USDA ajusta para baixo oferta de grãos
Ansiosamente aguardado pelo mercado e alvo de muitas especulações na última
semana, o novo relatório do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos
(USDA) sobre oferta e demanda de grãos naquele país e no mundo nesta safra
2010/11, divulgado ontem, reforçou perspectivas "altistas" para as cotações
internacionais de soja e milho, mas esvaziou a tendência de ascensão do trigo.
Milho, trigo e soja são as commodities agrícolas mais negociadas no comércio
global e estão entre as que mais influenciam os custos dos alimentos ao redor
do globo.
A maior surpresa entre as novas estimativas do USDA caiu sobre a soja, que teve
produtividade e colheita americanas mais reduzidas do que o esperado pelo
órgão. O corte amenizou o efeito de projeções do aumento da produção em outras
partes do mundo, inclusive no Brasil, e foi vital para as reduções das
previsões para os estoques finais da oleaginosa nos EUA e no mundo (ver
gráficos nesta página).
Na bolsa de Chicago, principal referência de preços para o comércio de grãos, o
reflexo foi forte. Os contratos da soja em grão com vencimento em janeiro - que
ocupam a segunda posição de entrega, normalmente a de maior liquidez - subiram
4,26% e alcançaram US$ 13,29 por bushel, maior valor desde 27 de agosto de
2008, segundo o Valor Data. Para alegria dos exportadores brasileiros, em 2010
a alta acumulada subiu para 26,75%; em 12 meses, chegou a 36,73%.
Também em Chicago, os futuros de segunda posição do trigo recuaram ontem 1,93%
e fecharam a US$ 7,6125 por bushel. Como os analistas previam, o USDA diminuiu
suas estimativas para a produção e os estoques finais dos EUA, mas menos do que
o esperado, e também cortou menos do que o previsto os estoques finais globais
do cereal. Analistas consultados pela Dow Jones Newswires disseram que esses
números podem significar que a oferta mundial será suficiente para atender à
demanda na temporada. Apesar da baixa, o trigo ainda acumula altas de 37,16% em
2010 e de 40,97% em 12 meses.
Já os preços do milho oscilaram em um dia em um padrão que costuma ser
observado em dois pregões seguidos. Como a soja, chegaram a alcançar o maior
patamar em 27 meses em Chicago, com queda dos estoques finais nos EUA e no
mundo, conforme o USDA, mas um movimento de realização de lucros enxugou os
ganhos e a segunda posição ainda teve tempo de fechar em queda de 1,5%, a US$
5,9025. Em 2010, os ganhos ainda somam 39,13%; em 12 meses, 47,47%.
A realização de lucros no mercado de milho teve relação com movimentos
financeiros e apostas especulativas que também se refletiram em outras
commodities, inclusive não agrícolas. Nos mercados de soja e milho, por
exemplo, as posições compradas de grandes fundos estão em patamares recordes. É
certo que as apostas têm relação com os fundamentos de oferta e demanda - esta
ainda aquecida e puxada por emergentes como a China - mas que foram
catapultadas por turbulências, ou estratégias, que erodiram o dólar.
Tais turbulências levaram ontem o índice Reuters/Jefferies CRB, composto por 19
commodities, ao maior nível em 25 meses, com destaque também para as disparadas
de produtos como cobre e ouro, além do algodão, que atingiu nova máxima em 140
anos na bolsa de Nova York. Na sexta-feira, o CRB completou 11 semanas seguidas
de valorizações, no rally mais longo desde 1977.
"A paranoia recessiva americana conduziu a uma nova expansão monetária que
criou condições para que apostas altistas em commodities se multiplicassem
mundo afora", diz Fabio Silveira, economista da RC Consultores. "Esta
desvalorização do dólar não deixa de ser uma política protecionista sem
precedentes. Só que é uma política perigosa para o sistema financeiro
internacional. Isso ajuda a ampliar a aposta em ouro e outras commodities e
vira inflação global".
Para Silveira, a mistura entre movimentos estritamente financeiros e aqueles
diretamente ligados aos fundamentos resulta, para a análise de preços de
commodities, no mais complexo quadro desde o fim da Segunda Guerra. Mas os
fundamentos estão lá, avisa. E, com os problemas climáticos que reduziram as
colheitas no Hemisfério Norte e poderão fazer o mesmo no Hemisfério Sul, a
corrida por grãos é acelerada.
Tão acelerada que nem a China, maior país importador de soja do mundo está
tendo facilidades. "A indústria de processamento de oleaginosas está encarando
um grande problema: a falta de grão", disse um executivo da chinesa CofCo à
agência Bloomberg.
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