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quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Rabobank vê um ano mais "complicado" para o campo
Valor Econômico  02/01/2014

  As incertezas que ainda desafiam a recuperação da economia global e o modesto crescimento previsto para o Brasil tendem a colaborar para que os produtores agrícolas do país tenham em 2014 resultados menos positivos que os registrados desde o início desta década.

Ofertas domésticas e globais confortáveis ou em recomposição também deverão continuar a exercer pressão baixista sobre as cotações de commodities como soja, milho, açúcar e café, mas um dólar mais favorável às exportações poderá limitar as perdas - e para a pecuária, cujo horizonte é mais promissor, maximizar os ganhos.

Em linhas gerais, é o que prevê para este ano o estudo "Perspectivas para o Agronegócio Brasileiro" do Rabobank, banco de origem holandesa com forte atuação no setor. "Para a economia como um todo, será um ano bem complicado. E haverá mais riscos para o agronegócio, ainda que esta frente esteja melhor defendida e que o câmbio possa suavizar os problemas", afirma Robério Costa, economista-chefe da instituição no país.

O trabalho lembra que o FMI prevê que a economia mundial crescerá 3,6% em 2014, e projeta avanço de 2,2% no Brasil; para o fim do ano, aponta o dólar em torno de R$ 2,50, o que também poderá significar mais peso sobre a inflação. Carro-chefe do campo nacional, a soja dificilmente escapará da tendência de acomodação dos preços em patamares mais baixos, que tem dado o tom nos últimos meses apesar da aquecida demanda da China.

Com boas colheitas nos Hemisférios Sul e Norte em 2013 e novos recordes abaixo do Equador já praticamente garantidos neste ano, o Rabobank calcula que a relação global entre estoque e consumo subirá para 26,5% no fim desta safra 2013/14, ante 23,9% em 2012/13, o que fortalece o cenário de margens menores para o agricultor. Mas nada grave. "As margens ainda serão positivas, mesmo com custos de produção maiores e com a preocupação com o ataque da lagarta helicoverpa nas lavouras, que pode elevar gastos em até 18% por exigir mais aplicações de defensivos.
Dependendo do plantio no Hemisfério Norte [na temporada 2014/15, cuja semeadura ganhará fôlego no segundo trimestre], poderemos ver preços por volta de US$ 11 o bushel em Chicago no fim de 2014", diz Renato Rasmussen, analista do departamento de pesquisa e análise setorial do Rabobank Brasil. Hoje, as cotações superam US$ 13. Conforme o estudo do banco, a pressão será maior no mercado de milho, para o qual prevê excedente global da ordem de 30 milhões de toneladas e uma expansão de 23,5% no nível de estoques de passagem, que poderão superar 150 milhões de toneladas e alcançar o maior patamar em 12 anos.

Assim, diz Rasmussen, a expectativa é de alto risco para os produtores brasileiros - que, em grande medida, dependerão do desempenho das exportações para melhorar sua remuneração e equilibrar as contas. Para ele, a provável alta das importações chinesas poderão ajudar o Brasil e a redução do mandato do etanol nos Estados Unidos, que colaborou para a queda dos preços internacionais no fim de 2013, já está "precificada".

"Complicado" também foi o termo usado por Rasmussen para definir o que o Rabobank projeta para o algodão em 2014. Depois da progressiva alta das cotações internacionais no ano passado, a instituição prevê uma certa estabilização, mas sinais de desaceleração da demanda em um contexto de elevação dos custos poderão afetar as margens dos produtores. "O câmbio tem sido uma proteção para os agricultores brasileiros, mas as incertezas são grandes. Cerca de 60% dos estoques globais estão nas mãos da China, e o ritmo que o país imprimir para se desfazer desses estoques, sobretudo os mais antigos [quatro anos], será fundamental para os preços".

O segmento sucroalcooleiro do país é outro que não terá vida fácil. O estudo confirma excedente global de açúcar nesta safra 2013/14, o que tira suporte das cotações, mas prevê aumento da demanda doméstica por etanol. Nesse contexto, estima margens similares às de 2013 para fornecedores de cana e ainda apertadas para as usinas. "O segmento recuperou produtividade e vem aguentando, mas o quadro é desafiador", afirma o analista Rafael Barbosa, da equipe do Rabobank Brasil.

Problemático mesmo tende a ser o ano dos cafeicultores, que já amargaram muitas dificuldades em 2013. "Vivemos um ciclo de baixa agravado por um conjunto de fatores, sobretudo o incentivo à produção derivado dos picos de preços de 2011 tanto no Brasil quanto na Colômbia, que renovou seus cafezais. A situação é a mesma em 2014, mas os produtores brasileiros poderão investir menos e talvez haja alguma mudança em 2015. Mas apenas talvez", reforça Barbosa. Ele lembra que a safra brasileira 2014/15 é de bienalidade positiva - ou seja, cheia. Resta saber se Brasília oferecerá novas medidas de apoio aos produtores ou não.

Para as bebidas que fazem parte do levantamento - suco de laranja e leite -, as perspectivas são melhores, como destaca o analista Andres Padilla. Para o suco, a redução da oferta no Brasil e nos EUA deverá colaborar para a redução dos estoques e para a elevação das cotações, inclusive da fruta, enquanto no mercado de leite a tendência é de leve queda dos preços ao produtor, mas para patamares ainda relativamente atrativos.

Mas o horizonte mais positivo parece ser o da pecuária e dos frigoríficos. O estudo do Rabobank realça que os preços globais da carne bovina deverão oscilar ao redor dos patamares já mais elevados observados em 2013, com possibilidade de aumento limitado. E as exportações, com a abertura de novos mercados, tendem a bater novo recorde, com efeitos positivos para toda a cadeia. Para a carne de frango o cenário para os preços não é muito diferente, já que a oferta mundial de outros tipos de carne, inclusive bovina, segue restrita, e a curva de queda dos grãos deverá ser favorável aos custos.

Robério Costa pontua, finalmente, que uma melhora mais pujante do que a esperada na economia internacional poderá se unir a um dólar mais atraente para as exportações brasileiras - os estímulos à economia americana deverão diminuir - e mudar para melhor as perspectivas do banco para o agronegócio. Enquanto isso, prudência e uma política eficiente de hedge podem fazer a diferença.

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