é como o Idh vai se juntar ao governo ou entidades do setor privado para poder fazer isso. Porque não adianta eles chegarem e falarem: "nós queremos investir tanto". Não vai ser suficiente. Em termos de café sustentável, nós já fizemos investimentos muito significativos e vamos precisar fazer muito mais. Nós vamos precisar de mais dinheiro dessas parcerias. A principal sustentabilidade do setor que nós temos de buscar é um entendimento melhor sobre o que é o preço que leva o café a ser sustentável. Movimentos muito bruscos de preços, como nós tivemos, e uma volatilidade muito grande no mercado não ajudam na questão da sustentabilidade. Valor: Grandes multinacionais do segmento aumentam a concentração no mercado ao mesmo tempo em que surgem pequenas empresas. Essa tendência vai continuar?Silva:  A OIC não tem papel ativo sobre o mercado, mas temos um papel de análise. Existe esta tendência natural de as multinacionais estarem conscientes da sustentabilidade e as pequenas empresas estarem conquistando cada vez mais espaço nas prateleiras de lojas especializadas. E acho que elas vieram para ficar, competindo em mercados diferentes: um mercado de cafés especiais e um mercado de varejo bem aberto às multinacionais. Valor: E o andamento dos projetos da OIC para o segmento?Silva: Temos US$ 105 milhões para projetos voltados à elevação da qualidade do café e à formação de instituições e gerenciamento de riscos, entre outros planos, em países em desenvolvimento. O dinheiro vem do Fundo Comum de Produtos Básicos, formado por diversos países. Valor: Qual o principal legado da OIC para a cafeicultura mundial?Silva: Acho que o legado dos últimos 50 anos da OIC foi trazer estabilidade para o setor. O que nós queremos é trazer informações corretas a respeito do que se passa no mercado e que os agentes tomem as decisões corretas. E, com relação à participação de outros agentes do mercado, eu acho que é bem-vinda à medida em que trazem mais liquidez ao mercado. A questão é que o mercado de café, do ponto de vista financeiro, é pequeno, e há o risco dessa "financeirização" dos mercados de commodities em geral ultrapassar os limites. Valor: E como será a reunião da OIC no Brasil em 2013?Silva: Esse assunto está sendo coordenado, em Brasília, pelo Ministério da Agricultura, e em Minas Gerais, pela Secretaria de Agricultura. Eu creio que será um evento que trará ao Brasil todos os grandes atores do setor. A intenção é trazer os grandes players do mercado, as multinacionais, os traders e colocá-los juntos em busca de soluções. A jornalista viajou a convite da Abic

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