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sábado, 18 de junho de 2011

Conversa de Diniz com Carrefour azedou relação

Conversa de Diniz com Carrefour azedou relação Por mais de uma vez, Abilio Diniz, presidente do conselho do grupo Pão de Açúcar, disse que "não é homem de mandar recados". Mas o francês Jean-Charles Henri Naouri, presidente do Casino, enviou ontem uma mensagem explícita ao empresário: no dia da reunião do conselho do Pão de Açúcar, da qual membros do Casino participaram, o grupo francês anunciou o aumento de participação na empresa brasileira.Ao preço do papel no pregão de quarta-feira, o desembolso foi de R$ 572,8 milhões, o que eleva a participação do Casino para 37%. A investida ocorre depois da aproximação de Diniz com a filial brasileira do Carrefour, na tentativa de uma associação, sem o conhecimento do sócio Casino. "A decisão [de aumentar a participação] foi uma resposta do Casino à iniciativa de Diniz de se aproximar do seu maior concorrente francês", diz uma fonte próxima ao Casino. "Os franceses querem reforçar a sua intenção de ficar no negócio brasileiro." A possível negociação entre Diniz e o Carrefour Brasil foi divulgada por um jornal francês no fim de maio. Segundo fontes próximas ao Casino, Jean-Charles Henri Naouri mandou um e-mail para Diniz, pedindo explicações. O empresário respondeu a Naouri confirmando a tentativa de aproximação, mas disse que não tinha mais nada a acrescentar. "E isso se mantém até hoje", disse uma fonte, ontem, antes da reunião do conselho. Dos 14 membros do conselho, cinco são do Casino e outros cinco são da família Diniz. Os quatro restantes são independentes.Em 31 de maio, o Casino recorreu à Câmara Internacional de Comércio (ICC), em São Paulo, pedindo uma arbitragem contra Diniz para manter os acordos fechados entre as partes em novembro de 2006 na Wilkes. Nesta holding, que controla o Pão de Açúcar, a família Diniz e a rede francesa têm, cada um, 50%. A iniciativa fez as ações do Pão de Açúcar liderarem as perdas do Ibovespa no dia 31, com queda de 4,17%. O Casino teria, segundo fontes ligadas ao Pão de Açúcar, se beneficiado dessa perda, comprando ações no dia seguinte. Até o fim da tarde de ontem, o Pão de Açúcar aguardava alguma iniciativa da Comissão de Valores Imobiliários (CVM). A expectativa da rede varejista era que a CVM poderia pedir explicações ao Casino por conta dessa movimentação. Procurada, a CVM disse que não iria se manifestar. Fontes do grupo francês relataram ainda que o Diniz poderia ter pedido à butique financeira Estáter, de Pércio de Souza, que entrasse em contato com fundos e bancos de investimento para levantar capital para se associar, sozinho, ao Carrefour no Brasil. Procurado, Souza não concedeu entrevista. Casino `marca posição` com nova fatia do Pão de Açúcar A reação foi rápida. No momento em que as relações entre o grupo Pão de Açúcar e seu sócio francês nunca estiveram tão tensas, o Casino anunciou ontem, em Paris, ter aumentado em 3,3% sua participação no capital da varejista brasileira. Com a operação, os franceses passam a deter 37% do grupo.O Casino confirmou ao Valor ter desembolsado uma quantia "na faixa de € 256 milhões", investimento realizado com recursos disponíveis em caixa"Não é por acaso que esse aumento de participação foi realizado agora", afirmou uma fonte na França ligada ao caso. Na prática, como diz o comunicado, essa aquisição de 8,6 milhões de ações preferenciais "não modifica o controle do GPA", exercido pela holding Wilkes (na qual o Casino e o grupo Diniz detém 50% cada).Mas o momento escolhido para o anúncio não deixa de ser interpretado como uma advertência ao sócio brasileiro, para alguns até mesmo uma provocação, por parte dos franceses. A operação financeira ocorre pouco após o Casino ter dado entrada, no fim de maio, em um processo de arbitragem na Câmara de Comércio de Paris, depois que Abílio Diniz iniciou discussões com o arquirrival Carrefour sobre uma eventual fusão, sem o grupo francês estar a par do assunto.Ou seja, depois de recorrer à arbitragem para "relembrar as regras do jogo" ao grupo Diniz, o aumento de capital pode ser visto como uma forma simbólica do Casino marcar seu território, defendendo suas fronteiras no Brasil com garras e dentes."O Casino tem a clara estratégia de aumentar tanto quanto possível suas participações nas filiais em países emergentes onde é líder. Isso já foi feito na Colômbia e em países da Ásia", disse ao Valor outra fonte ligada ao caso.No comunicado oficial, o Casino afirma demonstrar com a operação "a vontade de reforçar a longo prazo o desenvolvimento do Pão de Açúcar, como também as posições do grupo nos mercados com forte crescimento".Na sede do grupo, portanto, o discurso é ameno e evita o afrontamento. Uma fonte reitera que "não se trata de oportunismo nem de uma posição defensiva". Mas apesar da operação de aumento de capital no GPA ser uma "opção estratégica a longo prazo", essa fonte ressalta, no entanto, "que não é possível negar o contexto em que ela foi realizada". O momento, definitivamente, não foi uma simples coincidência.O Casino ressalta ainda que a agenda de junho do próximo ano, quando o grupo francês poderá assumir o controle do Pão de Açúcar, segundo um acordo firmado em 2006, não sofre nenhuma mudança.Outro objetivo do Casino em relação à compra das ações preferenciais poderia ser de ordem financeira. O aumento da participação vai permitir ao Casino integrar em suas contas uma fatia maior dos lucros do Pão de Açúcar.Paradoxalmente, no dia em que anunciou o aumento de participação no capital da filial no Brasil, um dos mercados com maiores taxas de crescimento do setor no mundo, as ações do Casino sofreram forte queda na bolsa de Paris, de 3,32%. As do rival Carrefour, pivô da discórdia com o grupo Diniz, caíram ainda mais, 3,48%.As duas empresas estão entre as mais fortes desvalorizações registradas ontem na bolsa de Paris. Mas as quedas não estão relacionadas ao anúncio da operação no Brasil. As ações dos dois varejistas foram afetadas por relatórios de bancos (Morgan Stanley, no caso do Casino, e UBS, em relação ao Carrefour) que anteciparam pressões do mercado sobre o eventual desempenho dos lucros dos dois grupos, que pode ficar abaixo do esperado.A conjuntura econômica na França não é favorável e as posições no mercado doméstico, importantes em relação ao faturamento global (mais de 60% para o Casino) são consideradas, pelos bancos, um fator de incertezas. Além disso, os hipermercados, em razão da mudança de comportamento do consumidor na França, que passou a dar preferência às lojas de bairro, enfrentam um problema estrutural de desaceleração nas vendas. As perspectivas na França podem representar um fator suplementar para o Casino reforçar suas posições nos mercados emergentes, que já representam 38% de seu faturamento.

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