Pesquisa identifica fungo associado ao café de boa qualidade
Uma pesquisa coordenada pela pesquisadora da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig), a agrônoma Sara Maria Chalfoun, verificou que um dos micro-organismos encontrados no café, ao contrário dos demais, está associado a bebidas de boa qualidade. Trata-se do fungo Cladosporium cladosporioides, que ganhou o "apelido" de "fungo do bem".
Na ocasião da descoberta, Chalfoun, em parceria com o professor Carlos José Pimenta, da Universidade Federal de Lavras (Ufla), e com o então doutorando Marcelo Cláudio Pereira, atualmente bolsista de pós-doutorado do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia do Café (INCT Café), identificou que a antibiose é um dos mecanismos de atuação do C. cladosporioides. "Ele impede o desenvolvimento de outros micro-organismos pela capacidade de parasitá-los e de produzir metabólitos tóxicos. Além disso, o "fungo do bem" não promove fermentações lática e butírica típicas de outros fungos que prejudicam a qualidade final do produto", explica.
Os pesquisadores também descobriram que em plantações de café que recebiam tratamentos fitossanitários (uso de defensivos agrícolas para combate de pragas), o C. cladosporioides sofria redução drástica ou deixava de existir, não exercendo, assim, seu papel de bioprotetor. "Com isso, sentimos a necessidade de desenvolver uma formulação contendo o fungo, visando reintroduzi-lo ou equilibrar a sua população nas áreas cafeeiras", explica Chalfoun.
O primeiro passo foi isolar o C. cladosporioides, que, segundo a pesquisadora, possui o status de GRAS (Generaly Regarded Air Safe), isto é, não causa mal nem à planta nem ao homem. Em seguida, a equipe trabalhou no desenvolvimento e teste de formulações com o agente biológico, prolongando a sua vida sob condições de armazenamento e seu estabelecimento no campo.
O desenvolvimento da fórmula poderá atender a uma grande demanda de produtores que perdem qualidade no café, com problemas graves em diferentes regiões do país. "Ele pode ser uma ferramenta única, capaz de substituir o uso de produtos químicos que têm um apelo extremamente negativo", argumenta.
A fazenda Santa Helena, em Alfenas, testou o produto em março do ano passado. Margeada pela represa de Furnas, a lavoura sofria com alto teor de umidade e, consequentemente, com a proliferação de pragas. O uso de defensivos agrícolas acabou levando à extinção do C. cladosporioides. "Depois da aplicação do produto em 50 plantas verificamos a multiplicação do fungo, já ajudando no combate dos micro-organismos prejudiciais à qualidade do café e na melhora do gosto da bebida", relata o técnico em Agropecuária da fazenda, Paulo Sérgio da Silva.
O produto ainda não está à venda. A invenção foi patenteada em 2004 e está disponível como uma tecnologia em fase de transferência. Mediante pagamento de royalties para as instituições criadoras, empresas podem adquirir o direito de exploração e comercializá-lo. "Nossa expectativa é que o produto já esteja no mercado pronto para ser utilizado na safra de café de 2011", diz.
O agente bioprotetor surge como uma alternativa de tratamento. "Não existe produto similar, com possibilidade de proteger continuamente a qualidade do café", diz. De acordo com a pesquisadora, em 1,4 mil fungicidas (produtos que destroem fungos) registrados no país, apenas 16 são biológicos - 1,1% do total de defensivos. Para ela, a tendência é a redução cada vez maior do uso de fungicidas sintéticos, o que vem ao encontro de relevantes preocupações com a saúde e com o meio ambiente.
Uma fábrica de inovações
Para a manipulação e seleção do fungo, foi instalada, em 2007, uma biofábrica no Sistema de Incubadoras da Universidade Federal de Lavras (Ufla). Sua função é gerar produtos inovadores para serem empregados na agropecuária, na indústria alimentícia e no meio ambiente. Existem outras biofábricas em Itapetininga (SP) e em Vitória da Conquista (BA) que trabalham, principalmente, com produtos derivados do fungo Metarhizium anisopliae e Beauveria bassiana.
Na de Minas Gerais, já foram identificados micro-organismos capazes de garantir a proteção de cultivos, o controle de doenças e pragas, a absorção de metais existentes no solo, a solubilização do fosfato, a produção de enzimas e até a purificação da água utilizada na agricultura. "Estamos empenhados no desenvolvimento de métodos sustentáveis de melhoria de processos e produtos, com preocupações prioritárias como a segurança alimentar e preservação do meio ambiente", ressalta Chalfoun.
Para a implantação, os pesquisadores contaram com recursos provindos do Programa de Incentivo à Inovação da Universidade Federal de Lavras (Ufla) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig), além da assessoria do Instituto Inovação. Também apoiaram a Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig), o Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), a Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Seapa) e a Prefeitura Municipal de Lavras. Recentemente, a biofábrica recebeu aporte de recursos provenientes INCT Café e do Programa Prime - Primeira Empresa Inovadora, da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep).
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