A aposta é de US$ 20 bi no real. Quem cobre?
Eduardo Campo
A tentativa do governo de reverter ou mesmo amenizar o viés de valorização do
real bate em uma singela montanha de US$ 20,217 bilhões.
Essa é a posição vendida (aquela que ganha com a queda do dólar) do investidor
estrangeiro na Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F) neste começo de mês.
A soma recorde é composta por US$ 12,711 bilhões vendidos em contratos de dólar
futuro e outros US$ 7,505 bilhões em cupom cambial (DDI - juro em dólar). Cabe
ressaltar que apenas na sexta-feira, dia 1 de abril, os não residentes
venderam US$ 4,38 bilhões em contratos de dólar futuro. Por mais que as
posições estejam "sujas" em função da virada do mês, com vencimentos e posições
ainda cruzados, o montante não deixa de ser impressionante.
A pergunta que surge agora é se tal posição é meramente especulativa ou tem
algum caráter de hedge. Não podemos afirmar nada muito além dos números que a
BM&F nos dá, pois não sabemos se esses agentes têm posição em outros
instrumentos que neutralizam tal exposição na BM&F.
Em um pregão estrangeiro "vende" US$ 4,38 bilhões
No entanto, é possível fazer algumas observações relevantes. Primeira delas,
podemos supor que os estrangeiros não dispõem de tantos instrumentos cambiais
para operar no mercado local como os bancos, que podem ter posições à vista, no
futuro, no mercado de balcão e outros contratos.
Segundo ponto que merece atenção é que esse crescimento na posição líquida
vendida decorre menos de um aumento nas apostas pró-real e mais de um
reposicionamento dos estrangeiros que vinham carregando posição comprada
(aquela que ganha com a valorização do dólar).
Colocando de outra forma, o estrangeiro que estava comprado em dólar saiu dessa
posição. Ou seja, se ele tinha hedge de alguma operação, sentiu-se confortável
o bastante para ficar exposto ou até mesmo apostar no real.
Conforme explicou um operador, sempre que o estrangeiro ingressa no país para
aplicar em juros, por exemplo, ele faz a conversão da moeda e compra o título
em reais. Para não correr o risco de variação cambial do período, o natural é
esse investidor fazer um hedge dessa exposição cambial, pois em algum momento
ele deve deixar o país, vendendo reais e recomprando dólar. Ele faria esse
hedge comprando dólar futuro. Esse raciocínio também válido para investimento
em renda variável ou investimento direto.
Mas o que parece estar acontecendo é que o estrangeiro está vendendo o dólar
"duas vezes". Uma vez quando ingressa no país e outra na BM&F, onde deveria
estar fazendo hedge. Além de ganhar a variação de juros da aplicação, ele
também busca se beneficiar da apreciação do real no período.
Sendo uma estratégia meramente especulativa (ou não), cabe lembrar que ela está
dentro das regras do mercado.
O fato é que essa posição vendida dificulta o trabalho do Banco Central (BC),
ainda mais que seus instrumentos não atingem diretamente esse tipo de
investidor.
Não por mera coincidência, o preço máximo do dólar no mês de março, de R$
1,686, foi atingido no dia 17, quando a posição vendida do estrangeiro estava
na mínima do mês, de US$ 1,60 bilhão, considerando apenas dólar futuro.
Desse dia em diante a posição vendida foi sistematicamente elevada, até o dólar
fechar o dia 1 de abril em R$ 1,612. Uma queda de 4,39% no período.
Se tem gente vendida tem gente comprada. E essa função, na BM&F é dos bancos e
de outras pessoas jurídicas financeiras.
No pregão de segunda-feira, as declarações de Mantega de que o governo "vai
continuar" adotando medidas para conter a valorização do real também não
fizeram preço. O dólar comercial caiu 0,18%, a R$ 1,609. Preço igual a esse não
era visto desde 8 de agosto de 2008.
Vale lembrar que continua latente a percepção de que mais alguma coisa será
feita no câmbio. Os agentes imaginam, agora, qual será a "canetada".
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